Salinas e lagoas da ETAR Faro-Olhão vão ter ilhas artificiais para aves

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Salinas e lagoas da ETAR Faro-Olhão vão ter ilhas artificiais para a biodiversidade, abrigos na Ria Formosa para aves ameaçadas.

Já é visível a melhoria no ambiente, desde que a Estação de Tratamento de Águas Residuais (ETAR) de Faro – Olhão entrou em funcionamento no final de 2018.

«É um dos sítios mais emblemáticos para a vida de aves aquáticas do Algarve e até mesmo do país. Há dias foram contabilizadas mais de 2000 aves naquelas duas lagoas. É um sítio que é importante preservar e dar a conhecer», explicou aos jornalistas Thijs Valkenburg, ornitólogo e presidente da Vita Nativa, organização sem fins lucrativos para a Conservação do Ambiente, com sede em Olhão.

«São os únicos pontos de água doce que as aves precisam para sobreviver. Além disso, são locais com poucas perturbações», pois o perímetro ao redor está fechado com cerca. O local é tão importante que está no mapa do projeto Bio-ilhas, que está a ser promovido desde maio pela Vita Nativa, segundo revelou Valkenburg na manhã de quarta-feira, dia 2 de fevereiro, no Centro de Educação Ambiental de Marim (CEAM), à margem da inauguração da nova exposição dedicada à Ria Formosa.

Thijs Valkenburg, Fábia Azevedo e Castelão Rodrigues, diretor regional do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF).

A iniciativa surge em resposta ao facto de as zonas húmidas estarem a diminuir nos últimos 50 anos. «Há algumas espécies que queremos beneficiar como é o caso da Chilreta (Sternula albifrons), do Alfaiate (Recurvirostra avosetta) e da Perdiz-do-mar (Glareola pratincola), que estão em declínio.

Perdiz-do-mar (Glareola pratincola).

«Para já estamos a fazer contagens de aves nos sítios onde vamos implementar as ilhas, para perceber a diferença entre o antes e o depois e se terão sucesso nas espécies que queremos privilegiar», disse. Para isto, conta com a colaboração dos técnicos do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF). O projeto conta ainda com um apoio financeiro da Associação Viridia – Conservation In Action, associação de defesa do ambiente com sede no Porto.

No mínimo serão construídas 10 ilhas, quatro na ETAR e as restantes em salinas, entre Faro e Olhão, embora Thijs acredite que possam vir a fazer mais.

Como? «Vamos experimentar fazer vários tipos de ilhas para ver quais as que têm mais sucesso. Algumas serão flutuantes, assentes em boias insufláveis, de pequenas dimensões, com 12 a 15 metros quadrados. Teremos também ilhas em combros de salinas, isolados das laterais e mais uma tipologia de ilha que será com base em estacas, para que não haja contacto com a água. E também vamos construir proteções em zonas de nidificação, contra predadores, neste caso, gatos assilvestrados, cães ou até pessoas, para que possam ter boas taxas de reprodução. Queremos que seja um projeto inovador e possível de ser replicado noutras zonas do Algarve e do país». Está ainda prevista a reabilitação de um sapal «que está bastante degradado e cheio de entulho». Além das infraestruturas, «vamos promover a educação ambiental, levar as escolas às zonas intervencionadas para que os estudantes possam ver as espécies que ali habitam e para perceberem a função e o potencial que as salinas representam para a biodiversidade».

Por fim, há uma vertente de turismo de natureza. «No projeto está planeado um pequeno percurso, que estamos a fazer em parceria com as Salinas do Grelha e vamos aproveitar um troço da Ecovia para implementar painéis informativos sobre a avifauna», concluiu.

Uma casa para o camaleão

A Vita Nativa está também a dar continuidade ao «Projeto Camaleão», que resulta de uma ideia vencedora da edição de 2019 do Orçamento Participativo Jovem Portugal, denominada «Centro de Recuperação e Investigação do Camaleão do Algarve», apresentada com o objetivo de promover a conservação desta espécie.

Na quarta-feira, 2 de fevereiro, foram assinados os protocolos para lhe dar um teto, segundo explicou aos jornalistas a bióloga Fábia Azevedo. «O projeto que vinha do Orçamento Participativo Jovem já terminou, mas achámos que tínhamos toda a força para continuar. Surgiu a possibilidade de ser criar aqui na Quinta de Marim um espaço dedicado à espécie que congregue toda a informação relacionada com o camaleão».

Ocupará o antigo canil do cão de água, edifício que apesar de abandonado, será alvo de reabilitação. Será «um espaço para se fazer educação ambiental e que poderá receber as escolas. Uma bandeira para que se consiga preservar os habitats, já que todas as espécies também beneficiarão. Será um espaço expositivo para se desenvolver trabalho científico e académico».

E mesmo com a pandemia, a iniciativa não parou ao longo do último ano. «Conseguimos sensibilizar diretamente mais de 1500 pessoas com ações presenciais. Fizemos uma campanha de ciência cidadão na qual apelámos à população para nos enviar registos de observação de camaleões. Recebemos mais de 700 registos. Isso permitiu verificar a existência da espécie nalgumas localizações onde não estava registada. Os estudos científicos apontavam para a sua existência nas dunas das zonas do litoral e, no entanto, temos já muitos registos na zona do barrocal e interior, em São Brás de Alportel, Silves e na península de Sagres. Tudo isso foi ciência que se produziu através dos cidadãos», revelou.

A bióloga, contudo, não sabe dizer se o camaleão é hoje uma espécie ameaçada porque «não há estudos recentes. O camaleão não é uma espécie fácil de detetar. Seria preciso fazer um estudo com uma metodologia bem definida e com censos bem estruturados para se conseguir saber o estado atual da população», uma ideia que não é posta de parte.
Por outro lado, a vantagem de criar o Centro na Quinta no Marim não é apenas logística ou para aproveitar a localização privilegiada à beira da Ria Formosa.

«Há vontade de outros parceiros integrarem este projeto que envolve o Instituto Português do Desporto e Juventude (IPDJ), a Universidade do Algarve (UAlg), os cinco municípios do Sotavento litoral e o ICNF que cede as instalações. Todos estão empenhados em contribuir para preservar o camaleão», concluiu.