Plataforma PAS refuta alargamento do regadio no Algarve

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Plataforma Água Sustentável (PAS) fundamentou oposição ao estudo «Regadio 2030», em sede de consulta pública, no que toca ao Algarve.

As propostas para o alargamento do regadio no Algarve «não têm quaisquer dados de base que as suportem».

Esta é a síntese da posição da Plataforma Água Sustentável (PAS), que agrupa a Liga para a Proteção da Natureza (LPN) e a Quercus a associações ambientais e de cidadania como A Rocha Portugal, Almargem, CIVIS, Faro 1540, PROBAAL – Pró Barrocal Algarvio, Regenerarte, e os movimentos de cidadãos, Água é Vida, FALA – Fórum do Ambiente do Litoral Alentejano e Glocal Faro. A PAS submeteu a posição conjunta no âmbito da consulta pública relativa ao «Regadio 2030», que terminou no domingo, dia 16 de janeiro.

No diagnóstico que é feito para a região no estudo, diz a PAS, perpassa a ideia, errada, «de que a pressão de utilização dos recursos hídricos decorre do abastecimento público urbano com capitações muito acima da média habitual e com pico de pedido precisamente na época de estiagem».

Uma ideia que a plataforma desconstrói com base em dados do Plano Regional de Eficiência Hídrica do Algarve (PREHA).

Segundo o documento, «a agricultura consome cerca de 56,8 por cento do volume total de água captada no Algarve, enquanto que o abastecimento urbano consome cerca de 34 por cento do recurso».

E segundo as informações da Agência Portuguesa do Ambiente (APA), citadas pela plataforma, as origens da água para a agricultura são 25 por cento superficial e 75 por cento subterrânea, e para o abastecimento público são 94 por cento superficial e apenas seis por cento subterrânea.

«É, portanto, no mínimo sem fundamento a afirmação que é feita no texto de que esta problemática obrigou mesmo a que se tivesse recorrido recentemente a importantes extrações subterrâneas nalgumas zonas para atender ao abastecimento público».

De acordo com o texto do «Regadio 2030», as intervenções a realizar no Algarve no que diz respeito à implementação de novos regadios, passam sobretudo «pela integração de regadios privados existentes, abastecidos por origens subterrâneas, em regadios coletivos abastecidos por origens de superfície, de modo a preservar os recursos hidrogeológicos, numa região particularmente suscetível à intrusão salina».

A PAS considera que esta intenção «é boa. No entanto, peca por informação deficiente. A intrusão salina de que se fala decorre da utilização de volumes excessivos de água subterrânea pela agricultura, mas essa é só uma parte dos danos que a atividade provoca nos aquíferos».

Além do problema da intrusão salina, acrescenta a PAS, «todos os aquíferos da região estão poluídos com contaminantes (fertilizantes e pesticidas de síntese) oriundos da atividade agrícola. As mobilizações de solos que a agricultura intensiva pratica destroem os pontos de recarga dos aquíferos, acrescentando ao problema da falta de pluviosidade, o problema da falta de recarga que se verifica na região já há vários anos».

A PAS duvida ainda da solução proposta de «pequenos açudes-móveis em locais estratégicos que assegurem a garantia para resposta ao pedido de abastecimento público, quer no Barlavento quer no Sotavento, em períodos de escassez, retirando pressão e disponibilizando os recursos hídricos de superfície necessários à agricultura de regadio e permitindo mesmo alguma permuta pelo uso de recursos superficiais para benefício de áreas agrícolas hoje servidas através de furos. Esta estratégia não só aumentará a sustentabilidade do regadio como contribuirá para a preservação dos aquíferos».

Para os ambientalistas, «a instalação de pequenos açudes móveis para retirar a pressão sobre os aquíferos subterrâneos parece uma boa iniciativa. No entanto, com a crescente escassez de pluviosidade a eficácia da intervenção é duvidosa. E a utilização prevista para essa água maximiza a pressão sobre o recurso. De facto, transformar regadios privados em públicos implica uma obrigatoriedade de fornecimento de água que atualmente não existe. Expandir as áreas de regadio aumenta igualmente a pressão sobre o recurso, o que não é razoável no atual cenário de alterações climáticas».

