O «barlavento» acompanhou a atividade dos soldados da paz de Portimão, no seu dia a dia. Fizemos dois turnos de 12 horas, um diurno e outro noturno, em diferentes ocasiões, embora haja operacionais que chegam a estar de serviço 24 horas de seguidas. Encontrámos um dispositivo impressionante e bem oleado, que a maioria do público desconhece.
Ainda não eram oito da manhã quando chegámos ao quartel dos Bombeiros de Portimão. Fomos cedo, para assistir à parada. Apresentámo-nos a Fábio Torrado, o oficial de permanência às operações.

Ficámos a saber que há sempre um oficial-bombeiro a coordenar os serviços.
Faz 24 horas de serviço, seguidas por dois dias de folga. No primeiro desses dias, contudo, fica de prevenção, o que significa que terá de substituir o seu colega de serviço, se necessário por razões operacionais.
Apresentaram-se 30 operacionais, que foram escalados de acordo com as suas competências e as necessidades de serviço.
Nos últimos cinco anos, o efetivo desta corporação passou de 70 para 132 bombeiros, dos quais 82 são voluntários, entre oficiais-bombeiros, bombeiros e especialistas.

Num dia normal, além da Central de operações e comando, é destacada uma equipa para acorrer a incêndios urbanos, acidentes e desencarceramentos; além de uma equipa avançada para fogos florestais, que foi posicionar-se no destacamento da Senhora do Verde; uma equipa de prevenção para fogos florestais; uma equipa para atuar fora do concelho em fogos rurais, se necessário; e por fim, uma equipa para o destacamento no Aeródromo Municipal de Portimão, reforçada duas vezes ao dia, durante as escalas do avião de carreira intercidades. Está também a postos uma equipa do INEM.

Os chefes de cada equipa designam as posições que cada elemento irá ocupar, o que lhes permite saber exatamente o que fazer, seja qual for a situação com que se deparem. De seguida, todo o material é conferido e testado, para não haver surpresas.
O equipamento pessoal fica pendurado no parque de viaturas, mesmo à mão, em caso de saída rápida. O objetivo são três minutos, mas a média está em 1 minuto e 33 segundos.

Se não houver serviço, os bombeiros treinam diversas situações.
Durante a nossa reportagem, usaram extintores desativados para treinar o corte de aço, uma competência que pode salvar vidas, nas operações de desencarceramento e corte de estruturas colapsadas.
A primeira equipa a sair foi a de combate ao fogo florestal destacada para a Senhora do Verde, cinco elementos e uma viatura. São a guarda avançada que reduz em 10 minutos o tempo de chegada a um incêndio.
Seguiu-se outra equipa com cinco operacionais num autotanque com água e espuma, complementada por uma ambulância com um elemento, destinados ao destacamento no Aeródromo, onde existem também 19 macas e o mesmo número de planos rígidos. Duas vezes ao dia, para prevenção à aterragem e descolagem do avião da carreira, juntam-se-lhes dois operacionais.

Entretanto, antes das nove horas, já tinha saído a ambulância para a primeira emergência médica e que continuou a operar, ao longo do dia.
Entretanto chega um alerta: uma árvore em perigo de queda, na falésia da Praia do Barranco das Canas.
O oficial de permanência, que também é formador e chefe da equipa de salvamento por cordas, deslocou-se ao local, analisou a situação e decidiu que teriam de usar cordas para remover a árvore, embora o perigo não fosse iminente.

Às 11h45, soa o alarme: um despiste na A22 com quatro feridos. A mota de emergência, mais rápida no trânsito e com todo o material necessário para uma primeira intervenção, estava fora do quartel em pouco mais de um minuto, seguida pela ambulância de serviço às emergências médicas.
Em seguida arrancou a equipa de fogos urbanos, acidentes e desencarceramentos e, porque foi dito que já estava a caminho uma ambulância INEM, só saíram mais duas ambulâncias de reserva.
O último a partir foi o carro de comando, tendo ficado suspensa a preparação para a remoção da árvore.
Felizmente, o acidente apenas causou feridos sem gravidade, mas o despiste mobilizou 13 operacionais e seis viaturas dos bombeiros, além de três outras viaturas e cinco operacionais de outras entidades.

Às 12h15, já estavam os acidentados a caminho do hospital e os bombeiros de regresso ao quartel de Portimão.
Eram 13h25, estava o almoço a meio, e levantámo-nos da mesa para ir à Avenida V6, onde se dera um choque em cadeia entre quatro carros ligeiros.
Desta vez, deslocaram-se três viaturas e oito operacionais, mas acabaram por deixar a ocorrência nas mãos da PSP e regressar para acabar o almoço já frio…
Ainda assistimos, a seguir ao almoço, à remoção da árvore, operação realizada numa hora por três operacionais especializados, o oficial-bombeiro Fábio Torrado, o bombeiro de 2ª Silvano Melo e o bombeiro de 3ª Pedro Cordeiro, pendurados em cordas sobre a falésia.

