GSSIC: Consórcio algarvio desenvolve sistema inteligente e inovador de rega de espaços verdes públicos

  • Print Icon

Green Spaces SMART Irrigation Control (GSSIC) junta as empresas Visualforma e Itelmatis à Universidade do Algarve (UAlg). Objetivo é criar um produto para a rega eficiente integrado nas redes de gestão municipais segundo os princípios da agricultura de precisão.

Quando e quanto regar. A decisão pode ser automática ou à distância de um clique numa sala de controlo municipal. Será tomada tendo em conta as plantas, a dimensão e características específicas de cada jardim ou espaço verde, o histórico e previsão das condições meteorológicas, as taxas de evapotranspiração, entre outros dados fornecidos em tempo real por sensores instalados no terreno. Além de decidir quando abrir e fechar as torneiras, poderá ainda ajudar a reduzir perdas de água.

É este o nível de complexidade do Green Spaces SMART Irrigation Control (GSSIC) que está a ser desenvolvido no Algarve, com o apoio de fundo europeus, desde novembro de 2020.

«Daí termos juntado estas três entidades. Primeiro, toda a base de conhecimento e de investigação que a Universidade traz para um projeto desta natureza. A Itelmatis tem experiência no sector agrícola e na utilização e racionamento da água. A nossa componente é ao nível das comunicações e da capacidade de colocar um produto como este no mercado», começa por explicar Humberto Bento, diretor de Operações da Visualforma – Tecnologias de Informação.

Por usa vez, Miguel Inocêncio, da empresa Itelmatis Control Systems, acrescenta que «desde a sua origem, esta empresa sempre teve uma vertente de inovação e uso de novas tecnologias. Este consórcio veio despoletar uma nova abordagem à gestão dos recursos hídricos, materializada num produto inovador para rega de espaços verdes públicos. Já existem algumas soluções. A diferença, contudo, tem a ver com os algoritmos de análise que estamos a desenvolver, de forma a que a rega seja muito eficiente».

«O que existe são sistemas, digamos, estáticos e reativos. O que queremos desenvolver é uma plataforma muito mais proativa. Imagine isto: se a previsão diz que amanhã chove, o nosso sistema decide não regar hoje, ou então restringe a rega ao estritamente necessário, tendo em conta uma série de variáveis num contexto específico», diz.

Pedro Cardoso, docente e investigador do Instituto Superior de Engenharia (ISE) da Universidade do Algarve (UAlg), tem estado a desenvolver os algoritmos necessários. «Tem sido muito desafiante em termos de conhecimento científico aplicável e inteligência artificial. O sistema poderá trabalhar com dados de uma estação meteorológica local, ou com um um serviço online que forneça um feed. A partir daí, consegue extrapolar, por exemplo, os valores de evapotranspiração» e gerar uma tomada inteligente de decisões, estudando aquilo que aconteceu ao longo do tempo e que vai servir de referencial para se tentar gastar menos ou encurtar os consumos de água.

No terreno, haverá também adaptações técnicas a fazer. «O que pode fazer a diferença é a rega nos arbustos e nos canteiros, onde poderá haver pulverizadores em vez de aspersores. São parcelas mais pequenas onde a necessidade hídrica é diferente da relva», acrescenta Carlos Guerrero, diretor da Faculdade de Ciências e Tecnologia (FCT) da UAlg.

«Na agricultura moderna, o objetivo é optimizar tudo para a máxima produção. Aqui, o objetivo passa por maximizar a eficiência da gestão da água assegurando simultaneamente a otimização da aparência visual da vegetação existente em cada espaço. Conseguir o verde mais bonito com o menor gasto de água», compara o académico.

Quanto maior for a capacidade de investimento, mais fina será a gestão. Quanto maior a monitorização, melhor o grau de precisão do sistema, embora esteja pensado para ser modelar, de acordo com o orçamento e as necessidades de cada município, uma vez que o GSSIC está vocacionado para espaços públicos. Para já, está a ser testado no Jardim das Comunidades, em Almancil e no Jardim do Parque Municipal de Loulé.

A rega não é o limite

Mas como funciona? Tudo começa com a instalação de uma rede de comunicações, baseada no protocolo LoRaWAN (Long Range Wide Area Network), de comunicação rádio de dados. Dispensa o uso de cartões SIM, o que melhora a eficiência e os custos.

«Vou dar um exemplo: acabámos a instalação de quatro gateways para cobrir a periferia urbana de Lagos», revela Humberto Bento. Todos os sensores que venham a ser instalados na cidade vão usar este protocolo.

«Assim, podemos receber dados informativos ou transmitir comandos, nomeadamente, abrir e fechar a rega. Mas não só».

Miguel Inocêncio corrobora: «a plataforma que estamos a preconizar per si, é IoT (Internet of Things). Ou seja, estes gateways podem servir vários sistemas verticais».

Humberto Bento continua a explicar: «trabalhamos na esfera nacional e o paradigma começa a ser este: os municípios decidem ser proprietários das suas redes privadas LoRaWAN e, a partir daí, criam os vários sistemas de gestão inteligentes. Cada lâmpada de iluminação pública pode ter um sensor ligado à rede. Estamos a falar em várias aplicações na gestão de resíduos sólidos, de monitorização ambiental, de detecção de sistemas de mobilidade partilhada, o que se quiser é possível».

Alguns municípios que quiserem ser pioneiros veem-se hoje a braços com sistemas de comunicação proprietários, por vezes incompatíveis entre si, e com várias antenas e controlos. «Exatamente. Não se integram numa rede smart city una, na qual se possam criar vários verticais. Estamos a tentar sensibilizar os municípios para evitar que isto volte a acontecer», assegura.

