Algarve vai ter central de processamento de pêra-abacate

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Região tem hoje 1600 hectares de abacateiro, área que poderá ainda vir a aumentar segundo Pedro Valadas Monteiro, diretor regional de Agricultura e Pescas do Algarve. Em entrevista ao barlavento, desdramatiza a diabolização daquela cultura e revela que os empresários do sector se preparam para anunciar, em breve, uma grande infraestrutura dedicada ao processamento da pêra-abacate.

barlavento: Qual é a situação atual do abacate? Que licenciamentos são necessários?
Pedro Valadas Monteiro: A agricultura quando é feita em áreas de Reserva Agrícola Nacional (RAN) não é objeto de licenciamento. Agora, há determinados investimentos que poderão carecer de autorização ou de parecer da entidade regional da RAN. Quando falamos, por exemplo, em inutilizações de solo para a construção de armazéns agrícolas de apoio às plantações, ou estufas quando implicam sapatas de betão, ou até de vedações de propriedade, aí já carecem de licenciamento, mas a atividade agrícola em si, a plantação, não carece. Em determinadas circunstâncias, o Plano Diretor Municipal (PDM) pode fixar um limite de profundidade para as despedregas ou outras alterações de perfil do solo. Há situações em que os pomares, ou qualquer atividade agrícola, podem até ser instalados em zona de reserva ecológica. Em função da tipologia do espaço, pode ser exigido um parecer à Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR). Numa zona de um Parque Natural, dependendo do tipo de intervenção, o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), pode também ter de se pronunciar. E há determinadas espécies cujo arranque não é permitido e carece de parecer autorizador, como o sobreiro e a azinheira, ou de comunicação prévia à Direção Regional de Agricultura e Pescas (DRAP) no caso do olival.

Significa então que não é necessário pedir licenciamento para se fazer as grandes plantações de pêra-abacate que têm surgido nos últimos anos?
Não é bem isso. Se num exato local houver uma norma de um determinado instrumento de gestão territorial, como o PDM, ou de um plano especial de ordenamento de um Parque Natural ou área protegida, aí tem de haver um parecer da entidade competente, seja a CCDR, seja o ICNF, seja uma Câmara Municipal. Então como é que se controla esta «explosão» de pêra-abacate na região? Vamos ver o que se entende por «explosão». O Algarve tem 500 mil hectares de área total. Cerca de 350 mil de serra e o resto de litoral e barrocal. As culturas hortofrutícolas no Algarve, desde tempos imemoriais, sempre foram feitas ou no litoral ou no barrocal que é onde existe água e solos com melhor aptidão para as fruteiras. Com o turismo, a agricultura começou a ser empurrada para o barrocal, que grosso modo, deverá ter 150 mil hectares. A área atual do abacate no Algarve são 1600 hectares. Qualquer exploração de média-grande dimensão no Alentejo tem mais área do que isto. Se considerarmos os 150 mil hectares de barrocal, que área plantada dá? Um por cento? Quem vê hoje alguns comentários, ou intervenções sobre o tema, parece que o Algarve tem milhares e milhares de hectares de abacateiros plantados. Na realidade, estamos a falar de 1600 hectares. Há hoje propriedades de maior dimensão porque a agricultura também é um negócio, uma atividade económica. Maior área permite maiores economias de escala, melhor relação entre custo e receita. Nesse sentido, algumas, poucas, empresas já ultrapassam os 100 hectares de área. Infelizmente, ainda não temos os dados do último Recenseamento Agrícola, porque devido à COVID-19 os trabalhos de campo atrasaram. Quando esses dados vierem a público poderemos constatar estas estimativas, feitas através de amostragem. Em 1600 hectares devemos ter apenas cerca de 60 por cento dos pomares em plena produção.

