Sobre os serviços de radioterapia deslocados do CHUA para Sevilha

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Num fraseado gongórico o conselho de administração do CHUA refugia-se num emaranhado de expressões para fugir à questão fundamental que levantou toda esta celeuma.

Uma notícia do barlavento do dia 3 de junho, publicada às 17h08, com o título «PSD denuncia serviços de radioterapia deslocados do CHUA para Sevilha» explicita as medidas cautelares que os senhores deputados do PSD pelo Algarve decidiram encetar sobre a matéria titulada.

Ao lermos esta notícia considerámo-la de título realmente alarmante mas, numa primeira abordagem, pouco angustiante.

Infelizmente, desde há muitos anos que nos habituámos a constatar a existência de notícias sobre a Saúde muito pouco ou nada rigorosas, fruto da incapacidade da análise objetiva competente e completa das matérias de saúde apreciadas, num exercício opinativo certamente de boa fé, mas sem qualquer rigor factual.

Não nos angustiámos, portanto.

Só que, a seguir o Barlavento às 18h18 titula «CHUA esclarece que não tomou nenhuma decisão sobre Radioterapia» e acrescenta no corpo da noticia que «contactado pelo Barlavento, o conselho de administração do Centro Hospitalar e Universitário do Algarve (CHUA) refere que até ao momento não foi tomada nenhuma decisão…», acrescentando aquele conselho de administração não haver «sequer a possibilidade de esclarecimento para a deliberação sobre o resultado do mesmo», para de seguida juntar que «a seu tempo terão de ser seguidos, também nessa fase de decisão final todos os trâmites e aplicada legislação em vigor no que respeita aos concursos públicos, dentro dos prazos estipulados», não afirmando categoricamente que tal condição, a deslocalização, não está em apreço.

Num fraseado gongórico o conselho de administração do CHUA refugia-se num emaranhado de expressões para fugir à questão fundamental que levantou toda esta celeuma:

Tão só, se os atos a contratualizar no concurso que mandou abrir são para realizar em Faro, no Algarve ou em qualquer outra parte do Mundo conforme o que rezará a respetiva ata do conselho de administração onde a deliberação foi tomada. Só isto, e é este o cerne da questão.

Estou mesmo em crer que as declarações colhidas pelo Barlavento, só erradamente lhe foram transmitidas em nome do conselho de administração, pois pelo menos os dois médicos, meus colegas, que o integram, não equacionariam a possibilidade de doentes carentes de tratamentos de radioterapia virem a ter de se deslocar 200 quilómetros, a um país estrangeiro, com diferente idioma, com diferentes hábitos alimentares, além de todos os outros inconvenientes duma deslocalização indesejada, sem que fosse uma solução in extremis.

Estou bem certo de que no caso vertente o conselho de administração do CHUA não seguirá esse caminho.

Tudo não passará de um equívoco em que a falta de clareza da posição, do dito conselho de administração, nada ajudou, contribuindo pelo contrário para a inquietude de todos os participantes com especial relevo dos doentes.

Mas ao evocarmos a radioterapia no Algarve temos de prestar homenagem o saudoso Dr. Santos Pereira, cirurgião geral vocacionado para a oncologia, que abnegadamente desenvolveu desde o seu regresso de Angola no início dos anos 1980, a prevenção e tratamento na área da Senologia, quer no âmbito Hospitalar, quer no ambulatório, criando do nada a Associação Oncológica do Algarve (AOA) e depois o despiste ecográfico ambulatório dos tumores mamários em todo o Algarve.

Criou ainda a Unidade de Radioterapia do Algarve, num esforço titânico, persistente e tantas vezes incompreendido , mas sempre pertinaz, na busca de melhores serviços aos doentes oncológicos da Região, sempre despido de qualquer interesse patrimonial próprio. Sou testemunha direta.

A sua ação suprindo as deficiências persistentes do Serviço Público na área da radioterapia, ainda hoje não ultrapassadas, e a sua ação no despiste preventivo do cancro da mama, tornam-no credor do reconhecimento agradecido dos algarvios e de homenagem toponímica numa artéria da Capital da Região, a que tanto deu.

A memória do Dr. Santos Pereira não poderá ser violentada, se porventura tivesse qualquer fundamento a deslocalização desnecessária doentes tão fragilizados, a que dedicou toda a sua vida.

Fernando Esteves Franco | Médico Ortopedista
Chefe de Serviço da Carreira Médica Hospitalar
Ex membro de vários Órgãos de Gestão e Direção do Hospital Distrital de Faro