Marcelo pede desculpa a imigrantes nepaleses agredidos em Olhão

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Marcelo Rebelo de Sousa mostrou-se indignado pelo «tratamento desumano anti-democrático e criminoso» aos nepaleses em Olhão.

Depois de ter dado uma aula-debate na Escola Secundária Dr. Francisco Fernandes Lopes, na manhã de hoje, segunda-feira, dia 6 de fevereiro, Marcelo Rebelo de Sousa encontrou-se, à hora de almoço, com dois imigrantes agredidos nos últimos dias, sendo um deles o que foi atacado por um grupo de jovens na cidade, no dia 25 de janeiro.

«Tenho de agradecer ao dono deste restaurante que foi apoiar nesta situação. Por outro lado, também de cumprimentar alguém que também foi vítima de agressão duas noites seguidas», disse aos jornalistas.

O Chefe de Estado referia-se ao episódio de violência gratuita cujas filmagens foram publicadas nas redes sociais. Um dos nepalenses foi apanhado e agredido. Surge caído no chão, em posição defensiva, a tentar proteger-se de pontapés, murros e pauladas desferidos pelos agressores encapuçados, em pleno espaço público. Terá ainda ocorrido uma tentativa de lhe queimar o cabelo.

A vítima «já tem o número de contribuinte e pode trabalhar a título precário. Tem um problema de saúde que ainda está em recuperação. Aconteceu com ele o que aconteceu com outros que são levados para o Alentejo, para trabalhar na agricultura ou construção civil mas depois não encontrou emprego que tinha sido prometido e veio» para Olhão.

Neste momento, «a Câmara Municipal vai tratar do enquadramento em termos de ação social e por outro lado, ele está disponível para trabalhar na restauração. Não há justificação da agressão de que foi vítima e pedi-lhe desculpa por isso. De todo o modo, a um e a outro, que também descobri que tinha sido vítima de agressão, provavelmente pelo mesmo grupo, vamos ver se é possível encontrar enquadramento, mas isto é um outro problema estrutural, que é tentar detetar quem traz pessoas com falsas promessas para Portugal», frisou.

Marcelo Rebelo de Sousa sabe que este não é um caso único. «Sim. Há que estar atento para uma coisa que é muito importante: não se achar normal isto na sociedade portuguesa. Quem é agredido não tira emprego a ninguém, vai trabalhar e só tem dificuldade de regularizar a sua situação. E vai trabalhar em sectores onde não há portugueses. Por isso, não há nada que justifique esse tipo de tratamento desumano anti-democrático e criminoso e que não pode ser aceite como normal na sociedade portuguesa.

António Miguel Pina preocupado com «saúde mental» dos jovens

Em declarações aos jornalistas, António Miguel Pina, presidente da Câmara Municipal de Olhão, disse que o nepalês «tanto quanto sabemos pela conversa que tivemos agora com o cidadão nepalês, tem número de contribuinte mas ainda não tem número de utente do Serviço Nacional de Saúde (SNS). Temos de arranjar uma maneira de ele ser visto porque tem dores, fruto das agressões que foi alvo. Depois, temos de saber que qualificações tem e onde se poderá integrar no mercado de trabalho. Tanto quanto é percetível por muitos de nós, há sectores de atividade económica que têm falta de pessoas para trabalhar, seja na construção civil, seja na restauração ou na agricultura. Olhão não é um concelho tão requerente de mão de obra na agricultura, mas iremos tentar acompanhar». Questionado sobre se já há arguidos, «a Polícia de Segurança Pública (PSP) está a fazer o seu trabalho e contamos que em breve haja alguma notícia. Até lá temos de aguardar».