Existe um planeamento a nível regional, por exemplo, para calcular a capacidade que temos para esta cultura?
O abacateiro no Algarve está desde logo limitado por uma questão que tem a ver com os solos, a disponibilidade de água, porque é uma árvore de regadio, e com a parte climatérica. É uma planta muito sensível à geada que ocorre em zonas que têm fraca drenagem atmosférica, ou de exposição a norte, em que a temperatura à noite chega abaixo do zero. Exposição a norte, o abacate não gosta, nem de vales muito cavados onde o ar circula pouco e tende a acumular-se o frio. O planeamento pode ser feito através dos instrumentos de gestão territorial, como os PDM. O Programa Regional de Ordenamento do Território (PROT) pode prever algumas circunstâncias, mas não há condicionalismos, tirando as situações que reportei no início desta entrevista. A agricultura, em nenhuma zona do país, faz-se com esse planeamento centralizado, que também não pode ser aplicado ao Algarve. Como seria operacionalizado à escala da NUT? Por distrito, concelho, até chegarmos à freguesia? Se assim fosse, poder-se-ia perguntar porque é que dentro de uma freguesia haveria mais área de abacate que noutra ao lado. Essas decisões de investimento não podem ser programadas e condicionadas numa secretária com uma régua e um esquadro. Coisa diferente é falarmos em ordenamento desta e outras culturas em função da aptidão edafo-climática, existência de significativos condicionalismos de natureza ambiental. Nesse prisma, a DRAP Algarve, inclusive, preconiza algum tipo de condicionamento a determinadas práticas tidas como mais impactantes, por exemplo, ao nível das movimentações e mobilizações de solos como despedregas ou ripagens muito profundas em zonas muito sensíveis e de elevado valor ecológico, como sejam as zonas de máxima infiltração mais relevantes para a recarga dos sistemas aquíferos.

Mas esta não é uma espécie considerada exótica?
O abacateiro não aterrou agora aqui de paraquedas. As principais culturas do Algarve, no que às árvores de fruto e à horticultura respeita, chegaram cá importadas de outras partes do globo, sobretudo de paragens onde portugueses estiveram nos Descobrimentos. Vieram as laranjas da China, a alfarrobeira trazida pelos árabes, o tomate da América do Sul. A única que poderá ser mais autóctone, e das mais antigas, mas que oficialmente não é originária do Algarve, é a vinha. E o medronheiro que é flora mediterrânica. Tudo o resto, em determinada altura, também foi exótico como o abacateiro. Mas há registos de quintas que no século XIX já tinham pêra-abacate.

Certo. Ainda assim, o abacate não era uma monocultura como nos dias de hoje…
Esse é um termo que acho desajustado. Os 1600 hectares que temos estão espalhados transversal e também longitudinalmente de uma ponta à outra do Algarve, desde Castro Marim até Aljezur. Pergunto e vou só cingir-me ao barrocal, aos tais 150 mil hectares de área: um por cento é a proporção da cultura do abacate face à área do barrocal. Podemos dizer que há uma monocultura? Acho que as pessoas caíram muito naquela ideia das imagens que viram, por exemplo, da América do Sul e do México, onde algumas multinacionais chegavam, faziam furos com centenas de metros de profundidade, e secavam os poços das comunidades. Essa situação não existe em Portugal, felizmente. A Agência Portuguesa do Ambiente (APA) emite títulos de utilização de recursos hídricos que têm em conta quais as características de cada captação e quais os seus níveis de produtividade. Os aquíferos são monitorizados em termos de qualidade e de quantidade de água disponível. No Algarve, a agricultura capta cerca de 75 por cento dos seus consumos de rega nos aquíferos. Não vai às barragens. Para todos os usos, precisamos à volta de 230 milhões de metros cúbicos por ano. A agricultura consome cerca de 130, o que corresponde, à volta de 56 por cento desse total. A nível nacional, o peso da agricultura no consumo de água, é superior a 70 por cento. Hoje, por via destas questões da seca, estão suspensas as emissões de novas captações ou de aprofundamentos de furos nos principais sistemas de aquíferos do Algarve. Já estamos a sofrer consequências desta seca e do panorama complicado das reservas hídricas a nível regional.

