A Assembleia Municipal de Lagos aprovou, por unanimidade, uma proposta referente à comemoração do centenário da chegada do comboio a Lagos – 1922-2022.
A proposta foi aprovada na primeira reunião ordinária de fevereiro/2021, realizada no dia 22 de fevereiro.
Assim, no seguimento da decisão, será criada uma Comissão Municipal para as Comemorações do Centenário da Chegada do Comboio a Lagos, com a participação da Câmara Municipal de Lagos e as Juntas de Freguesia do concelho, em conjunto com a Comissão Permanente da Assembleia Municipal.
Em breve haverá uma primeira reunião, para estabelecer o calendário e a programação das comemorações.
Lagos tem um património afeto ao Museu Nacional Ferroviário que enferruja no esquecimento.
Carruagem e locomotivas a vapor de finais do século XIX estão entre o espólio do Núcleo Ferroviário de Lagos que poderia ser motivo de interesse para a cidade e para a região, e que continuam sem solução expositiva há anos.
Proposta
Em 2022 celebram-se os 100 anos da chegada do primeiro comboio a Lagos e dos festejos que acompanharam a inauguração do ramal ferroviário Portimão-Lagos que completava a Linha do Algarve.
No século XIX, a invenção da máquina a vapor havia dado origem à Revolução Industrial, onde teve papel destacado a sua aplicação nas locomotivas dos caminhos de ferro, com efeitos que perduram hoje.
O meio ferroviário revolucionou o quotidiano das populações, e ao receio inicial provocado por aquelas soberbas e ruidosas locomotivas, seguiu-se o enorme fascínio pela sua potência e velocidade.
O comboio assumiu rapidamente um lugar no imaginário das crianças e dos adultos substituindo as carruagens e os cavalos de outrora.
Por toda a parte onde surgiu, o comboio integrou-se no quotidiano dos povos, encurtando grandemente as distâncias e reduzindo o tamanho do mundo.
Em Portugal não foi diferente, a ferrovia uniu as comunidades e levou o progresso a todos os distritos do País. Durante mais de um século o comboio assumiu-se como o símbolo de evolução e os caminhos-de-ferro como paradigma da organização e mecanização.”
Em Portugal, a primeira viagem de comboio foi em 1858, com a inauguração, revestida de curiosas peripécias, da linha Lisboa-Carregado.
Uma Lei de 1883 previa a linha de caminho de ferro até ao Algarve e o projeto do ramal de Lagos é de 1899, embora o projeto original, datado de 1882 e posteriormente abandonado, previsse a construção da estação de Lagos no Rossio de S. João na margem direita da Ribeira de Bensafrim, prosseguindo com a linha de caminho de ferro por Vila do Bispo, Aljezur, Odemira, com ramal a Sines.
Em Lagos, havia perfeita consciência sobre o desenvolvimento que o caminho de ferro iria permitir e, nesse sentido, foi aqui organizada em 1889 uma reunião «de todas as classes da sociedade» com representantes dos Concelhos de Vila do Bispo, Aljezur e Odemira, para criar uma comissão que reclamasse junto do governo a construção do caminho de ferro de Lagos a Odemira e de um porto de abrigo em Lagos para escoamento e exportação dos produtos de toda essa zona.
No mesmo ano de 1889, o comboio chegou a Faro e em 1897 o Rei D. Carlos prometeu, em Faro e em Lagos, a obra do prolongamento das linhas de comboio do Algarve até VRSA e Lagos.
Em 1902 o comboio chegou a Silves, em 1903 a Ferragudo que ficou a funcionar como estação da Vila Nova de Portimão, em 1906 a Vila Real de Santo António.
O interesse em completar o ramal ferroviário de Lagos era considerado tão necessário para a economia do Barlavento, que 1912 o Parlamento havia concedido autorização, a pedido da Câmara Municipal de Lagos, para esta contrair um empréstimo de 500 contos para assumir a construção do ramal desde Portimão até Lagos, intenção que teve seguimento, com a transferência da obra para a empresa, então criada, dos Caminhos de Ferro Portugueses.
Em 1915 foi concluída a ponte ferroviária sobre o Arade e o comboio chegou a Portimão.
É oportuno lembrar que em 1911, a Câmara Municipal de Lagos havia proposto a criação de um itinerário de interesse turístico, em caminho de ferro ligando Lagos a Londres por Vila Real de Santo António, Huelva, Sevilha, Madrid e Paris, antecedendo de meio século aquilo que só se veio a realizar a partir das décadas de 1950/60, no após II Guerra Mundial.
Foi uma ideia que refletia bem a faceta progressista e a abertura de pensamento dominante nas gentes da jovem República Portuguesa, que as monarquias se recusaram a reconhecer até à intervenção do algarvio Presidente da República Teixeira Gomes, de Portimão.
Aliás, essa alargada escala da maneira de pensar, veio a ser interrompida e escondida pela estreiteza de vistas dos quási 50 anos salazaristas, que deixaram marcas profundas que hoje enfermam numerosos cidadãos, ainda incapazes de olhar para além da velha herança da dimensão paroquial.
Só finalmente, em 30 de julho de 1922, um comboio especial fez a ligação direta do Barreiro a Lagos, com o Presidente do Ministério, o Ministro do Trabalho e o Diretor do Caminho de Ferro do Sul e Sueste, a que se juntou o Ministro do Comércio, que se encontrava em visita aos concelhos do Barlavento, uma delegação da Vila do Barreiro formada pelas Bandas da Sociedade Democrática União Barreirense e da Sociedade de Instrução e Recreio do Barreiro, representantes do Grupo Dramático Herculano Marinho e a equipa do Futebol Clube Barreirense.
Todos participaram nos festejos em Lagos, onde três dias de cerimónias oficiais e festas populares celebraram a chegada do primeiro comboio, largamente referida e noticiada em toda a imprensa nacional e regional.
A importância regional e nacional de que se revestiu a chegada do primeiro comboio a Lagos não pode ser ignorada na passagem do seu centenário e o Município de Lagos deve reconhece-lo dedicando-lhe uma especial atenção.