Nova associação Algarve Evolution congrega vários negócios do sector das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) da região.
«Começámos a falar e a perceber que, se não nos juntássemos como grupo de profissionais e se não criássemos massa crítica, não iríamos conseguir competir a nível tecnológico, nem acompanhar a evolução dos salários. Temos muita concorrência a nível internacional e é preciso pensar como responder a estes desafios», começa por revelar ao «barlavento», Miguel Fernandes, presidente da Algarve Evolution, recém-fundada associação sem fins lucrativos, que une e representa 29 empresas do sector tecnológico na região.
Vanessa Nascimento, vice-presidente do coletivo, explica ainda que a «Algarve Evolution pretende direcionar a estratégia das empresas, no sentido de se colmatar a relação com as outras entidades e de se criar uma visão regional» para o sector.
«A ideia é internacionalizar empresas e criar parcerias. Estamos todos para o mesmo, e juntos temos mais capacidade de atrair talento e tirar o Algarve do mapa como sendo apenas uma região turística, para começar a ser reconhecida também como uma região tecnológica», acrescenta.
Também para o presidente da Algarve Evolution, os primeiros passos estão bem definidos.
«Queremos dar poder às empresas e atrair outras. Primeiro, vamos perceber qual a massa crítica que está na região e qual o número de pessoas, por exemplo, que sabem programar ou estão a fazer coisas na área das tecnologias. Vamos procurar nichos mais pequenos, perceber e mapear as competências», enumera.
Depois, «queremos falar a uma só voz, em eventos como o Web Summit, por exemplo, ou quando formos ao estrangeiro. Vivem 400 mil pessoas no Algarve, mas no sector da tecnologia, penso que devemos ser apenas duas ou três mil. Por isso, temos de nos juntar para nos darmos a conhecer. Temos que divulgar o nosso potencial a nível nacional e a nível internacional», até para que o Algarve se possa desenvolver nestas áreas tão especializadas.
Uma vez que já existia a associação Algarve Systems and Technology Partnership (Algarve STP), que congregava várias entidades públicas como a Universidade do Algarve e a Câmara Municipal de Faro, a Algarve Evolution veio então juntar-se. Ambas vão fazer parte do futuro Algarve Tech Hub.
«É uma marca que une vontades e esforços de públicos e privados para tentarmos definir uma estratégia competitiva para os próximos 10 a 20 anos», explica Miguel Fernandes.
O Algarve Tech Hub «é o movimento que pretende ser como um farol, ou um ecossistema. Por exemplo, se um estrangeiro estiver a pensar em mudar-se para o melhor sítio do mundo [Algarve] com a sua empresa, ou capacidade de trabalho, deve conhecer uma marca. Hoje, é impossível para uma pessoa que venha de fora ter a noção e saber onde se pode dirigir».
O Algarve Tech Hub «pretende ser um pouco isso. Primeiro, irá dinamizar a região, e depois, promover e apresentar-se ao mercado nacional e internacional como a base do ecossistema digital do Algarve». Neste caso em concreto, os objetivos a atingir, são «mais estratégicos», esclarece o dirigente da nova associação.
Já Vanessa Nascimento acredita que é importante mostrar aos futuros profissionais da área que não precisam de emigrar para conseguirem ter sucesso no sector.
«No Algarve faz-se bom trabalho. Ao nível do desenvolvimento de software, já temos uma excelente mão de obra e de elevada qualidade, ao ponto de termos pessoas que são contratadas por toda a parte do mundo. Neste momento, queremos atrair mais talento. Precisamos de recursos humanos para fazer crescer as empresas» e ter capital humano residente.
«É importante que todas as pessoas formadas com graus académicos na Universidade ou em cursos tecnológicos permaneçam cá, que não vão para fora trabalhar, porque temos capacidade» de as empregar.
«As pessoas têm de perceber que podem ficar no Algarve, ter qualidade de vida e qualidade laboral. Estamos a falar de uma área com altos índices de empregabilidade. Há quem ainda não acabou o curso e já tenha emprego».
Nascimento conclui, apontando as vantagens de desenvolver as áreas da tecnologia: «acaba até por ser uma estratégia, quer económica, quer social, para combater o próprio desemprego que é sentido na região».
Miguel Fernandes vai ainda mais longe. «A nível demográfico somos cerca de 10 milhões em Portugal. Em 10 anos prevê-se que o número reduza para sete milhões. Temos um enorme problema demográfico», considerou.
Por outro lado, «as pessoas têm estado a ser puxadas para fora. Realmente é um problema internacional, mas em Portugal multiplica-se por 10. Nos últimos 20/30 anos, com as crises cíclicas todas que temos tido, as pessoas formaram-se e emigraram porque aqui não tinham oportunidades. Temos de contrariar esta tendência, porque senão, não teremos gente com capacidade e conhecimento para inverter este cenário, e não conseguiremos ser competitivos» num mundo cada vez mais globalizado.
Ainda na opinião de Miguel Fernandes, o sector tecnológico é o único que pode combater a sazonalidade: «no Algarve não temos qualquer indústria sem ser a do turismo. A tecnologia e a parte do trabalhar no digital, é, na minha opinião, aquela que acredito que tem mais chances de acrescentar e de se criar aqui uma nova indústria que não está dependente da sazonalidade. Por isso é que temos vindo a defender tanto esta união», sublinha.