Este cenário deve ser preocupante para quem investiu no abacate?
Muito preocupante porque o abacate é uma espécie sensível, embora esteja muito bem adaptada ao Algarve. Do ponto de vista fitossanitário só identificamos um inimigo que é um ácaro, uma espécie de aranha muito pequena. Nos tratamentos fitossanitários praticamente não leva nada. Também a copa da árvore permite fazer sombreamento e a tela preta que se coloca na linha entre árvores evita que as ervas daninhas se desenvolvam e isso significa menos herbicidas. Mas enquanto, por exemplo, a laranjeira é mais resistente a situações de défice hídrico, o abacate é extremamente vulnerável. Sabendo estas condicionantes porque se aposta no abacate? Porque se continuam a projetar e construir hotéis ou campos de golfe no Algarve? A questão não pode ser vista apenas no plano da agricultura e do empresário agrícola. Se as pessoas o fazem é porque entendem que em termos de custo/benefício há uma relação vantajosa, mesmo pesando o fator risco, e por isso vale a pena fazê-lo. A agricultura é igual. O empresário faz a análise da conjuntura atual, sabe quanto lhe custa instalar um pomar de abacateiros, que implica adquirir o terreno, a plantação das árvores, as movimentações de terra, as instalações de sistemas de rega e armazéns. Sabe que tem uma série de custos de produção e uma determinada rentabilidade. Sabe que o Algarve está com dificuldades a nível do aprovisionamento hídrico que resulta, sobretudo da seca meteorológica e das baixas reservas existentes. Se de um momento para o outro começar a chover proficuamente, os nossos problemas conjunturais resolvem-se. Agora o problema que temos é que não tem chovido. Talvez estejamos já perante um cenário de seca estrutural. O que é certo é que as pessoas, apesar disso tudo, resolvem investir.

Isso é correto?
Temos de tomar em linha de conta que um empresário agrícola é um empresário como qualquer outro de outro sector da economia. Não nos podemos deixar iludir por supostas visões líricas e românticas do passado, sobre como os nossos ancestrais sobreviviam com as espécies de pomar tradicional de sequeiro e que a esses modelos produtivos devíamos voltar. Pergunto assim: quem tem essa visão está disponível para num movimento de crowndfunding, apoiar os empresários que estejam disponíveis para investir em pomar tradicional de sequeiro sendo que este, hoje em dia, face às caraterísticas do mercado, à falta e substancial e encarecimento da mão de obra, à baixa de preços de venda e à concorrência de outros países, não é rentável? Esses sistemas têm dois grandes problemas: os custos de produção inflacionaram e as produtividades são substancialmente baixas, mais ainda do que no passado por via dos efeitos das alterações climáticas, já particularmente sentidas no Algarve. Há décadas atrás, quando Portugal estava fechado em sim mesmo, não tinha fronteiras abertas, não concorria no mercado global, existiam autênticos exércitos de trabalhadores disponíveis para os campos. Aí esses sistemas eram rentáveis. Hoje em dia, não são.

Quão rentável é o abacateiro?
Basta ver as cotações. Vamos supor que cada hectare dá 15 toneladas de abacate. Quando todos os 1600 hectares estiverem a produzir em pleno, a multiplicar por 2,2 euros o quilo, sabendo que os custos de produção são menos significativos que noutras fruteiras, como já mencionei. É só fazer contas…

Mas na prática, as pessoas não gostam de ver cada vez mais e maiores plantações de abacate no Algarve. Qual é o seu comentário?
Vamos imaginar um cenário hipotético. Imaginemos que em vez de abacate, a laranja, principal cultura agrícola do Algarve, superior mesmo à área de alfarrobeira, era agora a novidade. Não aconteceria o mesmo? Evidentemente que não concordo, nem o Algarve tem condições, para termos tudo cheio de abacate. Tem de haver equilíbrio. Mas a região tem espaço para o abacate, assim como tem espaço para a laranja, para a alfarrobeira e figueira, para os pequenos frutos vermelhos, para a vinha, romã, e para outras culturas subtropicais como o dióspiro e até a manga. Essa diversidade é a riqueza do Algarve. Quando temos isto, não podemos falar em monoculturas. A alfarrobeira tem à volta de 13,5 mil hectares de área e os citrinos à volta de 16 mil. O abacate tem 1600 hectares. Se vai crescer? Se calhar vai crescer mais um pouco.

Na semana passada o presidente da Câmara de Aljezur manifestou-se preocupado…
Compreendo as questões do autarca de Aljezur. As pessoas estão muito sensíveis à diabolização criada em torno desta cultura. Entendem que a vinda do abacate pode ser uma ameaça, principalmente quando falamos em grandes manchas contínuas. Há instrumentos que podem ser utilizados pela administração pública para travar crescimentos desmesurados, e nalguns casos temos plantações que estão barradas à conta disso, através da obrigação de sujeição aos estudos de Avaliação de Impacte Ambiental (AIA). Quando se ultrapassa uma determinada área contínua por projeto está previsto na lei que é obrigatório um AIA. Mas o que mais releva é que a área média das explorações de abacateiros no Algarve se situa em torno dos 12 hectares Vamos diabolizar a cultura porque agora chegaram cinco hectares ou 10 ou mesmo 15 ou 20 a um determinado concelho? Se as coisas forem feitas com regras, se não forem cometidos atentados ambientais, se o empresário cumpre o que está na lei, se tem um título de utilização de recursos hídricos e garante ter água, porque não pode investir naquela cultura? Porque não? Por uma questão quase de fé dogmática?

