Faro e Mértola vão acolher o décimo Encontro Internacional de Escultura Romana, de 27 a 29 de outubro de 2022.
É, segundo Marco Lopes, diretor do Museu Municipal de Faro, «um importante evento académico, de reflexão e de estudo» sobre este tema.
A organização envolve a Universidade do Algarve, a Direção Regional de Cultura do Algarve, os municípios de Faro e Mértola, e ainda o Museu Nacional de Arte Romana de Mérida.
«Será a segunda vez que se organiza este evento em Portugal. Vamos ter os maiores especialistas do país, de Espanha e Itália», refere.
No final de janeiro deverá estar pronto o programa preliminar, embora o definitivo com oradores saia em abril.
Faro tem agora argumentos de peso para fazer parte da organização deste evento.
Depois do mosaico romano do Deus Oceano ter recebido a classificação de interesse nacional, em maio de 2018, o Museu Municipal de Faro viu agora reconhecimento semelhante aos bustos de Agrippina Minor e Adriano. Uma decisão saída do Conselho de Ministros de quinta-feira, dia 9 de dezembro.
«É uma notícia de grande entusiasmo e alegria, mas de enorme responsabilidade, neste trabalho contínuo e sério de valorização do património museológico que é feito a todo o acervo à nossa guarda, por toda a equipa», afirma Marco Lopes, diretor do Museu Municipal de Faro.
«Os bustos são peças extraordinárias pela sua beleza estética e visual, representativa do bom gosto dos seus encomendadores, do fino trabalho das oficinas italianas e também do cosmopolitismo deste território, riquíssimo do ponto de vista cultural e arqueológico, com achados de primeira linha, como estes. Fazia sentido, por isso, apresentar uma proposta de classificação, pelo reconhecimento internacional que estas peças têm merecido, em exposições e catálogos, e também pelo estudo e ampla bibliografia que tem suscitado a vários especialistas», acrescenta o responsável ouvido pelo barlavento.
A preparação da candidatura «começou há cerca de um ano e meio e envolveu a participação especial de Luís Jorge Gonçalves, um dos grandes especialistas em escultura romana em Portugal. Percebemos que são raras no contexto arqueológico rural, e dentro daquilo que era a antiga Hispânia», segundo o estudo que o investigador fez para integrar o catálogo da exposição do mosaico do Deus Oceano, apresentado no final de setembro de 2019, a propósito das Jornadas Europeias do Património.
O processo «não foi difícil devido a esse apoio científico, que estava muito bem fundamentado para responder a tudo o que a Direção-Geral do Património Cultural (DGPC) exige» em termos de requisitos para esta classificação.
O busto de Agripina, mãe de Nero e mulher de Cláudio, datado do século I d.C., terá sido importado de Itália. É um de nove exemplares conhecidos em toda a Hispânia.
Já Adriano, escultura do mesmo período, também terá vindo de oficinas italianas, e considera-se «muito rara em ambiente privado».
Pensa-se que estas peças terão sido aquisições de uma antiga família abastada, talvez com gosto pela arte e colecionismo e com afinidades à família imperial de Roma.
O penúltimo passo foi o parecer positivo, em maio, da Secção dos Museus, da Conservação e Restauro e do Património Imaterial (SMUCRI) do Conselho Nacional de Cultura (CNC), que apesar de não ser vinculativo, é determinante para a candidatura chegar a Conselho de Ministros.
«O que sabemos sobre estes bustos é que foram encontrados junto ao peristilo de Milreu, em 1966, numa campanha de limpeza» por parte da Direção-Geral dos Edifícios e Monumentos Nacionais (DGEMN).
Então, «o achado terá seguido o curso normal, e penso que há uma troca de correspondência entre o município de Faro e esse organismo, que tutelava as questões do património histórico e arquitetónico à época. Está referido que, dentro do território concelhio, o único espaço condigno para acolher estas peças seria o antigo Museu Municipal» que na altura ainda não estava instalado onde está hoje, no Convento da Nossa Senhora da Assunção, no coração da cidade velha.
A verdade é que Agripina e Adriano terão permanecido na capital algarvia, até hoje, ao contrário do muito espólio que permanece em Lisboa, sobretudo nas reservas do Museu Nacional de Arqueologia.
Em relação ao busto do imperador Galieno, aristocrata e intelectual, apaixonado pela cultura helénica, «acerca do seu paradeiro e dos vários percursos que terá feito até chegar a Lagos, não sei muito. Também não posso confirmar se foi, ou não, descoberto em 1966. O que posso dizer é que a proposta para integrar a candidatura veio dos serviços técnicos da DGPC. Neste caso, houve uma sugestão por parte de Teresa Ramalho, técnica superior de arqueologia, oportuna e pertinente, que recebeu a nossa proposta e adicionou um terceiro elemento, por considerar que são peças da mesma época e provenientes do mesmo espaço. Por isso, fazia sentido integrá-lo».
Marco Lopes gostou da ideia que acabou por fortalecer a candidatura inicial. «Os três bustos estão bem estudados, estão bem conservados, embora separados por vicissitudes históricas, tal como tantas peças que acabam por ir parar a sítios inusitados».
