LAMA Teatro vai andar «À Babuja» num épico algarvio

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Uma carrinha que é espaço cénico e viatura para todas peripécias (algumas imaginárias, outras reais), três protagonistas, uma bateria e um saxofone. É quanto baste para João de Brito, André Canário e Igor Martins surpreenderem o público com um novo espetáculo que vai percorrer a região. Em entrevista ao barlavento, o encenador abre o roteiro deste épico algarvio. A estreia é sexta-feira, dia 14 de fevereiro, na Associação Recreativa e Cultural de Músicos (ARCM), em Faro.

barlavento: Depois do sucesso de «Carripana», eis que surge «À Babuja». Que nos pode dizer sobre esta nova criação?
João de Brito:
Este espetáculo parte da ideia de pegar na carrinha que deu aso à «Carripana», transformá-la e falar sobre várias temáticas, como por exemplo, os produtos regionais algarvios. É uma criação de raiz, e como tal, partiu de uma ideia vaga até se criar uma narrativa e levá-la à cena. Baseámo-nos a posteriori no clássico Dom Quixote e Sancho Pança, de Cervantes. Mas é uma inspiração e não uma recriação. Até o próprio livro é um adereço da peça. Gosto de dizer que é um épico algarvio, uma viagem ao longo da qual acontecem uma série de imprevistos. O que sobressai é a amizade. A necessidade do outro, de se ter um objetivo e de se precisar de alguém para o concretizar. Andares de mão dada com o outro em prol dos teus objetivos é das coisas mais bonitas que existem. Nesta peça, os protagonistas não vivem um sem o outro, nem sem esta terceira personagem interpretada pelo Igor Martins. Na verdade, nenhuma das três personagens vive sem as outras e o Igor acaba por revelar os acontecimentos da história. Embora toque música original ao vivo é fundamental para a narrativa. Aparece de surpresa, quando ninguém espera.

É uma criação coletiva?
Acaba por ser. Começo por dar os motes e depois há uma espécie de democracia em que todos contribuímos com ideias. Inclusive a Joana Bértholo que deu o apoio à dramaturgia , a Catarina Requeijo e a Yola Pinto que fazem a consultoria artística da peça. Isto porque, como sou ator e encenador, por vezes estou em cena e preciso de um olhar exterior. Mas quer o Igor, quer o André Canário, que contracenam comigo, também têm essa perspetiva, de fora, e assim, discutimos ideias entre os três.
Claro, a encenação é minha e as ideias iniciais também, mas depois abre-se o leque. Tomo as decisões finais, embora durante o processo as sugestões de todos vêm para cima da mesa e para o espaço cénico. Somos várias cabeças a pensar. Além disso contamos com os figurinos do José António Tenente e a cenografia e adereços da dupla Isabelle Yvonne e Carla Martinez.

Este é um espetáculo que também pensa no turista e no estrangeiro residente. Isso complica o vosso trabalho?
Passamos sempre por esse ponto de interrogação que é a premissa do programa 365 Algarve, que tem por alvo todas as nacionalidades. Durante a criação temos de pensar nisso. É obrigatório. Por isso é que este espetáculo é mais físico. Tem texto, mas é um texto que se entende. À partida, o público vai ter um apoio de guião em inglês. Se bem que é uma linguagem universal e acho que todos vão apanhar rapidamente o sentido. E embora existam algumas referências textuais fundamentais, turistas e residentes estrangeiros vão tê-las na palma da mão. Acho que vai ser bem recebido. É um espetáculo descontraído, que dá para todas as idades, a partir dos seis anos, mais ou menos.

Em «Carripana», o texto era mínimo ou nenhum…
Não havia texto. Só dizíamos os nossos nomes e eram onomatopeias. Em «À Babuja», vamos dar um apoio ao público para que possa acompanhar tudo sem perder alguns dos gatilhos da história. Pensámos em fazer este trabalho bilingue em cena, mas essa opção acabou por não fazer sentido.

Vão andar «À Babuja» por sítios pouco habituais. Como surge o itinerário da tournée?
De repente olhei para o mapa algarvio, que ainda é grande, e pensei. Os espetáculos itinerantes servem para que possamos ir a sítios onde os teatros não nos podem acolher, onde não vamos com regularidade, e ultrapassar toda uma série de fatores. O caráter muito ambulante destas criações com carrinhas permite que possamos trabalhar em qualquer lugar. «À Babuja» adapta-se a qualquer sítio. A Pechão nunca fomos. À Fuseta nunca fomos. À Praia de Salema e a Alte já fomos, mas menos vezes do que gostaríamos. Escolhemos 15 lugares, mas podíamos ter escolhido mais.

«À Babuja», expressão algarvia, que significa neste contexto?
A necessidade de pensar esta vivência de estarmos à beira Ria (Formosa) ou à beira mar, esta proximidade, embora também tenhamos a zona do barrocal e do interior. Nós algarvios somos inevitavelmente filhos disso, de estarmos próximos de tudo o que esta brisa marítima emana. E não só. Também significa estarmos à beira das pessoas. Foi até uma analogia que criámos. É um pouco o querer quebrar o caráter imponente que os teatros muitas vezes têm, que cria barreiras às pessoas a deslocarem-se. Nós tropeçamos nas pessoas. Não serão elas a procurarem-nos. De certeza que vai haver quem não esteja à espera de ver um espetáculo na sua rua, e isso é estar «À Babuja» das pessoas, pertinho delas. A expressão tem várias interpretações, além de ser o babujar do marisco.

