maréS – Festival Cultural da Culatra vai mostrar o talento da comunidade

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Criatividade, identidade e sustentabilidade são as palavras-chave do maréS – Festival Cultural da Culatra que conta com o envolvimento e organização de toda a comunidade.

Mário Padinha, 29 anos, sócio e voluntário na Associação de Moradores da Ilha da Culatra (AMIC) é um dos envolvidos na organização do maréS – Festival Cultural da Culatra, que decorrerá de 27 a 31 de maio com um programa de atividades para todos os públicos.

«Vamos ter arte, música e cinema. Um pouco de tudo. Este festival é importante porque é um projeto-piloto. É a primeira edição, estamos a experimentar e é algo de nós para nós, de culatrenses para culatrenses. Serve também para mostrar quem somos enquanto comunidade», descreve. Envolve ainda as três principais entidades: a AMIC, o Clube União Culatrense e a Associação Nossa Senhora dos Navegantes. É também uma oportunidade para mostrar uma nova forma de fazer artesanato a partir de resíduos marinhos, como redes, cabos e boias, que tem vindo a ser dinamizada na ilha.

Mário Padinha.

«A Sciaena tem vindo a dar formações à população, através de workshops, sobre como usar a criatividade para dar uma nova utilidade aos resíduos da pesca e outros, de forma rentável», descreve.

De forma individual e em grupo, aquela organização sem fins lucrativos, de âmbito nacional e internacional, criada em 2006 e com sede na Universidade do Algarve, tem vindo a mostrar aos culatrenses como transformar o que a maioria ainda considera lixo, em objetos utilitários com design e potencial de venda. Isto porque o reaproveitamento faz parte do processo de transformação económica e social em marcha no núcleo no âmbito do projeto Culatra 2030. Jovens, crianças e idosos, todos têm participado.

«Vamos receber um forno e um trituradora de plástico» através do Centro de Ciência Viva do Algarve, para que os alunos da escola testem novos processos. «Estamos a tentar dar um passo mais à frente com a criação de uma marca própria», ao exemplo do que já acontece com as ostras da Culatra, «de forma a valorizar outros bivalves e o nosso peixe», adianta.

Do programa consta uma exposição de Rita Carrasco, investigadora do CIMA que se tem dedicado à temática da biodiversidade marinha e do lixo marinho através da arte. Um ponto alto será a atuação do artista culatrense Ricky B, no Largo da Igreja, sexta-feira, dia 27 de maio às 18h45.

No sábado, inaugura a exposição de fotografia de Mário Padinha, ex-formando do curso de fotografia profissional da ETIC_Algarve. Chama-se «(A)MAR» e para este trabalho, embarcou com o pai e o irmão que são pescadores, depois de legalizar os procedimentos formais.

Foto da série «(A)MAR» de Mário Padinha.

O cinema ao ar livre também consta do programa. Outro ponto alto será a estreia do documentário «Vamos à vida», de Pedro Dias, que contou com a produção da ETIC_Algarve e foi possível graças a um financiamento participativo.

O filme mostra como no Algarve, mais do que uma profissão, ser pescador é um estilo de vida seguido pela maioria dos moradores da Culatra. Histórias das horas passadas no mar, de aventuras e perigos, angústias, superação, companheirismo e solidão.

Uma das ideias dos jovens envolvido na organização do festival é recuperar duas enormes boias que deram à costa, quase de certeza vindas da área Piloto de Produção Aquícola da Armona, e transformá-las num cavalo-marinho gigante, coberto com materiais arrojados do mar. Chegaram a pedir a consultadoria técnica do mestre inventor farense Tó Quintas, que se mostrou disponível para ajudar. A ideia, contudo, já não foi a tempo desta primeira edição. «Sim, ele deu-nos algumas bases de forma a facilitar os trabalhos», confirma Mário Padinha.

Ainda na lógica de aproveitamento, «vamos ter uma exposição de arte de rua em que vamos reutilizar barcos tradicionais», pelos artistas Rita Contente, o Vasco Abreu e o Daniel Justo, ao longo do festival.