Pergunto, em termos de valor acrescentado, que deixa o abacate no Algarve?
A política seguida por Portugal nas últimas décadas, e de todos os Estados que são competitivos, é fomentar a exportação. Por ser agricultura, os empresários não podem fazer investimentos que se direcionam, sobretudo, para a exportação? Na citricultura, frutos vermelhos e vinha, temos estado a fomentar e a aplaudir empresários que se internacionalizam, que conseguem ser mais competitivos vendendo lá para fora. E agora, porque é abacate, vamos dizer que somos contra as exportações? Que somos contra o investidor que quer instalar para exportar porque o mercado estrangeiro remunera melhor do que o mercado interno? Outra coisa diferente tem a ver com a questão do valor acrescentado que fica na região em processos que antecedem a chegada ao consumidor final. Por exemplo, as centrais de processamento de fruta. Aí sim, o produto sai da árvore e vai para unidades fora do Algarve. Esse passo intermédio, que é a preparação da fruta para depois ser escoada para os países do norte e centro da Europa, não é feito cá. Falta cá, mas vai haver.

Quando?
A breve trecho. Já há um conjunto de empresários, que não posso revelar quem são, que têm intenção de o fazer. São produtores que vão criar aqui uma unidade de grande dimensão para o processamento e o embalamento do abacate. Permitindo depois que possamos do Algarve escoar diretamente para esses mercados externos ou para o consumo interno. Esta é uma cultura subtropical, significa que tem determinados requisitos no ponto de vista da amplitude térmica. Aqui na Europa só se encontra, em larga escala na zona de Múrcia, na Sicília e no Algarve. Logo aí há uma vantagem para a exportação. É diferente para um consumidor holandês, ou alemão, ou até mesmo português comer um abacate produzido em Portugal, ou comer um abacate da América do Sul que tem de ser colhido bastante antes do ideal para aguentar o transporte de barco. A qualidade é substancialmente diferente. Também, quando estamos a produzir mais perto do consumidor, estamos a reduzir a pegada do carbono.

E que dizer em relação aos grandes consumos de água do abacate?
É outra questão que convém desmistificar. Cada caso é um caso. Há bons empresários, que aplicam boas técnicas e há outros que têm de ser educados para isso. Todos os pomares de abacateiro do Algarve têm sistemas de rega gota-a-gota instalados. Para qualquer produção agrícola, a mão de obra, a energia e a água na rega são sempre custos muito importantes, assim como a aplicação, por exemplo, de herbicidas e fertilizantes. Tudo aquilo que o agricultor não tiver de aplicar é dinheiro que poupa. A maior parte dos pomares tem sistemas de monitorização da água no solo. A rega é ligada ou desligada em função da evolução da humidade no perfil explorado pelas raízes. E muitas vezes, além disso, até têm estações agrometeorológicas porque a planta é como nós, quando está calor bebe mais água e quando chove não precisa de rega. Os sistemas fazem cálculos de evapotranspiração no próprio local. Quando não existe estação, nós fornecemos os dados aos agricultores. As dotações de rega para abacateiro no Algarve devem andar entre os 6600 metros cúbicos por hectare, porque há zonas que precisam de menos rega e porque esta varia em função da quantidade de precipitação desse ano, até aos 7400 metros cúbicos por hectare. Olhando para a questão dos consumos, claro que não podemos dizer que todos estes 1600 hectares estão a consumir essa quantidade de água, que está tecnicamente estudada como sendo a adequada para o abacateiro nas condições do Algarve. E mais. Só 60 por cento dos pomares no Algarve é que estarão a consumir água para ter o máximo de produtividade por já estarem no estado adulto. Os outros 40 por cento, por serem mais jovens, só exigem, neste momento, metade ou dois terços de água porque, em função da idade do pomar, assim vamos aplicando mais ou menos rega.