Tiveram essa experiência com a «Carripana»?
Sim. Houve quem fosse totalmente apanhado de surpresa, por um mero acaso, e foi uma agradável surpresa para muitos. Uma vez, em Castro Marim, trouxemos todos os utentes de um lar para a rua. Calhou ser o aniversário de uma senhora. No final, disse-nos que foi a melhor prenda que podia ter tido, porque nem sonhava que iria ali acontecer um espetáculo. Numa situação normal, provavelmente nunca iríamos àquele lar, nem teríamos tido aquele público.

O LAMA Teatro faz 10 anos. Que mais podemos esperar?
Há uma série de projetos a acontecer. Arrancamos agora com o «À Babuja» e estamos a dinamizar o «Estojo». É um projeto educativo que alberga três grupos juvenis de Faro: o Teatro Improviso, o Panapaná e o Grupo Informal. Em conjunto vão criar um espetáculo na semana do Dia Mundial do Teatro (27 de março) com premissas minhas, embora a criação seja deles. Sou consultor artístico e eles vão apresentar ao público o trabalho que estiveram a fazer com caráter profissionalizante, num encontro que irá acontecer nessa semana. Será na delegação regional do Instituto Português do Desporto e Juventude (IPDJ), em Faro. Mais tarde, teremos o «FIT (IN)» que é um espetáculo que já estreou no Teatro São Luís, em Lisboa, e que vai fazer parte da programação do Teatro das Figuras, em março.

LAMA terá casa nova na Travessa Castilho em Faro

Numa altura em que o LAMA Teatro celebra 10 anos, o coletivo vai ter uma prenda há muito desejada, segundo avança ao barlavento o ator e encenador João de Brito.

«É uma nova e muito importante porta que se abre nesta efeméride. Vamos ter um espaço físico. Nunca o tivemos, um pouco por opção, e agora é um investimento», diz. «Vamos ter um espaço onde irão acontecer muitas atividades. Em março, começamos com aulas de teatro para todas as idades. A Sara Vicente ficará com grupos de crianças dos seis aos 10 anos. A Tânia Silva ficará com grupos dos 11 aos 16, e a Carolina Santos, da Máquina de Cena (em Loulé), ensinará os interessados numa faixa etária a partir dos 17 anos», detalha.

Além disso, o LAMA vai organizar «oficinas regulares de várias artes performativas, assim como e pequenos espetáculos, dentro das características do espaço, que não é uma sala de espetáculos, mas que dá para acolher alguns eventos mais experimentais e técnicos».

A nova sede do LAMA Teatro será na Travessa Castilho. «Era uma antiga sala de jogos que vamos transformar em black box/ estúdio. Vamos também convocar encontros mensais com outros profissionais para discutirmos ideias, conhecer o que cada um está a trabalhar. Tenho a certeza que muitas outras coisas vão surgir», remata.

Igor Martins, Isabelle Yvonne, Carla Martinez, João de Brito e André Canário.

15 datas pelo Algarve

Todas as sessões têm entrada livre, exceto as que se realizam em Faro, cuja entrada custa cinco euros. A compra antecipada de bilhetes pode ser feita através da BOL.

• 14 de fevereiro – ARCM, em Faro – 21h30
• 15 de fevereiro – ARCM, em Faro – 16h00
• 16 de fevereiro – Jardim Carreira Viegas, em São Brás de Alportel – 11h00
• 28 de fevereiro – Junta de Freguesia de Alte – 17h00
• 29 de fevereiro – Cerca do Convento do Espírito Santo, em Loulé – 11h00
• 1 de março – Praça do Mar, em Quarteira – 16h00
• 4 de abril – Largo da Igreja de Moncarapacho – 16h00
• 5 de abril – Zona Ribeirinha da Fuzeta – 17h00
• 12 de abril – Largo do Infante, em Sagres (Vila do Bispo) – 17h00
• 2 de maio – Praça Gil Eanes, em Lagos – 18h00
• 3 de maio – Largo dos Pescadores, na Praia da Salema, em Vila do Bispo – 17h00
• 8 de maio – Praça Marquês de Pombal, em Vila Real de Sto. António – 18h00
• 9 de maio – Largo da Igreja de Pechão – 21h30
• 10 de maio – ARCM, em Faro – 18h30
• 16 de maio – Feira Terra de Maio, no Azinhal – 17h00

«À Babuja» é uma peça sobre o amor ou sobre a busca por um amor e também sobre a amizade. Uma amizade marcada por muitas aventuras pelo Algarve de sol e praia e pelo outro menos mediático. Nesta viagem, o público vai conhecer ou reconhecer não só sítios, costumes e iguarias, como também trejeitos e formas de estar próprias das gentes desta região. Tudo com muito humor à mistura.

O LAMA Teatro é uma estrutura financiada pela Direção-Geral da Artes e apoiada pelo município de Faro. Esta criação tem o apoio do programa 365 Algarve.