É tão óbvio que acho que quanto mais se juntarem na luta, mais fácil será de fazer acontecer. É preciso começar a mostrar uma estratégia e uma visão de que há uma alternativa e apresentá-la para que mais pessoas embarquem nela e nos ajudem a fazer acontecer. Modéstia à parte, falando por mim, não conheço uma outra estratégia com mais possibilidade de criar valor para a região», conclui o dirigente.
Apesar de se considerarem como uma associação «embrionária», há já alguns planos para o futuro.
«Vamos ter um ciclo de formações para empreendedores e para empresas sobre aquilo que está em voga e aquilo que são as novas tecnologias. Estamos a trazer o know-how das próprias empresas e estamos também a pensar trazer mentores de fora. Isto é uma questão de sobrevivência. Temos de consolidar a questão das tecnologias de informação porque estamos na era digital e precisamos que o Algarve não sobreviva só e exclusivamente do turismo», conclui Vanessa Nascimento.
A presentação oficial foi na quinta-feira, 12 de setembro, no terraço do Centro de Ciência Viva do Algarve, em Faro.
Formação tecnológica ainda não é suficiente
Na opinião de Miguel Fernandes e Vanessa Nascimento, presidente e vice-presidente da recente associação Algarve Evolution, que representa 29 empresas da área das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) da região, o que falta ao Algarve são formações diferenciadas.
«Formações que os empresários, por si só, vão fazer a Lisboa, ao Porto e ao estrangeiro. O que pretendemos é, em associação, criarmos essa oferta formativa, no sentido de que todos os nossos associados possam ter acesso a essa informação. Não faz sentido empresas do Algarve mandarem colaboradores para fora, quando no fundo é mais rentável trazer cá os formadores. Se calhar, há temáticas em que não estamos tão avançados, quer a nível regional, quer a nível nacional. Por isso, faz todo o sentido trazermos cá mentores e especialistas que nos possam dar esse know-how e essa transferência de conhecimento. Não há oferta à medida das necessidades das empresas regionais», lamentou Vanessa Nascimento ao «barlavento». A associação está a preparar uma oferta em conjunto com a Universidade do Algarve, a ETIC_Algarve e o Instituto de Emprego e Formação Profissional (IEFP).
O que é preciso para ser um profissional da tecnologia?
Vanessa Nascimento, vice-presidente da recém-apresentada associação Algarve Evolution que pretende representar o sector tecnológico privado da região, explica ao «barlavento» que quando era criança tinha o sonho de ser bióloga marinha. Mas ao ter o primeiro contacto com um computador, percebeu rapidamente que «tinha jeito» e nunca mais desistiu.
«Para se trabalhar nesta área é preciso muita persistência e gostar daquilo que se faz. É preciso estar consciente que o sector da tecnologia é uma vida de estudos, de progressão e de investimento pessoal porque tudo está constantemente a mudar. Aquele paradigma educacional em que estudávamos, tirávamos o curso e sabíamos tudo, já passou há muito tempo. Estamos perante uma área em que temos de consumir aquilo que é direcionado à nossa evolução», explica.
Na opinião da profissional, as crianças deveriam ter mais contacto com o mundo da tecnologia. «Diga-se de passagem, que nenhuma criança ou adolescente sabe efetivamente o que é a profissão que sonha ter. Há uma necessidade de pôr os mais novos em contacto com o que é a tecnologia, a programação e a inovação».
Nesse sentido, no Algarve, há já um programa de mentoria pensado para crianças e jovens do primeiro ciclo até ao secundário. «Já foram feitos projetos pilotos por parte de algumas pessoas da associação. Não é um programa específico da Algarve Evolution, mas gostava que fosse uma área em que nós, no futuro, apoiássemos enquanto associação», conta ao «barlavento» Miguel Fernandes, presidente da coletividade tecnológica.
Falta mão de obra feminina no mundo das TIC
Miguel Fernandes e Vanessa Nascimento, ambos profissionais da área das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC), são os dirigentes da Algarve Evolution, a mais recente associação sem fins lucrativos, que representa 29 empresas tecnológicas da região.
Segundo Vanessa Nascimento, uma das lacunas do sector é a falta de mulheres no meio, um problema que começa logo na infância.
«Que brinquedos dão às crianças quando estão a ser educadas? Nas atividades extracurriculares e na formação logo no infantário, são coisas direcionadas para o género da criança. Se este contexto fosse alterado, teríamos resultados mais otimistas» no futuro.
Na sua experiência pessoal, Vanessa conta que teve o primeiro contacto com um computador na escola primária, contudo, essa educação «não foi fomentada. Questiono-me se tivesse tido outro direcionamento, se não tinha chegado mais longe nesta área. Seja como for, a única coisa que posso dizer é que tive persistência, interesse, gosto pela área e sobretudo estudo. A nível pessoal vou começar um programa de mentoria para raparigas mais jovens na área da tecnologia».
Até porque «há todo um paradigma social que tem de ser desconstruído. As mulheres são quem tem o maior nível de instrução em Portugal e são quem tem o maior índice de desemprego. Há necessidade de recursos humanos na área e há mulheres desempregadas. As crianças e as jovens podem ser direcionadas para esta área e é isso que nos motivará».