A QUARPESCA, promove uma manifestação marítima contra a criação do «Parque Marinho da Pedra do Valado», no dia 19 de agosto.
Nos moldes propostos, a Quarpesca manifesta o seu desacordo com o projeto do «Parque Marinho da Pedra do Valado» e avançará para uma manifestação publica que prevê a saída das embarcações associadas numa marcha de protesto no sábado, dia 19 de agosto, às 10 horas, segundo o presidente da direção, Hugo Martins.
A QUARPESCA, Associação dos Armadores Pescadores de Quarteira, tem mais de 30 anos de existência com muito trabalho em parceria com os sucessivos governos, cientistas, ambientalistas, entre outros agentes.
«Temos atualmente associadas 140 embarcações, das quais cerca de 50 operam regularmente na zona que agora é proposta para a implementação de uma Área Marinha Protegida na baía de Armação de Pêra».
Em nota enviada ao barlavento, o coletivo diz que «acompanhámos este processo desde o início, nas sessões presenciais em Armação de Pêra, onde tivemos a oportunidade de alertar para a falta de veia democrática dos impulsionadores do projeto, que apregoavam consensualidade e participação quando ela não existia».
Efetivamente, «na enorme lista de entidades participantes seria benéfico esclarecer quantas vezes essas entidades estiveram presentes. Este tema esteve em debate na comissão de Agricultura e Mar. Foi exposto nessa fase que o projeto tinha falhas enormes como a ausência de estudos de impacto social, económico e até cultural. Os grupos parlamentares reconheceram a importância da ideia, mas sublinharam várias falhas, entre as quais a falta de um Estudo de Impacte Económico-Social. Entretanto foi feito? Que resultados?».
A QUARPESCA afirma que existem espécies muito importantes para a gastronomia local (e sabe-se a importância da relação pesca/turismo). Além das capturas se terem mantido estáveis, em certas espécies como a dourada aumentaram as capturas.
«Fizemos um estudo de impacte económico através da auscultação às cerca de 50 embarcações associadas à QUARPESCA que ali operam regularmente tendo chegado a valores muito próximos dos 3 milhões de euros anuais (a vida de muitas famílias está em causa). A atividade piscatória na chamada Pedra do Valado perde-se na memória do tempo. Desde há muitos anos que os pescadores são conhecedores desta riquíssima zona de pesca que rapidamente passou a ter um valioso interesse económico e como tal de extrema importância social para as comunidades piscatórias da região do Algarve».
Assim, «cientes desta importância, as comunidades piscatórias rapidamente apesar de, ainda não se aperceberem disso, começaram a fazer a cogestão da pesca na Pedra do Valado. Foi esta cogestão integrada entre as diversas comunidades piscatórias que utilizam em simultâneo esta área para a sua atividade diária, que faz com que hoje os cientistas da Universidade do Algarve venham defender a criação de uma Área Protegida nesta região».
No entanto, segundo a associação, «os argumentos apresentados são os da preservação dos recursos existentes que poderão ser dizimados pelo que afirmam a pesca estar a fazer. No entanto todos os estudos efetuados para a implementação desta Área Protegida foram única e exclusivamente biológicos e não numa perspectiva de avaliação de recursos e de mananciais/stocks às espécies quer de interesse económico, quer das espécies sem interesse económico, mas também extremamente importantes para a cadeia alimentar das todas as outras espécies».
E apesar da pesca exercida na «Pedra do Valado ao longo de anos e anos, a mesma não é assim tão destrutiva como parece. De outra maneira hoje os cientistas não encontrariam a enorme diversidade de espécies (900 espécies), espécies que até ao presente momento era desconhecido desses mesmos cientistas (12 novas espécies para a ciência e 45 novos registos para a costa portuguesa) e várias espécies com estatuto de conservação nomeadamente o cavalo-marinho».
A Quarpesca sustenta que «se na realidade a pesca não fosse sustentável e cogerida pelos pescadores a biodiversidade da Pedra do Valado não existiria. A pesca é uma atividade económica, e como atividade económica que é tem que ser sustentável. Por isso mesmo a pesca na região do algarve tem de ser vista como um todo e não como zonas de interesse, uma vez que toda a região funciona como um ecossistema até ao momento sustentável».
Existem, na realidade, «zonas na região algarvia em que a pesca tem tido um esforço superior ao sustentável fazendo com que as embarcações de pesca, principalmente as da chamada pesca artesanal (embarcações que efetuam a pesca em menos de 24 horas de mar) se distribuam por toda a região. Tendo em atenção que aproximadamente 40 por cento da frota algarvia utiliza com alguma regularidade a zona da «Pedra do Valado», o que se pode imediatamente prever é um aumento do esforço de pesca principalmente em zonas que neste momento já se encontram em sobrepesca. As embarcações terão que se distribuir por todo o restante mar algarvio aumentando a sobrepesca em toda a região e diminuindo drasticamente os ganhos dos pescadores».