Na opinião do trio, foi considerado um «exercício fácil», comparado com alguns resgates de pessoas que já efetuaram.
Ainda visitámos, na companhia do segundo-comandante José Sousa, o destacamento da Senhora do Verde, acantonado numa escola abandonada e recuperada.
Aproveitámos para falar com alguns vizinhos, de nacionalidade inglesa, que se mostraram muito satisfeitos e seguros com a presença dos soldados da paz.
Aliás, segundo José Sousa, «este dispositivo permite-nos ainda um contacto permanente com a população local, o que nos permite conhecer as fraquezas existentes, se acontecer um incêndio, sobretudo em termos de mobilidade, tornando mais eficaz o conceito de Aldeia Segura».

E assim se passaram as 12 horas, com alguns períodos de espera pelo meio, que custam a passar e em que se aguarda, a todo o momento, a chamada.
Os bombeiros que não têm tarefas a cumprir permanecem no parque de viaturas com os ouvidos sintonizados à espera do toque do telefone.
Como nota final neste turno, o calor que estava e o equipamento de proteção usado nas ocorrências obrigaram os bombeiros a vários duches e mudança de roupa, entre missões.

Turno da noite
Regressámos na semana seguinte para o turno da noite, que foi calmo, na opinião dos bombeiros. Mal terminou a parada, contudo, saímos na viatura de emergência médica para socorrer uma pessoa com fortes dores abdominais, na Praia da Rocha.
Os socorristas, o bombeiro de 1ª Bruno Afonso e o bombeiro de 2ª André Águas, fizeram o diagnóstico e, ao ser-lhes dito pelo paciente que sofria dos rins e já tivera crises, no passado, decidiram transportá-lo ao hospital, tentando acalmá-lo e estabilizá-lo pelo caminho.
«Não é fácil fazer um diagnóstico completo num tão curto espaço de tempo e com os meios à nossa disposição. Por isso, tentamos saber a história clínica do paciente, o que ajuda.
Neste caso, os antecedentes aliados aos sintomas apontam para problema renal», disse Bruno Afonso, ziguezagueando no meio de duas filas de trânsito compacto, na avenida V6.

Às 21h25, deu-se a primeira de duas saídas para fogos rurais na zona de Carvoeiro, no concelho de Lagoa.
Felizmente, não chegaram a entrar em ação, porque os focos de incêndio foram debelados no início, mas o lema é «mais vale prevenir do que remediar».
Entretanto, continuou o treino de corte de aço, com os extintores desativados, até que, às 22h15, houve uma saída para abertura de uma porta.
Três turistas francesas trancaram a porta da varanda, num quinto andar, e não podiam regressar ao apartamento.
Foi uma ocorrência de fácil resolução, mas suficiente para mobilizar três viaturas e oito homens, tendo ficado em espera a autoescada, para o caso de ser necessário o resgate pelo exterior.
Tudo acalmou e, por volta da meia-noite, alguém alvitrou a possibilidade de descansar um pouco, enquanto era possível. Aceitámos a sugestão, numa das camas da camarata da emergência médica, com a equipa que acompanhámos ao longo da noite, o André e o Bruno.
Às 00h45, toca a acordar para segui-los porta fora.
Um jovem cidadão holandês residente queixava-se de fortes dores torácicas.
O seu estado preocupou os socorristas e foi solicitada a equipa médica de emergência.

Entretanto, havia que acalmar também a esposa, em pânico, porque «um tio dele falecera de um problema cardíaco súbito». O paciente foi transportado para o hospital, onde chegou à 01h18.
Estava a equipa a sair do hospital, nova ocorrência. Idoso com problemas intestinais, na zona antiga da cidade, no quarto andar de um edifício sem elevador.
A equipa chegou às 02h04, diagnosticou um princípio de indigestão, não pareceu grave, mas decidiu transportá-lo para o hospital, por precaução, onde chegou às 2h21.
Novamente uma chamada para acorrer a uma senhora de 90 anos, com problemas respiratórios.
Foi-lhe administrado oxigénio, recuperou e entrou no hospital às 3h20.

Regressámos ao quartel por volta das 4h00 da manhã, onde a equipa conseguiu dormir até ao toque da alvorada, às 7h00.
Houve transportes de doentes para o hospital durante esse período, mas não entraram na categoria de emergência médica. Felizmente, como diziam os homens de serviço, foi uma noite muito calma.
Bombeiro, profissão de risco
Durante oito ou nove meses, em cada ano, ninguém se lembra deles, exceto os que necessitam… e alguns desses ainda reclamam, porque os operacionais não estavam ao virar da esquina, quando telefonaram para o 112. No verão, são heróis para aqueles cujos pertences e vidas salvaram e apelidados de incompetentes pelos que perderam os seus bens. Quando uma autarquia lança uma derrama para suportar as despesas de uma corporação de bombeiros, levanta-se um coro de vozes descontentes a perguntar para que necessitam «eles» de tanto dinheiro. No entanto, repare-se nas horas a que as ocorrências acontecem, que provam um tempo médio de meia hora entre o telefonema e a hospitalização, com todo o trabalho de diagnóstico e estabilização efetuados nessa janela.