Pina não escondeu que alguns dos jovens «são conhecidos, até da comunidade escolar. Agora uma coisa é serem conhecidos e outra coisa é fazer prova» das agressões sem motivo que terão feito. «Quando se trata da justiça, não basta saber-se quem é. Sobretudo, é preciso provar e isso demora. Agora, é preciso dar esse tempo às autoridades para investigarem», reforçou. «Este é um caso isolado de uma grupeta de jovens. Não há nenhuma perceção de insegurança no concelho de Olhão. Aliás, ainda hoje foi reforçada pelo Presidente da República junto dos outros jovens o quanto a comunidade escolar, juvenil e geral repudia este tipo de atos. Não há aqui nada que nos preocupe do ponto de vista de uma atitude generalizada de repulsa perante os imigrantes no território», garantiu.
No entanto, o autarca manifestou-se também «bastante» preocupado com as causas de fundo. «Afinal, o que é que se passa do ponto de vista da saúde mental destes jovens para fazerem disto diversão? Tanto quanto sabemos, não são muito carentes do ponto de vista económico, têm famílias mais ou menos estruturadas. Levam-nos a crer que isto é um misto de diversão e exaltação das suas raivas. É preciso saber do ponto de vista de saúde mental o que se passa e se há mais problemas escondidos dentro da nossa juventude».

PAN Olhão repudia ato de «violência gratuita»

O deputado municipal do PAN em Olhão, Alexandre Pereira, classificou de «intolerável e inadmissível», o episódio de «violência gratuita» que aconteceu nas ruas da cidade, no dia 25 de janeiro, e cujas filmagens foram publicadas nas redes sociais. «A tortura, a xenofobia e a violência não podem ter lugar em Portugal. Temos de ser um país de total respeito pelos direitos humanos, onde os crimes de ódio sejam punidos e onde todas as pessoas, independentemente do seu contexto (ascendência, sexo, raça, língua, território de origem, religião, convicções políticas ou ideológicas, instrução, situação económica, condição social ou orientação sexual), se sintam seguras» como aliás, estabelece o 13.º artigo da Constituição da República Portuguesa. «Infelizmente, este não foi um ato isolado, existindo outros relatos de ataques contra imigrantes asiáticos. Casos como este requerem que sejam tomadas medidas efetivas». Ouvido pelo barlavento, o deputado municipal considera que os dados da Comissão de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ) de Olhão apontam para uma degradação do ambiente social em alguns bairros da cidade, onde aumentam os casos de violência doméstica, disfunção familiar e delinquência juvenil que merece já «uma resposta no terreno» sob pena de a insegurança aumentar a médio prazo.

Cristóvão Norte censura «agressão bárbara»

O presidente do PSD Algarve repudia «a vil, bárbara e degradante» agressão a um cidadão estrangeiro em Olhão. Segundo Cristóvão Norte, este ato, «tal qual o incêndio em Lisboa ou o regime de quase escravatura em Odemira, destapam uma realidade cruel, marcada por desumanidade e expressões de xenofobia que têm que ser denunciadas e punidas. Temos que tratar os outros com a mesma dignidade que desejamos que nos tratem a nós». E «temos que ter uma política de imigração responsável, que integre bem e dê trabalho e boas condições de vida e não uma política desregrada, muitas vezes dominada por redes de tráfico humano e criminalidade grave. Uma última nota para saudar a pronta ação e repudio indignado do Presidente da Republica».

Portugal «é tradicionalmente um país de emigrantes»

Na aula debate que teve lugar na na Escola Secundária Dr. Francisco Fernandes Lopes, em Olhão, o Presidente da República defendeu que os portugueses têm «a obrigação de perceber melhor» o que sentem os imigrantes quando chegam ao país, uma vez que Portugal é tradicionalmente um país de emigrantes. Marcelo Rebelo de Sousa reagiu assim às filmagens da agressão a nepaleses por um grupo de jovens, num vídeo publicado nas redes sociais, na sexta-feira, dia 3 de fevereiro. «É precisamente quando ocorre, e por isso é que fui tão rápido, que se deve tratar destas questões. Porque se for daqui a três meses, quatro meses, cinco meses, seis meses, a realidade banaliza-se. E ao banalizar-se, passa a considerar-se normal o que não pode ser considerado normal». «Daí até à xenofobia é um pequeno passo e tem de se estar atento porque significa menos democracia e, até, menos respeito daquilo que é a nossa experiência como país de emigrantes».