Monchique é exemplo considera António Costa

  • Print Icon

O tema não é novo e o Dispositivo Especial de Combate a Incêndios Rurais (DECIR) até já tinha sido apresentado na semana passada, durante a Feira Internacional de Proteção Civil e Socorro (Algarsafe), com Eduardo Cabrita, ministro da Administração Interna, a assistir.

Mas desta vez foi António Costa, primeiro-ministro, que decidiu deslocar-se a Monchique para ver as três etapas que envolvem a prevenção e o combate a incêndios. Começou por isso por ver em ação uma equipa de sapadores a limpar o terreno, tendo depois subido à Fóia para visitar um posto de vigia (no sítio da Madrinha) e terminou a visita com a exposição de meios, veículos e equipas, que integram o DECIR no Algarve este ano. E foi a 1 de junho, data que marcava o início da responsabilidade das autarquias se substituírem aos proprietários na limpeza dos terrenos privados. No entanto, foi pelo turismo que António Costa justificou esta deslocação ao concelho serrano no Algarve.

«Foi propositadamente que escolhemos Monchique, porque é um dos concelhos do Algarve que não tem praia, mas tem uma riqueza enorme, que é esta serra. Esta permite-nos ter uma boa produção de madeira e um conjunto de atividades associadas à exploração florestal, desde a criação do porco preto, à apicultura, ao medronho», argumentou.

Na lógica do primeiro-ministro, para ter uma região coesa há que apostar na excelência do turismo de sol e praia, mas também valorizar o que o outro Algarve tem para oferecer, como é o caso do turismo de natureza ou termal. E não só, pois é necessário também, na perspetiva de António Costa, valorizar as atividades que funcionam para lá do turismo, que não dependem da sazonalidade, porque só é possível fixar populações, se estas tiverem uma fonte de rendimento, se tiverem emprego. Neste caso, a serra é o principal ganha pão. Daí a prevenção de incêndios assumir um papel central, pois a serra pode perder mais valias se houver situações catastróficas como as vividas no passado, afirmou.

Por outro lado, Monchique é o concelho apontado, a nível nacional, como o primeiro no top 20 de risco de incêndio, num estudo elaborado e divulgado há duas semanas. Apesar das críticas de Rui André, presidente da Câmara Municipal de Monchique, acerca destes dados, «que só contribuem para pôr o enfoque numa situação que todos conhecem», o primeiro-ministro deitou um pouco de água na fervura. «Ter a noção do risco de incêndio não serve para meter medo, mas para termos todos consciência de que o fogo é uma ameaça real, para a qual temos que nos preparar», contrapôs.

E foi isso mesmo que António Costa foi ver em Monchique. «Esta tarde pudemos ver três fases muito importantes da preparação que, em todo o país, está a ser feita para podermos viver este verão de 2018 com maior tranquilidade e maior confiança. Vimos em primeiro lugar o trabalho extraordinário que o município está a fazer em conjunto com os proprietários para a construção das faixas de proteção à volta dos aglomerados, para construir as faixas de gestão dos combustíveis», descreveu o governante.

Apesar do prazo para limpar os terrenos pelos proprietários ter terminado no dia anterior à deslocação da comitiva, que integrava além do primeiro-ministro, Eduardo Cabrita, ministro da Administração Interna, e os dois secretários de Estado José Artur Neves (Proteção Civil) e Miguel Freitas (Florestas e Desenvolvimento Rural), não há uma caça às multas.

«Este é um trabalho que está a ser feito em todo o país e deve continuar. Todos temos que continuar a limpeza seja estado, autarquias, particulares, sejam concessionários, todos os dias, salvo quando a proteção civil avise que há risco. Quem não fez ainda está a tempo de fazer. Claro que a Guarda Nacional Republicana (GNR), como qualquer força da autoridade, vai cumprir a sua função, mas insisto que o nosso objetivo não é andar a cobrar multas», alertou António Costa. O objectivo é criar um território seguro, não devendo as pessoas serem motivadas pelo medo da multa, mas pela necessidade de contribuírem para a sua segurança e das que os rodeiam.

A visita seguiu ainda para a etapa seguinte, a da vigilância, num dos dois postos de vigia do concelho, que integra a rede primária e que está a funcionar entre maio e novembro. Este é um facto essencial, pois «o fogo não nasce por si próprio, resulta da ação humana, sendo esta criminosa ou negligente», referiu.

Também na vigilância Monchique é apontado como um bom exemplo, porque conseguiu mobilizar a Associação de Produtores Florestais e a Associação de Caçadores para participar neste esforço, além dos proprietários para a limpeza dos terrenos.

