Polícia de Segurança Pública (PSP) fez hoje buscas domiciliárias e deteve três jovens do grupo que agredia imigrantes em Olhão.
O Comando Distrital da Polícia de Segurança Pública (PSP) de Faro convocou uma conferência de imprensa, hoje ao final da manhã, para dar conta de uma operação de investigação criminal que visou o grupo de jovens que agrediu um cidadão nepalês em Olhão.
Antes do encontro com os jornalistas, a PSP efetuou seis buscas domiciliárias e outras diligências de investigação, bem como a detenção de três dos jovens mais ativos do grupo, com vista à sua apresentação à autoridade judiciária competente.
Até ao momento, foi possível identificar 11 jovens, oito rapazes e três raparigas, com idades compreendidas entre os 14 e os 16 anos, pertencentes ao grupo, que participaram ou presenciaram nos atos violentos.
Segundo o comandante Dário Prates, «alguns dos jovens residem em alguns bairros sociais e têm uma frequência escolar dentro daquilo que é normal».
Hoje, «as detenções foram feitas no cumprimento dos mandatos de detenção fora do flagrante delito» emitidos pelo Ministério Público a 6 de fevereiro, «para estagnar a atividade grupal criminosa».
Os três detidos têm todos 16 anos e serão agora presentes ao Juiz de Instrução Criminal para lhes serem aplicadas medidas de coação consideradas necessárias «tendo em conta a prova, o perfil e o impacto que este caso teve na sociedade e na segurança».
O chefe do comando distrital da PSP de Faro chamou a atenção para o facto de estas serem as «primeiras diligências que fazemos neste caso. Consideramos que há ainda muito trabalho para fazer ao nível da investigação criminal. Caso haja, da parte dos menores envolvidos, a realização de atos contrários à lei, que associamos ao conceito de crime, serão sujeitos a medida tutelar educativa. Em caso de terem sido meros observadores ou que presenciaram os atos, aí podem estar em situação de risco e isso terá de ser comunicado à Comissão de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ)» de Olhão.
«É uma informação que tem de ser articulada com o Ministério Público, que neste momento vai ser feita, para o devido encaminhamento daquilo que diz respeito aos menores», alertou.
Afirmação de gangues e grupos de Instragram
Sabe-se agora que os jovens comunicavam entre si através de um grupo fechado na rede social Instagram, à qual atribuíram o nome de «8700».
«Acreditamos que, além das motivações inerentes aos crimes indiciados (roubo e ofensas à integridade físicas qualificadas), existem também motivações que se prendem com a promoção da sua afirmação nas ruas de Olhão, e os que os acompanharam e presenciaram os atos violentos, como forma de pertença ou integração no grupo. Deste modo, em poucos dias, contribuíram fortemente para o aumento do sentimento de insegurança, sobretudo das comunidades indiana e nepalesa, residentes em Olhão, não obstante as suas condutas ilícitas visarem também cidadãos de outras nacionalidades, incluindo a portuguesa».
Os suspeitos estão agora indiciados por cinco crimes de roubo, quatro crimes de ofensa à integridade física qualificada e um crime de dano com violência.
Das oito ocorrências sinalizadas, a PSP só tinha registo de duas: um roubo, em que a vítima é um jovem português de 16 anos, e a desordem num restaurante indiano.
«Realçamos que nenhuma das vítimas estrangeiras dos roubos sentiu a confiança necessária para apresentar queixa crime, o que demonstra bem a sua condição de vulnerabilidade», referiu o comandante Dário Prates.
Ainda assim, «a prova obtida foi para os três jovens de maior idade que foram sujeitos à medida de detenção. Em relação aos outros, a informação recolhida é que presenciaram alguns dos atos. Uns participavam ativamente e outros que ficavam a ver, a filmar e de alguma forma acabam por ser testemunhas no processo. Ainda não está percebido a intervenção de cada um. Vamos ver o que é que a investigação nos vai trazer de futuro».
Mais do que demonstrações de xenofobia, Prates frisou que «os suspeitos aproveitavam situações de especial vulnerabilidade das vítimas, por vezes imigrantes, outras da idade e até da condição social» dos agredidos.
«Uma pessoa em situação de sem-abrigo que andamos à procura e a tentar identificar também foi alvo de extrema violência. É uma pessoa com cerca de 30 anos e que será estrangeira e estará ainda por identificar. Agora vamos ver se as motivações por trás disto têm mais a ver com a exploração da vulnerabilidade do que propriamente mera xenofobia, porque temos cidadãos vítimas de crime que não são estrangeiros, são portugueses», como é o caso de um jovem de 16 anos.
