Cerca de 80 por cento dos sócios da Associação dos Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve (AHETA) enfrentam uma quebra nas reservas na ordem dos 30 por cento em comparação a igual período de 2019, revela Elidérico Viegas. Se a pandemia do Coronavírus (COVID-19) se agravar, a hotelaria e o turismo do Algarve poderão sofrer quebras sem precedentes.
«As pessoas estão desorientadas», começa por dizer ao barlavento, Elidérico Viegas, presidente da Associação dos Hotéis e Empreendimentos Turísticos do Algarve (AHETA).
Cerca de 80 por cento dos sócios da AHETA enfrentam quebras na procura que já rondam os 30 por cento em comparação a igual período de 2019.
Ou seja, «não há ainda 60 por cento de reservas canceladas, o que sabemos é que há 80 por cento de hotéis no Algarve com cancelamentos. Os outros 20 por cento ainda não sabem porque trabalham com operadores turísticos e ainda estão a recolher esses dados», explica o dirigente.
Estes números são «apenas uma média. Até há pouco tempo, os hotéis dependiam quase em exclusivo dos operadores turísticos. Hoje, os operadores representam menos de 40 por cento do mercado. A maioria das vendas agora feitas online, pelas pessoas interessadas, que também cancelam as suas reservas por esta via, de forma mais rápida. As unidades que trabalham assim são as que estão mais vulneráveis e as que estão a sentir mais os cancelamentos», explica Elidérico Viegas.
A AHETA está a acompanhar os efeitos da pandemia de Coronavírus (COVID-19) todas semanas, através de um inquérito semanal.
«Estamos a falar numa grande falta de de procura do destino. Por esta altura, em 2019, já tínhamos 30 por mais reservas que temos nesta altura. Se este problema do Coronavírus se resolver até maio, as vendas retomarão, pensamos nós. Nesse cenário, ainda poderíamos salvar os meses de junho, julho e agosto. Mas será que vai ser assim? À medida que os dias vão passando e as reservas não entram, a percentagem comparativa vai aumentando», contabiliza.

Questionado se teme novas insolvências no sector, Elidérico Viegas não esconde a preocupação, apesar das medidas de apoio anunciadas pelo governo.
«Claro. Por proposta nossa, haverá uma linha de crédito para as micro e pequenas empresas. São 60 milhões para o governo a aprovar diretamente, porque senão, se fosse a banca a decidir quem estaria em condições de receber crédito, seria muito diferente».
Mesmo a curto prazo, há quem não saiba o que fazer para enfrentar esta crise.
«Há alguma emoção e confusão. Até há dois ou três dias, sentimos alguma ansiedade pela falta de um manual de procedimentos por parte da Direção-Geral da Saúde. Tardou, mas chegou. Agora os hotéis já sabem o que fazer, independentemente dos planos de contingência que têm em prática», diz.
«Além dos turistas que pretendem cancelar as suas reservas, também alguns hotéis consideram a possibilidade de serem eles a não aceitarem reservas. É preciso não esquecermos que estamos na fronteira entre a época baixa e a época turística e muitas unidades têm estado encerradas até agora. E tendo estado encerradas por outros motivos que não o Coronavírus, perante a dimensão deste problema, têm algum receio em reabrir e em aceitar reservas para um período em que normalmente estariam a funcionar», revela o presidente da AHETA.
Elidérico Viegas não quer, para já, admitir que 2020 será um Annus horribilis para o turismo do Algarve.
«Neste momento é difícil prever. Mas devemos estar preocupados. A verdade é que à medida que as coisas vão acontecendo, as preocupações aumentam. Temos que reconhecer que as preocupações de há dois ou três dias atrás, são maiores no dia de hoje. Estamos perante um processo evolutivo. A situação de hoje, amanhã pode ser pior. Nada disto é positivo, nem será no tempos mais próximos».
Certo é que «o motor de arranque para a época turística não terá o mesmo impulso», lamenta.
Uma nuvem negra já está no horizonte. Os hoteleiros previam uma rumaria a sul na quadra da Páscoa, por parte dos portugueses, que escolheriam o Algarve para as férias em vez de para outros destinos estrangeiros devido à pandemia do Coronavírus.
«Não viajando para o exterior, os portugueses tenderiam a escolher o Algarve, até mais do que no passado. Até porque há um grande receio em fazer viagens que impliquem recorrer ao avião ou aos aeroportos que são considerados os principais pontos de contágio. Isso deixava antever que os portugueses viajariam menos para o estrangeiro neste período e optariam mais por ficar no seu próprio país. E portanto, as nossas expetativas iam na perspetiva de acolhermos mais portugueses no período da Páscoa do que em anos anteriores. E também mais espanhóis, porque é um mercado de proximidade».

