As Presidenciais e as epidemias

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Inicio de 2021, onde muitos esperam um novo capítulo depois de um ano atípico com uma pandemia que dominou todos os aspetos das nossas vidas.

Houveram de certo mais epidemias, sendo que, a mais famosa COVID-19, deverá ser bastante reduzida, por esforço cientifico e inovador, que de certo ficará especialmente marcado nos manuais históricos no futuro.

Uma outra epidemia, a da abstenção, tem uma solução mais complicada e demorada. A abstenção é uma epidemia que assola principalmente Portugal, que é um dos países na União Europeia onde a abstenção mais cresceu.

Nas primeiras eleições após o 25 de Abril, a taxa de votação situava-se acima dos 90 por cento, sendo que atualmente aproxima-se dos 50 por cento.

Com as eleições Presidenciais à porta, o receio de novo crescimento da abstenção é real. Nas primeiras eleições presidenciais do país, a taxa de abstenção situou-se nos 24,6 por cento.

Nas ultimas eleições em 2016, a taxa tornou- -se a maioria com 51,16 por cento.

Infelizmente, graças à inaptidão de ação, nomeadamente com a aplicação de reformas no sistema eleitoral, a tendência é para a taxa se manter semelhante ou mesmo crescer.

É de facto de difícil compreensão o sucessivo adiamento destas reformas e a falta de debate no parlamento e governo.

Parece-me evidente que o combate a esta epidemia trava-se, ao contrário da COVID-19, com a aproximação das pessoas.

A aproximação das pessoas com o sistema eleitoral, com os seus deputados, presidentes e governantes.

O caminho parece ser o da digitalização e modernização, tal como o aumento da responsabilização e proximidade, neste caso, com os círculos uninominais (já tantas vezes falados e prometidos).

Seguindo a catalogo das epidemias, temos outra também muito preocupante, a pandemia do tribalismo e populismo político.

Essa epidemia tem permitido o regresso de outras epidemias muito antigas, nomeadamente a extrema direita e outras ideologias securitárias e discriminatórias.

Tal como em todas as epidemias, estas também tiveram causas. Podemos enunciar algumas, como o decréscimo das condições de vida das classes médias ocidentais (originadas pela crise financeira global), a desinformação da internet e redes sociais, e a super concentração de riqueza em poucos indivíduos ou organizações.

No que toca às nossas presidenciais é claro que esse vírus também estará representado, nomeadamente em candidatos como André Ventura e partidos como o Chega.

André Ventura e o seu partido conseguiram identificar uma oportunidade política que estava em falta em Portugal, ao contrário de outros países europeus.

Seguiu os exemplos do VOX em Espanha, Frente Nacional em França ou a Liga em Itália. As frustrações de um fração importante da população não tinha representação, uma fração que não compreende e na maioria não concorda com um mundo em crescente transformação e complexidade, que olha com desconfiança para a diferença e é completamente antissistema.

Muitas destas frustrações têm uma base de razão, a classe política foi incapaz de criar sistemas de proteção para muita da classe média e pobre, e foram muitos os escândalos políticos em Portugal, agravados com o sistemático apertar de cinto nos últimos 20 anos.

O Chega está nas Presidenciais como está em qualquer outra disputo política, em total protesto, utilizando a propaganda identitária e desinformação como forma de crescimento. Resulta, principalmente numa época cada vez mais digital, mas com a maioria da população ainda iletrada digitalmente.

Como consequência temos nas presidenciais um André Ventura com grandes possibilidades de um segundo lugar. Marcelo Rebelo de Sousa, favorito e vencedor claro logo na primeira volta, resta apenas saber com que margem (se alcança os 70 por cento).

No segundo lugar iremos ter Ana Gomes ou André Ventura, que estão tecnicamente empatados na maioria das sondagens.

Ambos debatem temas fraturantes na sociedade portuguesa (como a corrupção, que ocupa nos dois candidatos um tema central), e tal explica o seu sucesso, apenas ultrapassado pelo atual Presidente da República, o candidato real do centro (ou centro-direita social, como se autodenomina).

Ana Gomes poderá ter uma ligeira vantagem, pois apesar de ser uma candidata de esquerda, aproxima-se muito mais do centro político.

A questão do centro político em Portugal é um importante aspeto a ter em conta, quando falamos no crescimento do Chega e de André Ventura.

A margem de crescimento não é tão grande como muitos poderão pensar, isto porque em Portugal vencem eleições os partidos que ganham ao centro. Sempre assim foi.

A consequência disto é que, uma possível aliança entre PSD e Chega, irá empurrar ainda mais os eleitores ao centro para o PS ou outro partido mais a esquerda ou mais chegado ao centro.

Ao centro, são poucos os que irão votar no Chega. Ainda assim, e pelo facto do Chega atrair muitos que antes não votavam (a pandemia da abstenção), poderá ainda crescer consideravelmente, almejando um 3º lugar no panorama político.

Voltando às presidenciais, os restantes candidatos serão pouco relevantes. Marisa Matias ficará em 4º lugar, com uma votação inferior à de 2016, ainda que fosse muito difícil ter um resultado igual ou melhor, tendo em conta a mudança radical do panorama político atual, com a saída do Bloco de Esquerda (BE) da «Geringonça», a pandemia, o crescimento de novas forças políticas e também o agravar da situação económica em Portugal, na qual o BE teve participação.

João Ferreira é a cara do PCP, ou seja, um partido em decadência há 20 anos, e a tendência será essa.

Apesar de uma postura institucional real de uma campanha à Presidência da República, ao invés de uma candidatura ao Governo como outros candidatos parecem estar a realizar. O candidato apoiado pelo PCP irá ficar apenas à frente de Tiago Mayan da Iniciativa Liberal e de Vitorino Silva, mas não por muito.

Miguel Braz | Consultor de negócios internacionais