As autoridades falam mesmo em «afirmação de gangues. Para se afirmarem perante os pares, perante outros jovens nesse contexto, nas ruas de Olhão. Noutras cidades e noutras ruas devem existir outros gangues, aproveitando as oportunidades junto de alvos» mais fracos. No entanto «suspeitos tão novos não é muito normal e é isso que nos preocupa também».
Câmaras de CCTV ajudam mas não resolvem crimes
Apesar de não ter sido apresentada queixa após a agressão divulgada nas redes sociais a 2 de fevereiro, a PSP conseguiu identificar a vítima e recebeu o seu testemunho, após diligências de agentes de proximidade junto de comunidades de imigrantes. Houve ainda conhecimento de um outro roubo, a que correspondeu uma segunda queixa, a outro cidadão da comunidade nepalesa.
Na sexta-feira, 3 de fevereiro, foram identificados todos os intervenientes das agressões, tendo sido possível contar com a informação e os contactos dos polícias do Programa da «Escola Segura». Um dos intervenientes foi constituído arguido e foram inquiridas duas testemunhas.
Foi também possível sinalizar outras ocorrências violentas associadas ao grupo, a maior parte das quais, sem registo de qualquer queixa formal.
O caso mediático «reporta-se a uma ocorrência de dia 25 de janeiro. Antes, a primeira ocorrência que temos sinalizada para este grupo foi no dia 15 de janeiro, de uma pessoa em situação de sem-abrigo, que está por identificar. A última sinalizada foi no dia 30 de janeiro, esta já com participação à polícia e que tem a ver com a ofensa à integridade física e danos num restaurante indiano. Não fechamos a possibilidade de terem existido ocorrências anteriores», esclareceu o superindentente.
Os agentes procederam ainda à visualização de mais de 20 mil vídeos, bem como de centenas de horas de imagens de CCTV (Circuito Fechado de Televisão).
«Olhão é uma das cidades que tem um sistema de CCTV público. Esse sistema pode dar a possibilidade, numa fase antes da prática do crime, de ter um efeito preventivo. Ou seja, as pessoas sabendo que estão numa via pública e que estão sujeitas a videovigilância, podem inibir condutas desviantes. Não sendo isso possível, pode haver aqui deteção de ocorrências e permitir à polícia que está a ver esse sistema de CCTV, de enviar os meios ao local para responder a uma emergência/urgência que se pode verificar. E quando isto não é percetível, podemos ter ainda a vantagem, que foi o que se verificou neste caso, de recolher imagens que dizem respeito à atividade do grupo, não necessariamente de imagens das agressões, mas poderá haver relevância nos caminhos, nos acessos, quando eles se dirigiram às vítimas, quando fugiram, tudo pode dar informação muito útil, como foi o caso», explicou.
No entanto, «se não tivermos a informação do que se está a passar no terreno, só com base na imagem, podemos estar com uma interpretação errada da mesma. Daí ser relevante a oportuna comunicação à polícia».
PSP pede aos jovens que promovam cultura de inclusão
No final da conferência de imprensa, o superintendente Dário Prates deixou «uma mensagem bem clara» a todas as comunidades de migrantes em Portugal e, em especial, as que vivem, estudam, visitam ou trabalham no Algarve.
«Com esta operação, percebemos que a perceção que houve da parte dos próprios pares dos suspeitos, alunos das escolas que eles frequentam, são contrários a esta cultura de violência, assim o afirmaram junto do Presidente da República. Foram críticos a este tipo de condutas», sublinhou.
«A Polícia, enquanto representante do Estado, tem as obrigações de respeitar e de proteger os direitos fundamentais de todos os cidadãos, incluindo o direito à justiça. Todos devem ter a confiança necessária para apresentar queixa quando são vítimas de crime, contando sempre com o apoio, a solidariedade e o empenho policial para a salvaguarda dos seus direitos fundamentais».
O comandante fez ainda um apelo «aos cidadãos, em especial aos mais jovens, para aderirem a uma cultura de inclusão, que promova a paz social, o respeito pelos direitos de todos, não bastando a indiferença perante casos de flagrante abuso. É necessário desafiar frontalmente estes atos de violência exercidos perante vítimas vulneráveis através da oportuna comunicação» às autoridades.
Entretanto, foi articulado com o Alto Comissariado para as Migrações – Centro Nacional de Apoio à Integração de Migrantes do Algarve, ajuda às vítimas da comunidade nepalesa.