No entender do coletivo de homens do mar, «esta diminuição dos ganhos poderá como consequência imediata provocar um aumento da pesca ilegal que ao longo dos anos tem-se conseguido controlar. Este cenário a curto prazo vai criar um problema social extremamente grave em todas as comunidades piscatórias fazendo com que os jovens, já tão reticentes em abraçar a profissão (neste momento tem-se notado um maior número de jovens a irem para a pesca), percam de vez o interesse na atividade».
Pela sua localização, a «Pedra do Valado está sujeita pressões significativas da pesca e do turismo, no entanto a Área Marinha Protegida de Interesse Comunitário do Algarve (AMPIC) acaba por única e exclusivamente restringir a área á pesca não aplicando nenhum tipo de restrições às atividades turísticas, inclusivamente sugerindo a utilização para a implementação de atividades como o mergulho. Estas atividades também poderão ter influências nefastas nos jardins de corais e de gorgónias que ao longo de anos e anos de pesca até hoje se mantêm nesta área».
Há também «a não esquecer as áreas de pradarias de ervas marinhas, que ficaram de fora da AMPIC, sobretudo onde a pesca não atua e somente sofrem a pressão da atividade turística, por se encontrarem mais junto ao litoral. Estas áreas extremamente importantes ficaram completamente de fora, apesar de se saber o quanto sensíveis são, e da importância quer na cadeia alimentar quer na proteção dos juvenis».
A QUARPESCA afima ter elaborado um documento de contributo para este projeto, numa «perspectiva construtiva que até hoje não foi mencionado em nenhuma ocasião pelos atores deste processo. Avançamos com propostas que pretendiam, de alguma forma, atenuar o impacto drástico deste projeto na vida de dezenas de famílias de pescadores. A preservação de uma área exclusiva para a pequena pesca entre as seis e as oito milhas, sem as embarcações que operam com a arte de arrasto foi uma das medidas avançadas».
Por isso, «é incompreensível para todos o facto de a pesca por arrasto ser a mais destrutiva e ser a pequena pesca, vista como a mais sustentável, ser a mais penalizada. É impossível aceitar. Um processo como este envolve esforço e cedência de todos».
«Contribuímos com ideias que passavam por existir a possibilidade de algumas embarcações poderem cessar a sua atividade definitivamente (abates), mediante contrapartida financeira, diminuindo assim o esforço de pesca nas áreas adjacentes. Sugerimos a não implementação de unidades de produção aquícola nas zonas limítrofes, e a compensação financeira direta aos pescadores. Esta última foi tida em conta, mas a fórmula encontrada pelo Centro de Ciências do Mar (CCMAR), interlocutor imposto, dos pescadores, foi totalmente descabida e injusta! O governo tem de dialogar diretamente com os pescadores».
O coletivo de pescadores e armadores sustenta ainda que «o documento legislativo apresentado nesta consulta pública contem pouca informação. Não está discriminada a área que realmente fica imediatamente interdita à pesca. O documento identifica toda a área sem definir a organização espacial, regras e outras questões. Por questões de transparência na proposta de lei deveria constar um plano para a gestão do futuro Parque. Remeter tudo para futuras Portarias é tudo o que não se pretende. Este processo foi conduzido pelo CCMAR da Universidade do Algarve. Sem querer retirar mérito à instituição, com quem muitas vezes colaboramos em conjunto, afinal qual o parecer da nossa instituição oficial, o Instituto do Mar e da Atmosfera (IPMA), sobre este projeto?».
«Entendemos perfeitamente que a «maternidade» deste tipo de projetos arranque de universidades devido ao financiamento, mas nesta fase o IPMA tem de ter uma voz ativa no processo. A criação de um Parque Marinho no Algarve é possível. No entanto começou logo muito mal tentando omitir a verdadeira opinião dos Pescadores. No nome deveria constar «Área Marinha Protegida de interesse Pesqueiro». Usa-se o argumento de preservar a pequena comunidade de pescadores de Armação de Pêra e simultaneamente esquecemos as comunidades vizinhas? A base de construção de um processo deste passa irremediavelmente pela participação ativa daqueles que serão mais afetados com o projeto. Já os avós dos nossos avós trabalhavam na zona em questão. Para a esmagadora maioria dos pescadores este projeto é uma imposição».
Por fim, «uma reflexão: acreditamos que preservar uma área sem a concordância dos pescadores trará algum tipo de resultados futuros? Queremos, mais do mesmo?».
Esta não é, contudo, a primeira vez que a QUARPESCA contesta este projeto, e o assunto já mereceu também a atenção do Bloco de Esquerda Algarve.
Também a Olhãopesca já se posicionou contra o ato de classificação da Pedra do Valado.