Inspirada numa obra de Botticelli, um dos maiores pintores do Renascimento em Itália, o monumento de homenagem ao estudante da Universidade do Algarve (UAlg) representa 14 livros, sete com os saberes clássicos. Ficará instalada no centro de Faro, próximo do campus da Penha. A inauguração está prevista para setembro.
O concurso público, aberto a todos os estudantes, professores e pessoal não docente da academia algarvia, terminou em março e resultou em nove candidaturas.
O projeto vencedor é uma criação de um coletivo, composto pelo docente e diretor do curso de Artes Visuais, Pedro Cabral Santo, Nuno Esteves da Silva e Sérgio Vicente, que receberam o prémio de 50 mil euros, financiado pela autarquia farense, para a conceção e montagem da peça.
As candidaturas foram analisadas por um júri composto por elementos da Universidade do Algarve (UAlg), da Associação Académica da Universidade do Algarve (AAUAlg) e da Câmara Municipal de Faro.
Ao barlavento, Pedro Cabral Santo, representante do coletivo, detalha os pormenores da obra de arte pública que será colocada na Avenida Calouste Gulbenkian, junto à rotunda do hospital, num local próximo do campus da Penha.
«O que fizemos foi produzir uma coluna de livros. São 14 volumes com as artes abrangentes que fazem parte dos saberes clássicos que norteiam o ensino universitário. O livro é uma metáfora já muitas vezes utilizada, mas foi a que nos pareceu mais adequada. Muitas vezes, somos tentados a seguir uma estética puramente figurativa. Neste caso, quisemos fugir disso porque pretendemos tornar o objeto mais intemporal e menos datado. Permite um espaço de respiração que funciona de trás e para a frente. O livro é uma alegoria, pois há muito que ultrapassou a categoria de mero objeto. Quisemos fugir do facilitismo e impulsionar essa ideia mais vasta», detalhou.
Na prática, a peça «vai medir cinco metros de altura, um requisito dado pela própria edilidade, e vai agora começar a ser construída em betão. Vai ser feita em 14 módulos, os 14 livros, com lombadas que estarão dispostas numa certa dinâmica. Em sete dos volumes existirão sete inscrições, dos saberes clássicos universais. Tudo o resto faz composição: umas rodam, outras estão sobrepostas. Vai ser toda branca, uma espécie de monolítico branco, com as palavras gravadas em relevo», explicita o professor e diretor da licenciatura.
Em relação a influências, o também investigador do Centro de Investigação em Ciências da Comunicação e Artes (CIAC) afirma que houve uma junção coletiva de ideias.
«Tivemos um brainstorming. O princípio que nos norteou foi a ideia clássica de universidade. Recuar um pouco aos primórdios. O que é que se pretendia com o ensino universitário? Dotar os alunos de um conhecimento universal e abrangente. Havia muitas hipóteses para se fazer tal monumento. Como o nosso background são as artes visuais e a história de arte, lembrámo-nos de uma pintura de Botticelli, onde ele faz uma alusão às artes e foi a partir dessa obra que nos surgiu a inspiração para o trabalho. As imagens não são órfãs, elas vivem algemadas numa espécie de tradição e filiação e foi isso que fizemos».
Na verdade, a influência de um dos maiores pintores do Renascimento na Itália, elevou ainda mais a dificuldade na elaboração da proposta.
«Houve imenso cuidado no seu simbolismo e também em criar um dispositivo artístico que dê muita dignidade à cidade. Houve um tremendo cuidado do ponto de vista estético, simbólico e também tendo em conta o local específico, que é complexo», admite.
O local atribuído ao monumento de homenagem ao estudante da UAlg foi escolhido pela autarquia farense em conjunto com a AAUAlg.
Segundo Rogério Bacalhau, presidente da Câmara Municipal de Faro, «queríamos um sítio com alguma visibilidade e movimento de pessoas, e que de alguma forma fosse um local onde os estudantes também passassem» com frequência.
Nesse sentido, «escolhemos a Avenida Calouste Glubenkian, junto à rotunda do hospital, depois da passadeira da Escola Básica da Penha. É um local próximo campus do campus da Penha e movimentado. Aí existe um espaço amplo, junto a uma passadeira, que cria segurança no acesso à peça. Tivemos o cuidado de criar condições para que os alunos e as suas famílias pudessem tirar fotografias perto do monumento, como acontece noutros locais », por exemplo, no lettering da cidade junto à doca de recreio.
Questionado pelo barlavento sobre qual a importância desta proposta para a comunidade académica, Bacalhau afirma que é «uma homenagem muito singela. Faro vive muito a sua universidade, que além da componente académica, também tem um lado cultura, social e económico muito importante. Não consigo imaginar como seria Faro sem a UAlg nem consigo imaginar sequer como seria a região. Muitos dos quadros superiores que temos hoje no concelho e no Algarve vieram da UAlg. Todo o conhecimento que temos é produto interno do Algarve, através da sua universidade. É, sem sombra de dúvidas, a entidade que mais contribuiu para o desenvolvimento da região, desde há 40 anos, quando iniciou, e em todos os campos. É uma homenagem merecida. Estamos a chamar a atenção para os alunos, mas, em boa verdade, é também uma homenagem a toda academia, desde os técnicos, funcionários, aos professores, estudantes, toda a academia», sublinha o autarca farense.
