Os impactos sociais do segundo confinamento foram mais intensos e quatro em cada 10 pessoas consideraram que o de 2021 foi mais difícil.
A conclusão é de um inquérito feito pelo Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa (ICS-ULisboa).
O inquérito nacional «Os impactos sociais da pandemia: o segundo confinamento» concluiu que 40 por cento dos inquiridos revelou maiores dificuldades em lidar com o segundo confinamento, enquanto 30 por cento responderam que foi igual ao primeiro e para 27 por cento foi mais fácil.
Os inquiridos em situação de vulnerabilidade laboral precipitadas pela pandemia, jovens e famílias com filhos menores, com maiores desafios em conciliar o trabalho e a vida e tarefas familiares, foram os que sentiram um maior impacto no segundo confinamento.
De acordo com o inquérito, em que participaram 11.500 pessoas, em março de 2020, e 7.900 no segundo, em fevereiro de 2021, «os dois confinamentos, apesar de algumas dificuldades e preocupações em comum, foram vividos de forma diferente e os impactos sofridos também foram sentidos com uma intensidade distinta», acentuou, em declarações à agência Lusa, uma das coordenadoras, Rita Gouveia.
«Para aqueles que admitiram estar a ser especialmente difícil lidar com o confinamento de 2021, observamos um aumento da tensão familiar, um maior comprometimento do bem-estar psicológico, uma maior vulnerabilidade financeira, uma sobrecarga no volume e gestão das tarefas domésticas e uma diminuição dos níveis de confiança política», referiu o ICS-ULisboa, em comunicado.
Se o primeiro recolhimento em casa devido à pandemia foi «marcado pelo inesperado, pela incerteza, pelo desconhecimento», o segundo «dominado pelos danos, pelas perdas, pelo cansaço, mas também pela adaptação e pela doença, experienciada na primeira pessoa ou através dos outros, experienciado numa narrativa de fadiga», salientou Rita Gouveia.
No caso dos jovens entre os 16 e os 24 anos, 76 por cento dizem-se pouco ou muito pouco satisfeitos com a frequência das aulas a partir de casa e não consideram o ensino remoto uma solução que agrade, por não sentirem a mesma motivação, invocarem maior cansaço, obstáculos pedagógicos na transição para o ensino superior e ressentirem-se da falta de convívio, além de manifestarem preocupações em relação ao futuro.
Entre as pessoas que não notaram diferença entre os dois confinamentos encontra-se quem não viu a sua condição perante o trabalho ser alterado com a pandemia, seja porque continuaram a trabalhar nas mesmas condições, seja porque estes inquiridos já não trabalhavam antes.
Os inquiridos que consideraram ter sido mais fácil o confinamento de 2021, não residem com menores de idade e têm uma situação financeira bastante confortável e inalterada com a pandemia, não tendo qualquer preocupação face à possibilidade pagar as suas despesas básicas.
«Estes dados vêm reforçar a importância de olhar para a construção da vulnerabilidade social associada à pandemia numa perspetiva multidimensional e relacional, mas também enquanto um processo de efeitos a curto e longo prazo, que não acontece num vazio social, mas que é moldado pelos contextos sociais de vida diferenciados dos indivíduos, que na sociedade portuguesa são bastante desiguais», alertou uma das coordenadoras do inquérito, Rita Gouveia.
A investigadora defendeu que o desenho das políticas públicas de contenção da pandemia e de apoio aos segmentos mais afetados e vulneráveis socialmente «deve ter em conta as desigualdades de género, idade, escolaridade, profissionais, geográficas, habitacionais, familiares e de saúde física e mental que moldam os impactos da pandemia nos indivíduos, nas famílias e na sociedade portuguesa em geral».
O relatório foi apresentado hoje, quinta-feira, durante a conferência «Impactos sociais da pandemia em Portugal e na Europa», onde foram divulgados os resultados do mais recente inquérito conduzido pela Fundação Europeia para a Melhoria das Condições de Vida e de Trabalho (Eurofound) à população da União Europeia.
O inquérito do (ICS-ULisboa) baseia-se em amostras obtidas através da técnica «bola de neve», a residentes em Portugal maiores de 16 anos, restrita a inquiridos com acesso à Internet, «o que não permite que se façam generalizações sobre a população portuguesa, no geral», advertem os investigadores.
Em Portugal, morreram 17.049 pessoas dos 859.045 casos de infeção confirmados, de acordo com o boletim mais recente da Direção-Geral da Saúde (DGS).