Outro aspeto que não se «compreende é a sobreposição das intervenções propostas com a intervenção prevista no âmbito do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR), de fazer uma captação de água no Guadiana a jusante de Alqueva, sobretudo porque os novos regadios propostos se situam no sistema Beliche-Odeleite, que supostamente, será reforçado por água oriunda dessa captação. Não concordámos com essa obra pelos seus impactos ambientais, já que comprometeria ainda mais a disponibilização dos caudais ecológicos necessários para o normal funcionamento dos ecossistemas a jusante do Alqueva».

E mais: «a maior parte das barragens da região estão desde 2019 abaixo da média de captação calculada a partir do ano de construção. Construir mais captações não vai trazer mais chuva para a região. E se houver chuva, a capacidade de armazenamento que temos instalada é suficiente. A intenção de instalar açudes não é, em si, desadequada. Poderiam ser usados para hidratar a paisagem e recarregar aos aquíferos a jusante das captações. No entanto, instalar essas infraestruturas para transformar regadios particulares em públicos é colocar uma pressão maior sobre o recurso água».

Em jeito de conclusão, a PAS considera «fundamental o controlo real dos consumos, por origem. Ou seja, não é possível gerir ou planear nada se não se conhecer a realidade, os consumos na agricultura, que é o maior consumidor de água na região e no país».

Sociedade Anónima sugere investimentos públicos

O estudo «Regadio 2030» tem por objetivo identificar e caracterizar investimentos a realizar na próxima década e no decénio seguinte no âmbito do regadio público, em Portugal Continental. A Plataforma Água Sustentável (PAS), na sua posição à consulta pública relativa ao «Regadio 2030», alerta para um eventual conflito de interesses entre o interesse público e o interesse privado.

«Constatámos com estranheza que a Direção Geral de Agricultura e Desenvolvimento Rural (DGADR) – Autoridade Nacional do Regadio é identificada» no estudo, «como uma mera entidade do repositório histórico e legal. Essa estranheza aumentou quando verificámos que a entidade coordenadora e editora do documento é a EDIA – Empresa de Desenvolvimento e Infraestruturas do Alqueva, SA. Efetivamente, não nos parece curial ser a empresa gestora de um dos aproveitamentos hidroagrícolas existentes a apresentar uma proposta de investimentos de nível nacional que beneficia igualmente o empreendimento gerido pela própria empresa autora da proposta. A isso chama-se ser juiz em causa própria e gostaríamos que a DGADR nos esclarecesse sobre a opção de ser a EDIA a apresentar uma proposta que, na nossa opinião, deveria ser da autoria do Estado português».

Tribunal de Contas Europeu desaconselha regadio no sul

Segundo a Plataforma Água Sustentável (PAS), «já em 2018 o Tribunal de Contas Europeu salientava o risco acentuado de desertificação no sul de Portugal e aconselhava que se praticassem culturas adaptadas às disponibilidades de água e que se procedesse à reversão da degradação dos solos até 2030, conforme estabelecido pela Comissão Europeia». No entender da PAS, a proposta «Regadio 2030» ignora esse pressuposto e ao invés, «propõe a instalação de cada vez mais área regada, apesar de não haver garantias da disponibilidade de recursos hídricos e do incentivo que isso representa para a agricultura intensiva que destrói os solos, esgota e polui os aquíferos subterrâneos e destrói a biodiversidade».

Aumentam pedidos de construção em Reserva Agrícola Nacional

A Reserva Agrícola Nacional (RAN) abarca um conjunto de áreas com maior aptidão para a atividade agrícola, pelo que, regra geral, consubstancia áreas onde não é permitido erguer edificações (non aedificandi), nas quais vigora uma restrição de utilidade pública. Cabe à Entidade Regional da Reserva Agrícola Nacional (ER-RAN), instituição de natureza colegial, entre outras competências, a emissão de pareceres prévios vinculativos sobre as utilizações não agrícolas nestes territórios. Neste contexto de pandemia, durante o ano de 2021, deram entrada na Direção Regional de Agricultura e Pescas (DRAPAlg), 480 processos para emissão de parecer prévio, tendo sido realizadas 43 reuniões por videoconferência, que deram origem a 900 deliberações, verificando-se, em relação a 2020, um acréscimo 12 por cento de pedidos.