Especial importância para o Algarve

A importância de se poupar água é hoje reconhecida de norte a sul do país. No entanto, este projeto tem uma importância especial ao nível local.

«Falamos de um projeto macro que está a ser pensado há muito tempo, que é a Região Inteligente Algarve (RIA), inclusive somos uma das empresas privadas que o acompanha desde a génese. Estamos a mapear tudo aquilo que já existe em termos de redes smart city, em função da localização, para criar uma base de open data», que poderá também vir a ser alimentada pelo GSSIC.

«Não estamos a desenvolver nada ao nível das comunicações. Estamos a usar um protocolo aberto, por assim dizer, para evitar, o que existiu no passado, com custos muito grandes, que é a duplicação de estruturas. A parte core do projeto, onde está a inovação, é no desenvolvimento do software. Outra componente que fica do lado da Visualforma, é planear como é que o GSSIC se vai encaixar nas agora badaladas salas de controlo. Quase todos os municípios estão a criar as suas smart rooms que, no fundo, são os centros de comando das smart cities, onde se observam as várias vertentes daquilo que o município é responsável por controlar. Faz parte deste projeto criar um front office para a utilização normal, para que quem vai estar nas salas de controlo dar ordens, no fundo, para quais são as situações que devem ser resolvidas», continua Humberto Bento.

No entanto, neste caso, o objetivo é que não seja necessário estar um engenheiro paisagista ou agrónomo aos comandos. «Sabemos que o nível de granularidade, em que se tende a dar a tudo o que é uma gestão pública, tende a não ser o mais eficaz possível. Portanto, a ideia é que os sistemas possam ter automatismos próprios para ajudar a reduzir», acrescenta.

O gestor de operações acredita que «todos os municípios em Portugal vão ter de investir em sistemas de gestão da água. Aliás, basta ver as linhas dos Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), em que grande parte dos projetos são dirigidos à eficiência hídrica».

Próximo outono será decisivo

O projeto Green Spaces SMART Irrigation Control entrou agora numa segunda fase de desenvolvimento, em que sai do campo científico e começa a alimentar os algoritmos com dados reais dos dois testbeds (camas de teste) que estão em experimentação em zonas verdes urbanas no concelho de Loulé.

Estas são as primeiras imagens, obtidas em março, à saída do inverno, logo sem qualquer efeito de calor ou falta de água. Nos próximos meses, as imagens poderão mostrar outra realidade.

Aqui, interessa observar o Normalized Difference Vegetation Index (NDVI), um índice que se calcula através da determinação dos valores de refletância [em física, é proporção entre o fluxo de radiação eletromagnética incidente numa superfície e o fluxo que é refletido] nas bandas do infravermelho próximo e o vermelho. Este índice é utilizado para monitorizar o estado da vegetação, em especial para avaliação da biomassa, ou do estado hídrico das plantas. Permite estimar a concentração de clorofila na folha, permitindo, assim, ter uma «leitura» da cor verde da folha/planta.

O índice define valores entre -1 e +1, onde:

  • Valores negativos são formados principalmente por nuvens, água e neve;
  • Valores próximos a zero são formados principalmente por rochas, areia, solo nu ou neve;
  • Valores moderados (de 0,2 a 0,3) representam arbustos e prados;
  • Valores altos (de 0,6 a 0,8) indicam florestas temperadas e tropicais, bem como relvados com uma boa aparência visual.

As figuras 2 e 3 apresentam a determinação do NDVI relativo ao coberto do Jardim das Comunidades em Almancil e à zona mais a norte do Jardim do Parque Municipal de Loulé, respetivamente.

Figura 2.

Na figura 2, é possível identificar que as superfícies inanimadas estão a laranja-vermelho, sendo que para a água, por termos encurtado a escala a valores de 0 a +1, o NDVI não aparece quantificado (opção para melhor isolar a massa de água).

Os relvados das zonas centrais apresentam valores de NDVI de 0,70, demonstrando uma boa densidade e cor. Nas zonas mais periféricas do jardim, os valores de NDVI caem para 0,15 a 0,20, indicativo de relvado pouco denso e com verde clorótico.

A figura 3 apresenta o zoneamento do coberto vegetal para o Jardim do Parque Municipal de Loulé, composto por relvados, arbustos e árvores, em função do estado destas plantas em termos de densidade e cor.

As zonas a verde são indicativas do coberto vegetal arbóreo (com domínio do pinheiro manso).

Figura 3.

As zonas a amarelo e laranja mais claro representam zonas de relvado, sendo que os valores de NDVI de 0,40 identificam zonas menos densas, provavelmente devido a maior pisoteio. As zonas a vermelho e laranja mais escuro são representativas de infraestruturas em betão e/ou solo descoberto.

Perdas, um problema (in)visível

A plataforma Green Spaces SMART Irrigation Control (GSSIC) «também está preparada para a deteção de fugas. Quantos jardins vemos que, fora da janela de rega, geralmente à noite, porque durante o dia têm os sistemas desligados, estão cheios de fugas?», questiona

Miguel Inocêncio, da empresa Itelmatis Control Systems. Pela experiência, «num município grande com muitos espaços verdes, o consumo noturno natural das janelas de rega à noite é, em alguns sítios, igual ao diurno com as fugas. Só se sabe depois de implementar um sistema destes».

Orçamento e apoio europeu

O Green Spaces SMART Irrigation Control (GSSIC), solução de rega inteligente e inovadora ao nível da redução do consumo de água, da diminuição do tempo de reação na resolução de problemas, do incremento na eficiência no despiste de roturas e na manutenção da qualidade dos espaços, representa um investimento total de 581 mil euros, associado a um incentivo total de fundos europeus, através do Programa Operacional Algarve 2020, de 402 mil euros.

Publireportagem | Programa Operacional CRESC Algarve 2020