Pandemia de COVID-19 não pode matar o Zoo de Lagos

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Zoo de Lagos Alberga 1200 animais de 150 espécies, com um custo mensal de 20 mil euros, só para a alimentação. O novo Coronavírus obrigou ao fecho de portas, perdendo, nos meses de março, abril e maio, entre outras, as visitas programadas de cerca de 6000 estudantes, que foram canceladas.

O conceito de jardim zoológico evoluiu. Deixaram de ser apenas montras para a exposição de animais exóticos e passaram a ser centros de conservação, investigação e educação. Hoje, são também centros de reprodução em cativeiro de espécimes em vias de extinção.

«Temos a decorrer vários programas de recuperação de espécies em perigo de extinção. São cerca de 60 espécies ao abrigo desta iniciativa, na qual temos um sucesso muito bom», começa por dizer ao barlavento Paulo Figueiras, fundador do Zoo de Lagos.

Paulo Figueiras.

Um caso interessante? Nasceu naquele parque, há dois anos, uma cria-macho de hipopótamo pigmeu, o Robert. Esta espécie está em risco, porque só aparece um macho em cada 10 nascimentos, em média. Havia dois anos que não nascia um macho em toda a Europa. Robert encontra-se agora em França, com uma fêmea, enquanto os pais permaneceram e a mãe está prenha de novo. Desde há muitos anos que vários supermercados de Lagos oferecem as frutas e legumes que não vendem.

Hoje, este apoio é fundamental para ajudar a suportar o encerramento forçado. Um funcionário do zoo tem o trabalho de recolher esses produtos, fazer a triagem e arrumá-los na cozinha. E há uma vasta variedade de alimentos, como insetos, carnes, peixes (os pinguins alimentam-se de uma espécie de peixe que vem congelado de França), específicos para algumas aves, como os flamingos, fenos, alimentos vivos (ratos e outros).

E ainda faltam os diferentes medicamentos. Está assim explicado e contabilizado o custo mensal de 20 mil euros apenas com a alimentação.

«A COVID-19 aconteceu, foi algo inesperado e não é fácil para ninguém. Mas temos uma estrutura que, para já, dá para nos irmos aguentando. E isto não será um problema eterno. Mas nesta altura, além dos animais, enfrentamos o problema do pessoal. Temos 26 pessoas a trabalhar e há salários a pagar no final do mês.

Se bem que, nesta fase, todo o pessoal que é dos serviços está em layoff, este não é um espaço onde se feche a porta e vamos embora porque está tudo bem. Temos cá os animais e por isso, precisamos dos tratadores. E também do pessoal da manutenção, porque todos os dias há reparações a fazer. Temos também uma pessoa no escritório, a tempo parcial» para ajudar com o expediente.

«Esperamos que esta situação não vá durar por muito mais tempo. De acordo com as conversas que temos tido com a Associação Portuguesa de Zoos e também com a Associação Europeia, há outros congéneres na Alemanha que já começaram a abrir e tudo indica que, dentro de duas semanas, possamos reabrir as portas. Mas continua a ser uma incógnita», admite Paulo Figueiras.

Mas mesmo quando voltar à normalidade e a funcionar em pleno, «sabemos que mais de 80 por cento dos visitantes do Zoo de Lagos são turistas estrangeiros e, enquanto as fronteiras estiverem fechadas, não há clientes. Também é esperada uma crise no turismo, no corrente ano, por várias razões, em que a crise económica que se adivinha e apregoa irá ter tanta ou mais influência do que as razões de saúde pública».

Por isso mesmo, a equipa do Zoo de Lagos não perde tempo e está a estudar estratégias que lhes permita sobreviver à crise.

Assim, foi lançada no dia 25 de abril, uma campanha de vendas online, através da BOL, que irá decorrer até 31 de maio e consiste em vender bilhetes a metade do preço e que podem ser usados até ao dia 31 de dezembro.

A bióloga que trabalha no zoo escreveu uma história de um pinguim que se perde no zoo e todos os animais vão ajudar a encontrá-lo. Uma ilustradora ofereceu os seus serviços, no sentido de ilustrar a história, e vão colocá-la online para venda.

Também a comercialização do cartão «Amigo do Zoo», que é de periodicidade anual, tem o custo de 45 euros para adulto e 30 euros para criança e permite entrar livremente o número de vezes que desejar, vai ser dinamizada. O apadrinhamento dos animais é outra fonte de receita a dinamizar.

