Museu de Lagos põe a descoberto as muralhas medievais da cidade

  • Print Icon

Trabalhos no futuro núcleo de Arqueologia do Museu Municipal de Lagos estão a trazer à luz do dia as primeiras estruturas que protegiam a cidade dos ataques de piratas.

As picaretas vão libertando o reboco contemporâneo e revelando as primeiras estruturas a proteger a cidade de Lagos dos ataques de piratas do norte de África.

Estiveram engolidas por cinco séculos de evolução urbana, ao ponto de ninguém se aperceber que ali, à direita de quem sobe a rua General Alberto da Silveira, bem de frente para a Igreja de Santo António, dentro das paredes da antiga esquadra da Polícia de Segurança Pública (PSP), resistiram quase esquecidas a torre e a muralha medievais que delimitavam a cidade de Lagos no século XV.

O regresso destas fortificações à luz do dia vem acontecendo desde fevereiro, para lá dos tapumes que escondem as obras de construção do futuro núcleo de arqueologia do Museu Municipal de Lagos – Dr. José Formosinho.

A empreitada, cuja execução há-de durar até ao final de 2023, abre portas a uma inédita viagem pelos vestígios da ocupação humana desde a Pré-História ao ano da morte do Infante (1460), mas permite também, segundo Elena Morán, coordenadora geral do Museu de Lagos, «recuperar a memória de que era aqui a famosa Porta da Vila que se abria no lanço norte da muralha, o lugar onde Zurara, cronista do Infante Dom Henrique, descreveu o primeiro grande leilão de escravos a que o próprio Infante terá assistido».

A remodelação do Museu, reaberto em outubro, já tinha destapado parte da antiga muralha e a base da segunda torre que ladeava a Porta da Vila. Mas, nota Elena Morán, «é menos perceptível», até porque a torre da igreja foi erguida sobre a estrutura medieval. Na futura entrada do novo núcleo de arqueologia, estando visíveis duas faces da torre, será muito mais claro, para qualquer pessoa perceber que está perante essas estruturas».

Além da antiga porta da muralha que assistiu às virtudes e desvirtudes dos Descobrimentos, as obras permitiram destapar o fosso defensivo e recuperar as duas salas abobadadas, onde durante quatro séculos funcionou a cadeia. Uma dessas salas, aliás, foi construída dentro da torre medieval.

«São todos elementos que estamos a resgatar para podermos contar as suas histórias», descreve a coordenadora. Grande parte do esforço dos arqueólogos está, por esta altura, concentrado no logradouro, onde será erguida a futura sala de exposições. Exploram as fundações do antigo casario, soterrado desde o terramoto de 1755, em busca de vestígios da vivência anterior ao século XVI. Até ver, «há de tudo e acreditamos que possa haver surpresas».

Quando abrir, o núcleo terá um tesouro nacional para exibir, o imperador Galieno, resgatado da Villa de Milreu, em Estoi, e doado ao museu comunitário quando foi constituído em 1930.

Está preservado e pronto a ser exposto já com o estatuto reconhecido. Há ainda muito espólio em caixas em armazéns municipais a guardar as peças de escavações mais recentes e que também vão integrar a exposição permanente. «Temos de abrir esses contentores, tirar as peças, selecioná-las, recuperá-las e trata-las. É um trabalho que já deveria estar a decorrer, mas que só podemos começar quando tivermos uma equipa para o efeito», admite a responsável, referindo que há achados que recuam ao sexto milénio a.C.

A criação do núcleo de arqueologia vai custar 4,5 milhões de euros aos cofres da autarquia de Lagos e, muito embora o CRESC Algarve 2020 tenha já alocados 1,2 milhões de euros, sublinha Elena Morán,«vai ser necessário um bom reforço dessa verba». Estão já, por isso, «a trabalhar em novas candidaturas» a fundos comunitários.

A direção do museu já planeia chegar ao Armazém do Espingardeiro, fechado desde 2018, para lhe atribuir a função de contar a história mais contemporânea da vida em Lagos. Quer também aproveitar o potencial do Forte da Ponta da Bandeira, que «hoje não passa de um miradouro e, no entanto, podia explicar a história das fortificações costeiras e da economia ligada ao mar».

Há ainda a ideia de se construir um Centro de interpretação do Balneário Romano, da Luz, que já tem projeto de arquitetura que deverá custar cerca de 850 mil euros. O investimento será complementado pela criação de uma rota multimédia sobre o período Romano que está também a ser delineada.

Por avaliar está ainda o investimento necessário à construção de um Núcleo Museológico do Mundo Rural em Odiáxere, uma ideia que ganhou pernas após a doação de acervo particular por parte de um cidadão.