Por sua vez, Saúl Neves de Jesus, vice-Reitor da UAlg, afirmou ao barlavento que a previsão é que a obra escultórica seja instalada em meados de setembro, no início do ano letivo 2021/2022, «provavelmente integrada numa cerimónia, como na semana do acolhimento ou na abertura solene do novo ano». Já em relação à colaboração entre o município e a UAlg, o vice-Reitor refere que é «uma constante a todos os níveis e nas mais diversas áreas», numa aproximação mútua.
Quanto ao novo monumento, as palavras de Saúl Neves de Jesus dão o crédito da iniciativa à Câmara Municipal de Faro.
«Ficamos satisfeitos por sermos acarinhados e reconhecidos. Óbvio que não precisávamos desta manifestação para sentir isso, mas é mais um sinal da valorização que o município de Faro dá aos estudantes da UAlg, que são muito representativos na cidade, são em grande número e têm um contributo importante para o dinamismo que existe no município », conclui.
COVID-19 agravou ainda mais as dificuldades dos estudantes do ensino superior
As associações e federações académicas realizaram um estudo sobre o impacto da COVID-19 no ensino superior em Portugal, entre os dias 24 de março e 10 de abril, com o intuito de recolher informação sobre os estudantes em áreas como a habitação e o rendimento.
No total, foram contabilizadas 4013 respostas. A Associação Académica da Universidade do Algarve (AAUAlg) também participou e deu a conhecer os resultados ao barlavento, na terça-feira, dia 4 de maio, em comunicado conjunto.
Assim, 85 por cento dos estudantes deslocados a nível nacional mantiveram a sua residência na zona onde estudam, sendo que 52 por justificaram pela a incerteza acerca do retorno das aulas presenciais.
Sobre a capacidade económica para voltar a residir fora do agregado familiar, um quarto dos estudantes inquiridos afirma não conseguir. Um quarto dos estudantes perceciona ter 50 euros ou menos depois de pagas as despesas fixas (propinas, transporte e habitação), sendo que apenas um terço afirma que esta alteração no orçamento mensal se deveu à pandemia.
«É necessário destacar que 3,4 por cento dos inquiridos alega não ter computador pessoal, e quase um quarto dos estudantes inquiridos afirma ter dificuldades em suportar a frequência no Ensino Superior. Os custos que apresentam um maior impacto no orçamento familiar são a propina e o alojamento. Em resultado do descrito, 7 por cento dos estudantes pondera abandonar o curso por questões económicas », facto considerado o mais preocupante.
O estudo conclui que estudar numa universidade portuguesa «reflete-se numa enorme pressão sobre os orçamentos familiares, que se aprofundou com a pandemia pondo em risco o aproveitamento escolar dos estudantes bem como a conclusão dos seus estudos. Pode estar também na origem de problemas de saúde mental», flagelo que as associações prometem estudar em breve.
Licenciatura em Artes Visuais da UAlg
«é a mais atual» da área
Pedro Cabral Santo estudou pintura e escultura nas Faculdades de Belas-Artes de Lisboa e Porto, especializando-se nas áreas expressivas afetas à instalação e à vídeo-instalação. Quando surgiu a oportunidade de lecionar no curso de Artes Visuais da Universidade do Algarve (UAlg), não hesitou em aceitar. E explica porquê: «tenho uma costela algarvia, da Manta Rota, e para mim o Algarve é tudo. Gosto muito de pensar assim. O Algarve é a coisa mais bonita que há no mundo. Já dei aulas nas Caldas da Rainha e em Lisboa, mas quando surgiu a oportunidade de vir para cá, desisti de tudo e vim. Vim porque é um sítio onde me sinto muito bem, é fantástico, e é o sítio mais bonito de Portugal. É o sítio que chamo de casa».
Além disso, «uma das coisas que me deu muito alento quando vim para cá foi a possibilidade de contribuir para um curso de Artes Visuais que já existia e que tinha uma oferta formativa fantástica, diferente das outras onde lecionei. Vi isso e percebi de imediato que é uma algo especial. Este curso tem dado um contributo para se criar uma comunidade tendencialmente profissionalizante. A maior parte dos professores que dão aulas no curso são artistas praticantes e isso faz a diferença para os professores da conversa», compara. Na sua opinião, «os estudantes alunos têm um currículo estruturado do primeiro ao último ano, para lhes fornecer uma frequência daquilo que entendemos como a melhor e a mais atual, a que confere, à partida, as maiores ferramentas».
Próxima instalação artística será alusiva ao Grupo Folclórico de Faro
Rogério Bacalhau, presidente da Câmara Municipal de Faro, revela ao barlavento que a instalação da escultura de homenagem ao estudante da Universidade do Algarve (UAlg) integra-se também na estratégia do município para a candidatura de Faro à Capital Europeia da Cultura 2027.
«A academia tem um papel fundamental na formação dos agentes culturais. Muitos desses agentes que temos no concelho vieram ou têm ligações à UAlg. Este crescendo de associações, de agentes e de entidades, ao fim e ao cabo, tem sido muito positivo. Há 10 anos muitas exposições seriam impossíveis. Temos tido muito cuidado neste campo, ajudando e potenciando, seja com arte pública, ou com arte urbana». O edil farense avança ainda que «dentro de pouco tempo vamos ter também peças alusivas ao Grupo Folclórico de Faro, instaladas numa rotunda. Temos e estamos a preparar outras ideias, de forma a potenciar a cultura, para que as pessoas percebam que se trata de um agente de bem-estar e de melhoria da sociedade».