«O último animal que deu entrada no zoo foi um tapir brasileiro. Este ano, investimos na entrada do parque. Foi construída uma imitação de uma caixa de transporte de animais e os utentes terão de passar por dentro dela para entrar», lembra Paulo Figueiras.

A terminar, perguntamos pelo seu projeto de construção de uma savana, anexa ao Zoo, que estava prevista abrir em 2023. «O novo Coronavírus e as suas consequências deverão atrasar a concretização, mas vamos terminá-lo», garante este empreendedor algarvio.

Zoo de Lagos: um sonho realizado

Paulo Figueiras, com a cooperação dos pais, abriu o zoo em 16 de novembro de 2000, ou seja, há quase 20 anos.

Foi a realização de um sonho antigo e não foi fácil. «Este projeto não é daquelas coisas em que vamos dormir e, no dia seguinte, acordamos e dizemos: vou abrir um jardim zoológico! É um processo de muitos anos que, no fundo, tem a ver com a minha paixão pelos animais, desde miúdo. O meu pai é militar de carreira, cresci em África, vivia numa casa pequena e a minha mãe não me permitia ter animais. Optei por ter peixes, porque os aquários não sujam tanto. Devo dizer que o meu gosto pelos animais nunca foi tanto o andar agarrado a eles, mas sim pela observação, estudando o seu comportamento».

Quando a família regressou a Portugal, decidiu usar o seu terreno com três hectares, entre Barão de São João e Bensafrim, no concelho de Lagos, como centro hípico, uma vez que cavalos e cães sempre foram paixões do empreendedor. Mais tarde, abriram o restaurante Cangalho, que ainda hoje tem excelente reputação.

«Mas eu olhava para o terreno e pensava que poderia fazer muito mais. O que eu gostava mesmo era de fazer um trabalho mais sério em termos de conservação de espécies, que é atualmente uma base do nosso trabalho», diz.

«Por isso, no Zoo, a nossa preocupação é o bem-estar dos animais e a reprodução das espécies. Construir o jardim zoológico foi um processo complicado, porque ninguém estava interessado ou acreditava no seu sucesso. Também os licenciamentos foram complicados, por desconhecimento ou falta de vontade da tutela. Paulo Figueiras só tinha animais domésticos e algumas raças exóticas de pombos.

Nessa altura, o Zoo de Lourosa fora vendido à Câmara Municipal, havia animais que iam sair e ele comprou alguns, algo que hoje já não acontece entre zoos. Já não se compra e vende animais. Veio um grupo de macacos capuchinho de Budapeste e alguns primatas de outros zoos. Algumas aves foram adquiridas a comerciantes. Começaram com poucas espécies, com um plano do parque, mostrando onde iriam ficar as diferentes espécies, mas nem todos os espaços se encontravam preenchidos. A maioria eram aves e primatas, que ainda hoje são base do Zoo de Lagos.

Pinguins africanos gostam do Algarve

Os pinguins que foram introduzidos no zoo de Lagos, nos finais de 2017, são africanos, não necessitam de gelo e dão-se bem no clima algarvio. São 30 adultos, que já fizeram criação no zoo. É um espaço com uma piscina/praia dividida por uma parede com janelas em vidro. De um lado, nadam as pessoas e no outro, os pinguins, podendo mirar-se uns aos outros, até debaixo de água. Neste momento, desconhecem-se as regras que irão ser impostas pelas autoridades de saúde para o seu uso pelos humanos.

Recuperação de espécies em risco

A Associação Europeia de Zoos coordena programas de reprodução em cativeiro de espécies em vias de extinção. Para cada uma, existe um coordenador, ligado a um determinado zoo, que tem todos os registos de toda a população.

É ele quem gere a população, de modo a que não haja falta ou excesso de animais. Tenta assegurar uma população sustentável e com variabilidade genética, de forma a devolver à Natureza, se houver essa necessidade. Há primatas em que, em determinadas alturas, são colocados implantes nas fêmeas para que não possam reproduzir e evitar excedentes.

O Zoo de Lagos recebeu, recentemente, dois casais de rolas de Socorro, espécie extinta na Natureza. A ilha de Socorro não era habitada e as rolas não tinham problemas. Foi ali instalada uma base militar, foram as esposas e o filhos, cães e gatos, e a espécie extinguiu-se. Só existem 500 animais, em cativeiro, mas já foram enviados exemplares para o habitat natural, no México, para tentar o repovoamento. Este é só um exemplo do trabalho que os zoos hoje fazem.