Com a ilha a ser cada vez mais procurada por turistas, como é que a comunidade vive esta pressão? «É mesmo por isso que queremos também organizar este evento. Tem que haver um equilíbrio e as pessoas têm de conhecer a nossa realidade. Nós somos pessoas iguais a quaisquer outras. No verão, por vezes é complicado. Estamos em nossas casas e há quem espreite e tire fotografias. Estamos habituados a comer nos pátios e hoje é impossível, não há privacidade. Acho que este não é só um trabalho interno nosso, mas também cabe aos guias turísticos sensibilizar. Infelizmente há muitos que têm apenas a carta de marinheiro, falam inglês e vendem-nos como se fossemos atrações. Imagine o que é a minha avó grelhava o peixe à porta de casa e era constantemente fotografada sem pedir autorização, por estar apenas a fazer uma simples tarefa do dia a dia. Sentia-se incomodada. Por vezes, é complicado, não somos um jardim zoológico», compara.

«De resto, há até uma grande facilidade de interação entre os turistas e os locais. Eles também nos ajudam» e será sempre bem-vindo quem vier por bem.

Esta iniciativa realiza-se no âmbito do projeto Culatra – Comunidade Sustentável, promovida pela AMIC em parceria com a Sciaena.

Insere-se no grande desafio do Projeto Culatra 2030, que promove a transição energética, o respeito pela comunidade, ecossistemas e sustentabilidade. Tem financiamento do Programa Cidadãos Ativ@s do EEAGrants, operacionalizado pela Fundação Calouste Gulbenkian e Fundação Bissaya Barreto.

Presentes no Dia do Pescador

Este ano, o Dia do Pescador, celebrado na segunda-feira, dia 31 de maio, terá uma prenda especial para os homens do mar, no âmbito do maréS – Festival Cultural da Culatra. No Centro Social da Culatra, crianças e idosos têm vindo a transformar artes de pesca em sacos que serão usados durante a faina para recolher todo o tipo de materiais poluentes. «Estamos a usar as redes perdidas e abandonadas. A bordo, são mais úteis que os sacos de plástico, pois deixam passar a água. Estes sacos também servem aos visitantes, para que quando forem à praia possam trazer o lixo que fizerem e encontrarem», explica Sílvia Padinha, presidente da Associação de Moradores da Ilha da Culatra (AMIC). Além disso, Mário Padinha, formado em fotografia pela ETIC_Algarve, tem vindo a fotografar as cerca de 60 embarcações do núcleo com vista a uma exposição para celebrar a efeméride, um projeto que se chama «Proas» e que recolhe os elementos identitários de cada barco. Também para os pescadores está prevista uma tarde de fados ao final do dia.

Manifesto do Visitante Responsável

Uma das iniciativas previstas no programa do maréS – Festival Cultural da Culatra é a apresentação do Manifesto do Visitante Responsável, publicado em papel reciclado e formato desdobrável.

António Martins, da Associação de Moradores da Ilha da Culatra (AMIC) e Gonçalo Carvalho, da Sciaena, uma organização sem fins lucrativos de âmbito nacional e internacional, criada em 2006, e com sede na Universidade do Algarve (UAlg), têm estado a trabalhar em formas de passar a mensagem para diversos públicos-alvo.

José Nunes da Make it Better, que desenvolveu todo o diagnóstico participativo em todos os pilares da agenda de transição da Culatra, fez o Manifesto do Visitante Responsável.

Segundo explica André Pacheco, coordenador do projeto Culatra 2030, «o objetivo é tornar a ilha numa zona de plástico zero. Vai haver informação e campanhas junto dos restaurantes e zonas de comércio para reduzir a entrada e sensibilização para o consumo». Sílvia Padinha, dirigente da AMIC corrobora.

«Há direitos e deveres. A Culatra está inserida num Parque Natural e queremos que qualquer visitante se sinta responsável por preservar este espaço. Claro que para isso a comunidade tem de dar o exemplo. Ou seja, queremos ter todos os restaurantes certificados para não haver a utilização de materiais descartáveis. Queremos criar aqui um ponto de alerta às problemáticas marinhas».