DRAPAlg satisfeita com o Plano Regional de Eficiência Hídrica do Algarve

O barlavento sabe que muito em breve será apresentado o Plano Regional de Eficiência Hídrica do Algarve, que nasce do despacho nº 443/2020, publicado em Diário da República, a 14 de janeiro, pelos Ministérios do Ambiente, Agricultura e Secretaria de Estado do Turismo.

«Estou satisfeito com o resultado. Contém um documento caracterizador de diagnóstico e um conjunto de medidas e recomendações propostas, de curto, médio e longo prazo para os sectores doméstico, turismo e agricultura», resume Pedro Valadas Monteiro.

Sem querer levantar demasiado o véu, o diretor considera que «todas as medidas que entendemos que seriam importantes estão lá, quer do ponto de vista da racionalização dos consumos, da sensibilização para a economia da água, de combate às perdas e melhoria dos sistemas», avança. Do ponto de vista pessoal, Monteiro é a favor do reforço estrutural do aprovisionamento de água na região.

«Não acredito que as medidas avancem todas ao mesmo tempo. Terá de ser feita uma análise da rapidez de execução, impactes ambientais e custo/benefício. E estudos prévios, sobretudo ao nível das grandes obras. A curto prazo, acredito que podemos ter melhorias dos sistemas de rega dentro das parcelas, intervenções nos aproveitamentos hidroagrícolas, melhoria da eficiência e no combate a perdas. Por exemplo, ainda temos um aproveitamento hidroagrícola muito antigo que é o do Alvor, que rega a partir da barragem da Bravura. Ainda é por gravidade, com canais a céu aberto, a precisar de uma intervenção forte».

Em relação à falta de água na região, o diretor acredita que a solução que «poderá ter mais resultados é a bombagem de água a partir da zona do Pomarão, no Guadiana, para adução à barragem de Odeleite, assim como as questões relacionadas com o alteamento da cota de pleno armazenamento da barragem de Odelouca, que já está construída. Poderá ser uma medida relativamente fácil. Enquanto que no caso da bombagem do Guadiana, a água está a correr, até por via da regularização que é feita pelo Alqueva, Odeleite precisa que chova», compara.

«No Algarve vai chover, mas tendo em conta o tipo de precipitação que cada vez mais é expectável na região, que são regimes torrenciais [chuva muito concentrada em períodos muito curtos de tempo], penso que poderia ser útil dois tipos de intervenções já faladas pelo ministro do Ambiente, que é a construção de dois açudes: um na barragem da Ribeira de Monchique, porque não está afetada pela bacia da barragem de Odelouca e outro na Ribeira da Foupana. Estamos a falar de açudes galgáveis, açudes que são obras hidráulicas com muito menos impacte e custo do que, por exemplo, a construção de uma nova barragem».

Barragens do Algarve sem melhorias há 20 meses

Centro de Experimentação Agrícola de Tavira salva Pêro de Monchique

O mediatismo recente que colocou o Centro de Experimentação Agrícola (CEA) de Tavira na ribalta, trouxe várias notícias positivas além da queda do projeto da estrada que cortaria aquele terreno ao meio.

«Polémicas nunca valem a pena. Criam muito ruído e são pouco produtivas. O que valeu a pena foi a atenção mediática, a preocupação e a sensibilização. Muitos, desde organizações públicas, privadas até aos cidadãos anónimos passaram a saber o que é que de importante é feito no CEA de Tavira em termos de coleções de material vegetal. A perda de biodiversidade não é só problemática em zonas longínquas como a Amazónia, também é em Portugal. Muitas vezes só olhamos para o natural, o selvagem, e esquecemo-nos dos recursos domésticos, da agricultura e da pecuária que também têm grandes problemas de perda de biodiversidade. Por isso é que é tão importante aquele Centro, onde a história do Algarve está preservada. Algumas daquelas espécies e variedades não têm aptidão comercial hoje em dia. Se ninguém as preservasse, extinguiam-se», diz Pedro Valadas Monteiro. É o caso do Pêro de Monchique.

«A maior parte perdeu-se nos incêndios. Se não estivessem lá preservadas, essas variedades tinham-se perdido. Agora temos um protocolo que vai ser assinado, a breve trecho, com a Câmara Municipal de Monchique» para o recuperar e reinstalar no seu solar que é Monchique.