Há, porém, um momento em que já nada há a fazer a nível de prevenção. É nessa altura que entra a terceira fase, a do combate ao incêndio e foi também os meios e recursos disponíveis do DECIR no Algarve que António Costa teve oportunidade de ver, na zona do Centro de Meios Aéreos de Monchique. São diversas as entidades envolvidas, desde os Bombeiros, elementos do Instituto de Conservação da Natureza e Biodiversidade, até à Guarda Nacional Republicana. «É o conjunto destas entidades que está mobilizada para intervir se a prevenção falhar, se a vigilância não for suficiente, se houver comportamentos de risco e se houver incêndio», argumentou.

A verdade é que se for necessário intervir, o ataque tem que ser rápido para evitar um incêndio de grande escala.

«Em média têm havido 60 incêndios por dia ao longo dos últimos dois meses. Felizmente tem sido possível atacar e extingui-los a tempo e horas. Esse é o esforço que todos temos que fazer, sem esquecer o risco existente», concluiu.

Prevenção é tema recorrente, diz Rui André

Apesar de Monchique estar no topo do risco de incêndio, o presidente da Câmara Municipal. Rui André aproveitou a deslocação de António Costa, primeiro-ministro, para mostrar que há meios e capacidade de resposta para enfrentar a época que se avizinha.

«Temos sido um exemplo na preparação para um cenário de risco que todos conhecemos. Nunca colocamos isso em risco também, porque sabemos qual é a realidade do concelho, sabemos que temos uma situação periclitante e que devemos estar atentos a toda a hora, não só no verão, mas ao longo do ano. E a prova disso é que a Câmara de Monchique tem feito aquilo que o país está agora a fazer», resumiu o edil.

Aliás, o autarca enumerou uma série de medidas que têm vindo a ser tomadas ao longo dos anos para minimizar catástrofes como as de 2003 e 2004, que ainda estão na memória de alguns residentes. Para isso, a autarquia tem assumido protocolos com diversas entidades, como os Bombeiros, a Associação de Caçadores, as Forças do Exército. Apesar de lamentar a centena de mortes do ano passado no centro do país, Rui André sublinha que não é por essa razão que estão a ser feitos esforços agora no concelho algarvio, até porque as medidas de prevenção já vêm de anos anteriores. Além da questão da segurança das populações, há que ver que «toda a capacidade económica do concelho depende da floresta e da natureza. Todo o trabalho que temos vindo a fazer não é mais do que a nossa obrigação e tudo o que temos vindo a colocar no terreno não é mais do que a nossa garantia de segurança para que, se tivermos uma ocorrência podermos dizer que estamos prontos para responder de forma necessária», resumiu.

«O governo tem grande mérito. Aquilo que as pessoas entendiam como uma obrigação (limpar os seus terrenos), hoje já acham que não estão a fazer um favor a mais ninguém do que a si próprios, à sua família, ao seus bens. Isto é uma mudança de paradigma que devemos aproveitar», afirmou Rui André. Uma das oportunidades para tirar partido será clarificar o estatuto profissional dos Bombeiros.

«Vamos avançar em Monchique com a criação destas unidades profissionais ao longo do ano. Temos que ser capazes de criar estas relações de operacionalidade para melhor responder a uma ocorrência», justificou.

Além de apetrechar Bombeiros com meios e equipamentos necessários, foi criado o programa Casas Sem Fogo há uns anos em Monchique, já replicado noutros locais, que pretende ensinar os proprietários a limpar os terrenos e como se devem preparar para a época de maior risco de incêndio. Da mesma forma, o concelho serrano foi pioneiro na criação de um programa de resgate de animais em catástrofes como os incêndios, desmistificando a ideia de que estes, se forem soltos, salvam-se. «Não é verdade e, muitas vezes, até são um foco de incêndio noutras zonas. Os nossos Bombeiros têm formação para esta situação», exemplificou.
O autarca só destacou a primeira posição do top de risco para deixar um recado a António Costa. «Gostava muito que nos próximos dias, este ranking que nos põe no primeiro lugar, fizesse corresponder também a um reforço nos meios, quer de combate, quer de vigilância e que pudéssemos também conseguir colocar aqui mais capacidade em termos de meios de intervenção», pediu. Um dos meios essenciais é a máquina de rasto, para a qual o município já efetuou uma candidatura, em parceria com a Associação dos Produtores Florestais do Barlavento Algarvio, e sobre a qual espera a aprovação.

Só na limpeza das faixas, a autarquia tem previsto gastar mais de 1,5 milhão de euros. «Isto tudo custa muito dinheiro e ainda nem sequer estou a falar da fase seguinte que é substituir-mo-nos aos particulares que não cumpriram o prazo. Este é um dia importante, porque marca uma quebra entre aquilo que foi a intervenção dos particulares e o dia que legitima a intervenção da Câmara», disse ainda.