Combate à corrupção, um tema central na sociedade portuguesa

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O combate efetivo à corrupção, será a marca de água que fará a separação entre quem está de forma séria e empenhada no sucesso desta causa, ou a usa como bandeira por mero populismo. A este respeito recordo a proposta do PAN, que no seu programa eleitoral se propõe criar um tribunal especial de combate à corrupção.

Ciente que o PAN é um partido que a coberto de defesa de causas, muitas das quais vão ao encontro do sentir e de preocupações que são transversais à sociedade portuguesa, tem vindo a ser objeto de um crescente interesse e olhar enquanto opção eleitoral, o que justifica estarmos atentos às suas propostas.

As opções eleitorais, contudo, pressupõem conferir aos destinatários encargos e responsabilidades, como por exemplo, a defesa dos valores da democracia constitucional e dos direitos, liberdades e garantias enquanto pilares do Estado de Direito.

A incursão do PAN na matéria de combate à corrupção é feita numa base populista e sem ter em consideração esses valores, ao propor criar um tribunal especial para o julgamento de crimes de corrupção, ao arrepio do ordenamento constitucional vigente.

A proibição de existência de tribunais com competência exclusiva para o julgamento de certas categorias de crimes, constitui uma garantia constitucional, plasmada no artigo 209 n.º 4 da Constituição da República (…) «é proibida a existência de tribunais com competência exclusiva para o julgamento de certas categorias de crimes (…)».

Esta norma constitucional, que nos deve recordar o horror dos tribunais plenários, existe por alguma razão.

Afastar essa garantia, não é mais do que criar a possibilidade de, um dia, se vir a perseguir judicialmente aqueles que divergem dos que exercem o poder.

Não é mais do que abrir a porta a que pela Lei – aprovada por uma maioria conjuntural que pudesse vir a formar-se e, esta mesma maioria vir a definir quais os crimes que seriam julgados por tais tribunais e, bem assim, quais os comportamentos que seriam enquadráveis em tais crimes.

O poder deixaria de estar na Lei e na aplicação independente dessa mesma Lei pelos órgãos jurisdicionais, para se poder passar a escolher os tribunais para onde dirigir aqueles que mais incomodam o poder constituído.

Não haja dúvidas, escolher tribunais, significa necessariamente escolher os juízes, violando-se assim o princípio do juiz natural.

Temos memória e, para evitar que tal caia no esquecimento importa recordar, que isso também já sucedeu em Portugal, com os tribunais plenários onde eram julgados os acusados de crimes contra o Estado, antes do 25 de Abril de 1974.

A proposta de criação de tribunais especiais para o julgamento de certas categorias de crimes é o caminho aberto para uma ferida mortal no Estado de Direito, por pôr em causa os direitos dos arguidos, e nesta matéria, o PAN não desilude no populismo.

O combate à corrupção faz-se com propostas sérias e, por isso mesmo, o caminho será o de necessariamente lermos e escrutinarmos os programas dos diferentes partidos políticos, agora que iremos ser chamados a fazer escolhas.

A esse respeito deixo um contributo para essa reflexão, a transcrição de uma medida que considero diferenciadora, eficaz e emblemática e que constitui uma das propostas do programa eleitoral do Partido Socialista, no âmbito do combate à corrupção: «criar uma pena acessória para os titulares de cargos políticos condenados por corrupção, o que, através de decisão judicial, poderá impedir a sua eleição ou nomeação para cargos políticos em caso de condenação pela prática de crimes de corrupção, a decretar judicialmente por um período até 10 anos».

Fernando Anastácio | Deputado e candidato pelo Partido Socialista