Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção de Crianças e Jovens (CNPDPCJ) lança hoje uma nova campanha destinada a sublinhar a importância da comunicação de situações de crianças e jovens em perigo, apelando à especial envolvência de toda a sociedade civil.
Tendo em conta a atual situação que o país atravessa, que levou à suspensão de atividades de algumas das entidades de primeira linha e à redução do número de comunicações de situações de perigo, a Comissão Nacional de Promoção dos Direitos e Proteção de Crianças e Jovens (CNPDPC)) lança hoje, terça-feira, dia 19 de maio, uma campanha destinada a sublinhar a importância da comunicação destas situações, apelando à especial envolvência de toda a sociedade civil.
Assim, reforçando o trabalho que tem vindo a ser realizado pelas Comissões de Proteção de Crianças e Jovens (CPCJ) ao longo deste período de pandemia e confinamento, e de forma a tornar mais acessível a comunicação de situações de perigo foi criada uma campanha nacional sob o lema «Proteger crianças compete a todos».
Esta campanha pretende chamar a atenção de toda a primeira linha de ação, com especial destaque para a sociedade civil: amigos, vizinhos, familiares e conhecidos, todos têm responsabilidade de comunicar situações que conheçam.
Para isso foi criado e está acessível (entre as 8 e as 20 horas) o número de telefone 96 123 11 11, da responsabilidade da CNPDPC, que garantirá o devido encaminhamento destas situações para a CPCJ territorialmente competente.
A Comissão Nacional tem vindo a produzir vários materiais informativos e orientadores, tanto para as CPCJ como para a sociedade em geral. Sobre esta campanha em particular, está disponível um folheto para o público.
Foi também elaborado um modelo de ficha de comunicação de situações de perigo, adaptado ao contexto atual, que está a ser divulgado pelo Ministério da Educação junto dos Agrupamentos Escolares e/ou Escolas não agrupadas (adaptado ao atual período de ensino à distância.
Atualmente, apesar das medidas de confinamento, as CPCJ estão a acompanhar cerca de 43 mil crianças em todo o país, tendo-se mantido em funcionamento, fazendo o acompanhamento presencial das crianças e famílias sempre que a situação assim o exija.
As CPCJ são instituições com autonomia funcional e competência para a tramitação dos Processos de Promoção e Proteção, que são confidenciais e reservados, como decorre da lei.
O Sistema Português de Promoção e Proteção de Crianças e Jovens está assente numa intervenção em vários níveis, começando na família e terminando nos Tribunais.
Numa primeira linha respondem pela proteção das crianças, a família e a sociedade em geral (vizinhos, amigos, conhecidos), bem como as Entidades com Competência em Matéria de Infância e Juventude (as escolas, instituições de
saúde, forças de segurança, associações e coletividades, entre outros).
Na segunda linha estão as CPCJ, que intervêm quando se esgota a resposta protetiva da primeira linha. Esta intervenção depende do consentimento dos progenitores ou cuidadores, bem como o da criança com idade superior a 12 anos.
Na ausência deste consentimento ou esgotados os meios ao alcance da Comissão de Proteção, a situação é remetida à terceira linha do sistema, o Ministério Público e os Tribunais.
A Comissão Nacional apela à especial importância do envolvimento de toda a sociedade, para que seja exercida uma cidadania ativa na promoção dos direitos de todas as crianças, reforçando que «Proteger crianças compete a todos».
Proteger Crianças Compete a Todos!
«Hoje, mais do que nunca, caberá a todos acautelar a proteção de crianças e jovens numa situação nova e excecional que é a que atravessamos. Este ano de uma nova forma, mas mais firmes do que nunca. Cada um de nós tem o dever de proteção, sinalizando e denunciando. A responsabilidade de agir e proteger é de tod(as)!», sublinha Ana Mendes Godinho, ministra do Trabalho, Solidariedade e Segurança Social.
No momento dramático e tão exigente que atravessamos, resultante da pandemia da COVID-19, Portugal, à semelhança de outros países, enfrenta sérios desafios para assegurar, de forma eficaz e adequada, a promoção e proteção dos direitos das suas Crianças e Jovens.
O dever de ficar em casa para se proteger e proteger os outros, tem de ser conciliado com o dever inadiável da proteção.
Todos somos responsáveis pela prevenção e proteção dos maus tratos/abusos contra as crianças. E todos, significa o envolvimento de toda a comunidade: familiares, vizinhos, amigos, lojistas do bairro, professores, educadores, Forças de Segurança, entre outros são fundamentais para garantir essa proteção.
Uma vez que as crianças não estão, agora, presencialmente nas escolas, nas creches, jardins de infância, clubes e outras associações, pois têm de ficar em casa, a atenção, o cuidado, o olhar treinado dos profissionais dessas entidades para detetarem sinais, comportamentos estranhos, indicadores de maus tratos/abusos, estão muito comprometidos, o que agrava substancialmente o risco e o perigo a que essas crianças podem estar a ser sujeitas.
A violência sobre crianças, em ambiente familiar, constitui um grave problema na nossa sociedade. Não é um assunto novo, não é exclusivo das classes desfavorecidas em termos socioeconómicos e não apareceu agora com a situação da pandemia da COVID-19.
E real, é algo muito sério: pode ir de agressões físicas, repetidas, mais ou menos brutais, a verdadeiras torturas psicológicas e emocionais, que podem fazer da família um inferno para a criança.
Num período em que o isolamento social se impõe, os muros de silêncio e o medo que caracterizam essas famílias estão ainda mais escondidos e calados; os riscos e os perigos dificilmente se deixam ver, para além das paredes que os isolam.