Avançam planos para Museu da Patrimonalização da Alfarroba e hortas urbanas

Ainda em relação ao Centro de Experimentação Agrícola (CEA) de Tavira, Pedro Valadas Monteiro revela que «se estão agora a ultimar esforços com um conjunto de entidades no sentido de desenvolver várias iniciativas que consideramos importantes. Por um lado, a manutenção do banco de germoplasma vegetal. Temos problemas de falta de recursos humanos, as instalações estão degradadas, mas estamos agora a tentar, em parceria, implementar um projeto que nos permita fazer a reabilitação» de todo o espaço.

Uma ideia (antiga) na calha é a concretização do Museu Agrário do Algarve, que nunca avançou.

«O antigo Posto Agrário do Sotavento Algarvio e todo o complexo da estação agrária vêm do primeiro quarto do século passado. Temos espólio guardado que vem dessa altura. E quando a fábrica da Industrial Farense foi recentemente deslocalizada, toda a maquinaria antiga de processar a alfarroba não passou para as novas instalações do Areal Gordo. A Direção Regional da Cultura do Algarve ficou guardiã desse espólio. Eu já propus à diretora regional [Adriana Nogueira Pinto] acolher parte desses equipamentos, até porque aquela entidade tem a intenção de criar um Museu da Patrimonalização da Alfarroba», avança.

«Além disso, gostaríamos de ter ali uma das novas Quinta de Ciência Viva. Temos interesse em fazer a candidatura, em conjunto com a Câmara Municipal de Tavira e também para a instalação do Centro de Competências da Dieta Mediterrânica. Temos e contamos com o apoio do Ministério da Agricultura, da CCDR Algarve, da Universidade do Algarve, da Câmara Municipal de Tavira, da Ciência Viva, e de muitos cidadãos» que querem dar a mão ao CEA.

Por outro lado, «no Patacão vamos celebrar um protocolo com a Câmara Municipal de Faro para a criação de uma horta social num terreno que temos em frente a uma outra parcela já disponibilizada para o Banco Alimentar. Esperamos a marcação da data para o ato público da assinatura. E talvez possamos no CEA de Tavira vir a instalar uma horta urbana» conclui.

Ações contra os roubos de alfarroba e laranja contrafeita

A Direção Regional de Agricultura e Pescas do Algarve e a Guarda Nacional Republicana (GNR) assinaram, em fevereiro, um protocolo de cooperação para melhorar a eficácia das ações de fiscalização aos prédios situados em solos da Reserva Agrícola Nacional (RAN). O resultado é positivo pois «permitiu-nos melhorar a eficácia e acelerar os procedimentos de resposta às denúncias de construções ilegais que cada vez são mais», reconhece Pedro Valadas Monteiro. No entanto, no que toca ao flagelo do roubo de alfarroba, que todos os anos por esta altura lesa dezenas de proprietários, a solução é mais complexa.

«Há um grupo de trabalho que está nomeado há alguns anos, que começou com a laranja furtada, estendeu-se à alfarroba e agora já cobre o abacate. A alfarroba tem um preço muito apetecível este ano, a 12 euros a arroba. E ao contrário do abacate e da laranja, estamos a falar de pequenas propriedades, em sítios isolados e com um tipo de produtor idoso. O que acontece é que há um programa da GNR, o Campo Seguro, de policiamento de proximidade, que está a ter bons resultados. Entendemos, no âmbito do grupo de trabalho que reuniu há um mês, convidar a Autoridade Tributária porque é importante atuar sobre quem compra. Além de se atuar no local do furto, é fundamental atuar sobre quem anda a comprar e não devia», considera o diretor.

«Chamámos também por isso, este ano, a AMAL, devido à venda ambulante na EN125, porque estamos preocupados sobre a origem e condições do que lá é vendido. Para além de despistar se a origem dessa produção é ou não legítima, a laranja recebe tratamentos fitossanitários e só pode ter aplicação de produtos que estão legalizados em Portugal. Além disso, têm de se cumprir os intervalos de segurança para ser consumida. Estamos preocupados com isso. Enviámos também à tutela um trabalho conjunto, no caso da alfarroba, para diversas regras que facilitem a fiscalização, quer em pomar ou quando a mercadoria está a ser transportada, e junto dos compradores. Foi trabalhado entre nós e a AGRUPA – Agrupamento de Produtores de Alfarroba e Amêndoa e tem vários procedimentos, desde a definição dos períodos para a apanha, para a entrega e regras sobre a idoneidade e certificação de origem».