Elidérico Viegas admite que todas estas previsões «poderão já não acontecer porque tudo está em permanente evolução».
«Esta é uma situação que afeta toda a vida em sociedade. O turismo é uma atividade de pessoas para pessoas, e portanto, é das que mais se ressente em períodos de grande instabilidade. É o primeiro sector a sofrer com esta situação, que é nova e que traz problemas novos».
Para já, também «não vale a pena particularizar sectores, pois estamos a enfrentar algo que o mundo moderno ainda não conheceu. A sociedade atual nunca se confrontou com uma situação destas. Já vi cenários feitos por responsáveis bem colocados que apenas serviram para aumentar as preocupações. Fazem com que as pessoas os assumam como previsões verdadeiras e isso só contribui para aumentar as inseguranças».
Neste momento, «atendendo a que não existe um histórico sobre como funcionar nestas circunstâncias, os responsáveis vão gerindo a situação à vista. É essa a ideia com que se fica. Vão adaptando as medidas em função daquilo que o vírus vai impactando na vida das pessoas. As medidas ocorrem mais por reação do que por prevenção», critica.
«Isso cria instabilidade, insegurança, e enorme preocupação nos agentes económicos, que se vêm numa situação delicada, pois não conseguem prever a evolução do seu próprio negócio», diz.
O adiamento da Bolsa Turismo Lisboa (BTL) para maio é uma medida que o presidente da AHETA aplaude e até deposita alguma esperança, embora com recato.
«Estamos a entrar no campo das suposições. Com o aproximar do período mais quente, pelo que se sabe, o vírus tenderá a desaparecer. É óbvio que a época turística já não será igual ao que poderia ter sido, mas ainda temos boas hipóteses de recuperar uma parte significativa das receitas. O prejuízo em março e abril não será algo que as empresas não possam suportar. O problema é saber se esta situação continuará por mais meses. Essa é a grande incógnita que está a deixar empresários, técnicos, gestores e responsáveis à beira de um ataque de nervos».

As recentes notícias de mais casos de Coronavírus no Algarve não surpreenderam o presidente da AHETA.
«Não. Era uma questão de tempo. O Algarve como maior e mais importante região turística portuguesa está mais exposta ao exterior. O vírus é importando e portanto é natural que quem vem de fora seja agente de contaminação».
«Tudo é subjetivo. A União Europeia dizia, há poucos dias, que a quebra de passageiros nos aeroportos europeus no primeiro trimestre de 2020 é de 67 milhões de passageiros, ou seja 13,5 por cento. A previsão para o próximo ano é de 187 milhões de passageiros a menos. Isto foi há questão de dias e estes números já devem estar obsoletos. Sei que na semana passada havia aviões a voar sem ninguém a bordo, só com a tripulação apenas para não perderem os slots que é a coisa mais preciosa» para as companhias aéreas.
Em relação ao fecho de fronteiras, «Portugal não é uma ilha. Portugal não pode, nem deve deixar de acompanhar o que de melhor se tem vindo a fazer no mundo» para travar o Coronavírus.