Nessa medida, é fundamental a atenção redobrada de todos: o cuidado de observar, de escutar, de ir à janela e sorrir para as crianças e perguntar se está tudo bem, analisar as suas reações, a sua linguagem verbal e corporal, os seus silêncios, não deixando que a indiferença do tempo de confinamento condicione o nosso dever de proteção.
Sinais de Alerta
O choro repetido ou, pelo contrário, um silêncio absoluto e perturbador numa casa com crianças; gritos interrompidos por longos silêncios; crianças que não são vistas nem sequer às janelas, varandas, quintais, parecendo ter desaparecido das suas casas; adultos que choram disfarçada e discretamente para não serem vistos ou castigados por agressões em casa, pessoas que tentam falar, mas que contêm as palavras, por medo das consequências… constituem sinais muito alarmantes.
Nestes tempos de isolamento social, os maus tratos físicos podem acontecer e serem ainda mais facilmente escondidos, pois estas famílias não levam as crianças ao hospital, exatamente para não se descobrir e identificar a situação de maus tratos/abusos a que as sujeitam.
Sinais físicos como nódoas negras, hematomas, queimaduras, dentadas, puxões de cabelo, abanões, pontapés, empurrões, são agora muito mais difíceis de observar e identificar. Por isso, em caso de suspeita, deve ligar-se sempre para as Forças de Segurança: PSP ou GNR e comunicar as situações, podendo fazê-lo de forma anónima.
Desse modo, as crianças poderão ser encaminhadas para o hospital, onde serão devidamente observadas e avaliadas.
Quando tal se justificar, serão levadas ao Instituto de Medicina Legal para perícias que comprovem os maus tratos/abusos.
Podem, igualmente, ser sinalizadas à CPCJ (Comissão de Proteção de Crianças e Jovens) da sua área de residência e ao tribunal, se for essa a situação.
Outros sinais que merecem muita atenção
O abuso psicológico e emocional, em que a criança é sujeita a insultos, culpabilização, ameaças, até de morte, exposição a cenas de violência conjugal, ao uso abusivo de álcool, de drogas, a distúrbios psiquiátricos, falta de afeto e de atenção, rejeição afetiva, retenção onde a criança é impedida de brincar, de correr e de se sujar, ficando sempre no quarto ou noutro compartimento fechado.
À suspeita de abuso sexual, em que a criança é usada para diversas práticas que visam a gratificação e a satisfação sexual de adultos ou jovens mais velhos em situações de poder e controlo, é outro dos flagelos a que as nossas crianças podem estar sujeitas. Segundo dados do Conselho da Europa, uma em cada cinco, já foi vítima de abusos sexuais.
À negligência parental, em que a criança sofre com o comportamento regular de omissão da familia/cuidadores em relação aos cuidados básicos essenciais a lhe prestar. Desde os acidentes domésticos por falta de vigilância, quedas, ingestão de medicamentos ou produtos cáusticos, queimaduras, até à alimentação inadequada, fome, clausura, falta de higiene, entre outros.
A saúde da criança, constitui um aspeto muito importante, na medida em que as que têm uma saúde mais débil, apresentam maior probabilidade de produzir estados de stress familiar que, em casos extremos, podem terminar em agressões.
Outros problemas de saúde como atrasos de desenvolvimento psicomotor, doenças crónicas graves (epilepsia, diabetes) potenciam possíveis situações de maus tratos/abusos, pois as famílias/ cuidadores podem sentir maior frustração, impotência, sentimento de fracasso, que também pode culminar em violência familiar mais ou menos grave.
Também as crianças com problemas de saúde mental, em acompanhamento Psicológico ou em Pedopsiquiatria podem, face à própria ansiedade
da situação de pandemia da COVID-19, revelar uma maior propensão para a irrequietude, turbulência, sono agitado, pesadelos, insónias e terrores noturnos.
Muitas vezes, também isso agrava a tensão familiar, desencadeando medidas repressivas ou castigos que podem facilmente evoluir para maus-tratos/abusos. Muitas vezes as famiílias/cuidadores tendem a justificar essas práticas, atribuindo a culpa à criança pelas birras, teimosia e agitação.
Os bebés, não conseguindo expressar em palavras a sua tristeza, medo, insegurança, desconforto e ansiedade, usam o choro para chamar a atenção dos pais/cuidadores. Alguns adultos «perdem a cabeça» com esse choro insistente e podem abaná-los violentamente, provocando graves lesões cerebrais e hemorragias que podem mesmo conduzir à morte do bebé.
Torna-se, pois, urgente e absolutamente necessário que todos possamos garantir o especial dever de proteção das nossas crianças e jovens.
O que fazer?
É muito importante que as crianças compreendam que, apesar de estarem em casa, continuam a ser protegidas por todos: familiares, vizinhos, amigos, professores e educadores, médicos, polícias, bombeiros, CPCJ, tribunal. Ninguém está longe deles, todos vamos continuar a lutar pelos seus direitos e pela sua proteção.
Às famílias maltratantes, esse especial dever de cuidado de toda a comunidade, vai mostrar que não podem usar a violência em casa, sem consequências, sem que ninguém se aperceba ou atue.
Vão perceber que agora, mais do que nunca, todos cuidamos de todos, especialmente de quem é mais vulnerável e indefeso.
É muito importante que os clubes, as salas de estudo, os amigos, os psicólogos, pedopsiquiatras, telefonem para as crianças e perguntem como estão, se precisam de alguma coisa, e que falem mesmo com eles de forma intermitente (liguem sem ter combinado o dia e a hora) e escutem atentamente, registem o que parece estranho, o que parece preocupante.
Todos somos poucos para proteger as nossas crianças!
Temos de construir uma corrente de proteção comunitária que mostre que o isolamento social não significa o isolamento na proteção.