«Acho que é um orgulho e uma enorme satisfação que esta região, ainda considerada periférica em muitas áreas, mas que tem um património valiosíssimo, agora validado por altas instâncias da área da cultura. Isso representa também o bom trabalho que os museus algarvios fazem e os profissionais qualificados que temos. Espera-se por isso que esta classificação, merecida e em boa hora, coloque o Algarve e estas peças no roteiro de investigadores, entendidos e de muitos visitantes», sublinha.
O responsável não esconde que «ainda poderá haver surpresas à espera de serem descobertas em Milreu. Há suspeitas, que o potencial arqueológico poderá extravasar o perímetro que hoje está limitado. Existem essas suspeitas do ponto de vista de alguma documentação».
Sobre a participação, a Direção Regional de Cultura do Algarve, «como entidade que gere as ruínas romanas de Milreu, teve um papel de apoio científico e de colaboração institucional, e até de validação» do processo, apesar de ser uma candidatura que partiu da iniciativa da Câmara Municipal e do Museu Municipal de Faro.
Ouvida pelo barlavento, Adriana Nogueira, diretora regional de cultura do Algarve, congratula-se que «haja reconhecimento da importância que o património que aqui é encontrado tem para o país».
Em relação ao futuro, «os três bustos vão permanecer cá. O facto de haver muita coisa de Milreu no Museu Nacional de Arqueologia, em Lisboa, é uma situação de contexto histórico porque, quando muitas escavações foram feitas no século XIX, não havia no Algarve um local onde se pudesse concentrar tudo o que estava a ser descoberto. Como aliás, ainda não há, pois cada município tem os seus espaços».
Por sua vez, Elena Morán, coordenadora geral do Museu de Lagos Dr. José Formosinho, disse ao barlavento que o busto do imperador Galieno terá um lugar de destaque no futuro núcleo de arqueologia daquele equipamento cultural, cujas obras deverão arrancar em janeiro próximo.
«Isso já estava previsto, o busto é uma das nossas estrelas. É uma peça que entrou no nosso acervo através da cedência de um privado. Não tenho a certeza se terá sido encontrada na campanha de limpeza da DGEMN em 1966. Posso dizer que já foi apresentado em várias exposições nacionais e internacionais» como é o caso do Museu de Mérida e outros, «onde surgiu sempre associado a um catálogo».
Morán manifesta-se feliz e considera que, além de Lagos, «este reconhecimento acaba por beneficiar todo o Algarve. É algo que dará visibilidade a toda a região».
Ermida de Santo António ganha novo serviço educativo
O Museu Municipal de Faro tem hoje um serviço educativo que além de trabalhar em casa, também serve o Museu Regional do Algarve. Em 2022 será criada uma terceira frente na Ermida de Santo António do Alto, que apesar de já ter dado os primeiros passos «vai ganhar consistência com uma agenda própria», revela o diretor Marco Lopes.
«Não se ficará apenas por atividades para as escolas. O nosso objetivo é organizar, por exemplo, visitas guiadas para outros grupos, como famílias, e acolher momentos culturais. É importante que se faça uma ligação entre este património e a comunidade». Após duas fases de intervenção, a carismática Ermida, propriedade do município, localizada num ermo atrás do Liceu de Faro, foi devolvida à cidade a 13 de julho de 2019. A ideia, contudo, «é olhar para o património arquitetónico religioso municipal» e alargar o serviço à Ermida de São Sebastião (junto ao quartel da Guarda Nacional Republicana), onde existe «um conjunto relevante de azulejaria, retábulos e vestígios de arquitetura do século XVI, que constituem um pequeno tesouro». Antes, caberá ao serviço de conservação e restauro do Museu Municipal de Faro, avaliar o estado do espólio e atuar para o proteger.
Museu Municipal de Faro continua a apostar na História da cidade e do território
Em relação aos pontos altos da programação do Museu Municipal de Faro para 2022, o diretor Marco Lopes destaca uma exposição dedicada a Joaquim António Viegas, «não como colecionador, mas sobre o seu percurso académico, com desenhos e pinturas» e que terá a curadoria de Fernando Rosa Dias, investigador e professor de Ciências da Arte na Faculdade de Belas-Artes da Universidade de Lisboa. Se tudo correr bem, a inauguração será em março».
Além disso, «está a ser preparada uma mostra sobre a obra do pintor e artista plástico António Costa Pinheiro, reconhecido como «pioneiro discreto de várias tendências da arte contemporânea», que segundo Marco Lopes «viveu no Algarve, no concelho de Olhão desde os anos 1990».
O espólio será cedido pela São Roque – Antiguidades e Galeria de Arte, referente à série dos reis, e virá por sugestão de Mirian Tavares, coordenadora do Centro de Investigação em Artes e Comunicação (CIAC) da Universidade do Algarve. «O projeto é a representação artística dos vários reis de Portugal, um traço muito interessante, numa recriação lírica e irónica».
Ainda no próximo ano, será retomada a parceria com a Fundação Millennium BCP, uma coletiva de artistas do século XX.
«Queremos também dar continuidade ao discurso do Museu que é sobretudo de História da cidade e do território. Temos um projeto que está terminado e à espera de ser concretizado, que será um novo núcleo permanente, com peças do nosso acervo que estão em reserva, sobre Faro entre os séculos XII e XVI», revela o responsável.
Uma das peças-chave é o foral de Faro de D. Manuel, que estava no Museu Nacional Machado de Castro, em Coimbra, «e que tem sido pouco mostrado», além de «fragmentos de arquitetura de edifícios do século XV e XVI da cidade».