Faro, Lagos e Tavira vão ter Guias de Geologia Urbana

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«Um projeto pioneiro, inovador e original» é como Luís Rodrigues, diretor do Centro de Ciência Viva de Lagos (CCVL), define os novos Guias de Geologia e Paleontologia Urbana que, no conjunto, propõem mais de uma centena de descobertas em três cidades algarvias. O primeiro, dedicado a Lagos, vai ser lançado sexta-feira, 29 de janeiro.

Ciência, história e património juntam-se para uma proposta simples – descobrir diferentes tipos de rocha em ambiente urbano, admirando o seu enquadramento e contexto específicos. «A geologia e paleontologia urbana explicam a história das rochas que constroem os nossos equipamentos. A ideia é visitar locais nas cidades, olhando para aquilo que os constrói, os materiais com diferentes origens, percursos e idades. Muitas destas rochas têm vestígios visíveis de seres vivos com milhões de anos», explica Luís Rodrigues, mentor dos novos guias.

A ideia surgiu em 2013, quando coordenava em simultâneo os Centros de Ciência Viva de Faro, Tavira e Lagos. O objetivo era criar um produto (guias) e atividade (visitas), que pudessem de alguma forma unir os três centros algarvios.

«Todas as semanas fazia algo que me dava imenso prazer. Circulava pelas cidades à procura de diferentes rochas. É uma maneira diferente de olhar para as coisas. Isso é também um dos principais objetivos destes guias, ou seja, desafiar as pessoas a modificar um pouco a maneira como olham para as rochas e verem tudo o que normalmente lhes passa despercebido», explica.
Os três primeiros Guias de Geologia e Paleontologia Urbana são dedicados às cidades de Lagos, Faro e Tavira. Os percursos sugerem pontos de interesse variados, desde cafés, muralhas, igrejas, praças, monumentos e conventos, até cemitérios, entre outros.

«Embora existam publicações de caráter científico, este é um projeto pioneiro a nível nacional em termos de livros destinados ao grande público». É uma forma de despertar o interesse e aproximar os residentes, escolas e o turismo da geologia e paleontologia.

Além disso, «provam que o Algarve tem muito mais do que sol e praia para oferecer. Enriquecem ainda mais a oferta turística e cultural no Algarve», sublinha.

Estima-se que muitas das rochas presentes nos vários percursos pelas três cidades algarvias tenham sido importadas de várias partes do mundo. «Algumas resultantes de trocas comerciais. Outras com origem em navios que navegavam sem carga, mas que precisavam de peso para se equilibrarem», aquilo a que em náutica se chama «lastro».

«Quando os navios chegavam ao cais comercial, deitavam fora o lastro para poderem encher os porões com mercadorias. Algumas dessas rochas eram tão boas que, muitas vezes, eram (re)utilizadas em obras, por exemplo, de reconstrução e reparações de igrejas. Em Tavira isto é nítido. Encontramos rochas com características muito especiais, que não existem em Portugal e que são raras de se encontrar» no país.

«A nossa missão nos Centros de Ciência Viva é promover a ciência e tecnologia, mas estas não estão isoladas de tudo o resto. A arte, a história, o património estão também aqui presentes.
Desenvolvemos uma estratégia que permitiu integrar várias áreas do conhecimento».

Participaram ainda na concepção dos Guias Rita Manteigas, historiadora e autora responsável pelos textos de complemento histórico, e Margarida Agostinho, professora de Biologia e Geologia e Ciências naturais, em Lagos.

Alguns dos pontos de interesse

O cemitério da Igreja do Carmo, em Tavira, é um dos pontos de paragem que mais encantou Rodrigues. «Gosto muito desta história. Neste cemitério existe a campa de um soldado. Com o tempo, a erosão fez aparecer amonites. Aos meus olhos, acabam por ser dois seres vivos que lá estão sepultados. Um humano e um outro ser com mais de 100 milhões de anos. Há ali uma partilha entre seres de diferentes espécies e diferentes tempos, e tem, para mim, um simbolismo quase poético», revela.

Outro exemplo é o tampo do balcão de um café. «Entrei apenas para pedir um café. No entanto, comecei a olhar para esta rocha incrível que era o tampo do balcão, com mega cristais e auréolas verdes enormes. Vim a descobrir que é um impressionante granito finlandês. A rocha mais antiga do nosso percurso em Tavira. Os donos não tinham noção. Disseram-me que achavam-no bonito e o tinham aproveitado de um outro café».

Outro dos pontos de interesse que surpreendeu o geólogo foi uma pia batismal de uma igreja, onde encontrou corais fosseis. «É interessante verificar que o local onde se faz este ritual de iniciação e passagem de um não cristão para cristão, é feito com uma rocha de um passado em que os mares eram quentes. A água que permite fazer o ritual de passagem é ao mesmo tempo, uma rocha de águas passadas, que apresenta corais».

Exploração autónoma ou visitas guiadas?

É o leitor quem escolhe. Os exploradores que pretenderem fazer os percursos de forma autónoma têm a informação básica em termos de localização e geologia de cada um dos pontos. É acessível a famílias, estudantes desde o primeiro ciclo, universitários ou até mesmo turistas.
Mas para quem tiver sede de saber mais, pode sempre solicitar uma visita guiada junto dos respetivos Centros de Ciência Viva locais. As visitas fazem parte da oferta educativa e para turistas, e podem realizar-se sempre que reunido um número mínimo de dez participantes.

Apresentação e lançamento dos Guias

O primeiro Guia de Geologia e Paleontologia Urbana a ser disponibilizado será o de Lagos, durante a cerimónia do sétimo aniversário do CCVL, na sexta-feira, 29 de janeiro, pelas 20 horas. Será um evento de entrada livre, com beberete e várias surpresas. Os lançamentos dos guias de Faro e Tavira vão decorrer ainda durante fevereiro, em locais a anunciar. Para já existe uma tiragem inicial de três mil exemplares, com o custo de 10 euros. Na sequência da produção destes três guias está ainda a ser projetada uma exposição itinerante de painéis informativos que vai circular por todo o país, e que servirá de introdução ao público em geral sobre «o que é a geologia e paleontologia urbana».

E depois de Lagos, Faro e Tavira? «Espero que os autarcas do Algarve ou outras entidades considerem as potencialidades destes guias, e os pontos de interesse geológico e paleontológico das suas cidades. Nós temos todo o prazer a aceitar novos desafios e desenvolver um trabalho semelhante noutras áreas geográficas do Algarve». Rodrigues agradece ainda à Agência de Ciência Viva, o principal patrocinador, que «apoiou e acarinhou o projeto desde o primeiro momento».