Pela primeira vez, a competição nacional de fotografia organizada este ano pelo município de Gibraleón, em Huelva, foi aberta aos fotógrafos portugueses. O tavirense João Ribeiro concorreu e arrecadou o primeiro prémio.
Uma fotografia híbrida, em suporte analógico e digital, a preto e branco, que mostra um olival envolto em nevoeiro, valeu ao autor, o algarvio João Ribeiro, a vitória na competição nacional de fotografia organizada este ano pelo município de Gibraleón, em Huelva, Espanha. Em entrevista ao barlavento, vê a atribuição do prémio, cujo concurso foi aberto pela primeira vez aos fotógrafos portugueses, com bastante naturalidade, até porque tem boas relações com o país vizinho.
«Tenho uma boa ligação com a Andaluzia e, em particular, com Gibraleón, através de um amigo e fotógrafo espanhol, José Ramirez, ou Pepe, como gosta de ser chamado. O Pepe apareceu na Associação e Núcleo Amigos Fotógrafos Algarve (A|NAFA), em 2014, e tornou-se a ponte do Guadiana, como eu já lhe chamei. Começámos a ter alguns projetos em comum, sendo o mais visível a construção da exposição de fotografia pinhole Tavira por um Agujero, que deu origem ao livro homónimo que temos em coautoria. Isso levou a que fizéssemos muito mais coisas na Andaluzia. Já fiz vários trabalhos sobre as minas a céu aberto, exposições, palestras em universidades e workshops. Vou lá com frequência e, numa manhã de nevoeiro, quando viajava de carro com o Pepe, numa zona de oliveiras, de repente, vi aquele cenário e captei-o. Fotografei com uma câmara analógica com mais de 50 anos. Processei a foto em câmara escura, mas não me apercebi de que o trabalho tinha ficado com aquilo a que chamo patina, que são as impressões digitais resultantes do manuseamento que fazemos do papel, quando nos entusiasmamos e temos menos cuidado. Quando o papel secou, apercebi-me de que tinha algumas características, mas ignorei, porque acho que são elas que dão o devido valor à fotografia analógica», recorda.
João Ribeiro admite que o tema das oliveiras e o título «Oliodiel» da fotografia premiada talvez tenham ajudado à decisão do júri.
«Toda a atividade do concelho tem por base a produção de azeite. Existem imensos olivais e um grande lagar industrial, a Oleodiel, nome que conjuga o azeite com o Rio Odiel. Eu sabia que tinha uma imagem que caracterizava muito bem essa realidade e decidi concorrer, mas sem qualquer expectativa, porque sei que Gibraleón, em termos de fotografia, tem muito potencial e muitos bons fotógrafos, alguns deles meus amigos. Concorri porque sei que estes concursos acabam por dar origem a exposições conjuntas e é mais um motivo para nos reunirmos e confraternizarmos. De repente, fui notificado de que tinha sido o vencedor do prémio nacional. Fiquei bastante contente e lisonjeado», sublinha.
O concurso teve dois certames. Um nacional e outro regional, com o título «Visões sobre Gibraleón».
No nacional, não havia limitações aos temas das fotografias. «Mas decidi concorrer com uma imagem sobre a região que organizava o certame», diz o premiado que apresentou um trabalho que, à primeira vista, dá impressão de ser quase uma pintura.
«Os jurados percebem de fotografia e também de arte contemporânea. E o trabalho que temos vindo a fazer, ao longo dos últimos três anos, com a Fundación Olontia, criou algum entusiasmo para que começássemos a olhar a fotografia como criação artística e não estarmos tão preocupados com aqueles perfeccionismos a que a fotografia digital nos transporta. Por isso, as técnicas que tenho vindo a desenvolver ultimamente, misturam o analógico com o digital. Foi o que aconteceu com a foto vencedora e penso que os jurados analisaram e premiaram o sentimento que a mesma imanava e que se vem tornando mais importante na fotografia contemporânea».
Em relação à fotografia analógica, «se estivermos a trabalhar para uma imagem fine art, ou para um cliente, depois da imagem seca, faz-se a limpeza a pincel ou até no Photoshop. Mas, quando estamos a fazer algo para nós, não temos tanto esse cuidado e, às vezes, acabam por sair coisas com características que até ficam engraçadas. Foi exatamente o que aconteceu» com a imagem premiada.
«Eu uso um scanner próprio para fazer essa digitalização e, quando a fiz, reparei que a imagem que me aparecia no computador tinha todas aquelas características ampliadas. Ao criar um pouco de contraste na edição, porque o papel que utilizo é pouco contrastado, ampliou ainda mais, mas achei que estava bem e guardei a imagem até ao dia em que acabei por concorrer» e ganhar.
Colaborador da Fundación Olontia
João Ribeiro, embora algarvio, já foi aceite em Gibraleón como andaluz, e tem vindo a fortalecer uma relação cultural muito forte entre essa cidade e Tavira. «Em 2019, um amigo e fotógrafo espanhol, José Ramirez, ou Pepe, como gosta de ser chamado, apresentou-me a Fundación Olontia, que tinha a intenção de organizar uma Feira Transfronteiriça de Arte Contemporânea. A A|Nafa foi convidada para ser o parceiro português do evento, a ser realizado pela primeira vez em janeiro de 2020, em Gibraleón. Foi um sucesso e surgiu o convite para eu ser o responsável pela filial portuguesa da Fundação. A segunda feira foi em Tavira, em janeiro de 2021, mas a pandemia obrigou-nos a mudar, no espaço de uma semana, tudo o que tínhamos planeado para fazer presencialmente para um evento online. Também foi um sucesso e a parceria tem-se mantido, estando já a trabalhar para a terceira edição da feira, a realizar em Gibraleón, em janeiro de 2022».
Paixão pela fotografia e pelo ensino
Amante da fotografia desde a mais tenra idade, João Ribeiro trabalhou nas férias para comprar a primeira câmara, quando tinha 17 anos, e a fotografia faz parte da sua vida desde então, já lá vão 23 anos. É sócio fundador e presidente da Associação e Núcleo Amigos Fotógrafos Algarve (A|NAFA), sediada em Tavira, coletivo que muito tem feito pelo desenvolvimento da modalidade no Algarve. É professor de fotografia na Escola Profissional Gil Eanes, em Portimão, para onde trouxe a sua paixão. Por fim, assume-se como um estudioso que, embora usando o digital, regressou ao analógico e experimenta novos métodos, os quais utiliza e partilha com os seus alunos, até porque o ensino é outra das suas paixões.