A pesca sempre fez parte do complexo imaginário e identitário do povo português, neste prosseguimento elevou-se a figura do Homem do Mar, quase ao nível daqueles que se lançaram na gesta dos Descobrimentos.
Perdoar-me-ão os historiadores do período, mas pretendo transmitir uma noção espiritual, aquela gênese que nos levou a deixar de temer o mar e não propriamente a escala do feito.
Com toda a certeza que estas são palavras de profunda beleza, que só por si serão suficientes para acalentar o espírito mais indómito e efervescer o sentido patriótico de qualquer um de nós.
Quem conhece, contudo, os pescadores e o seu modus operandi, sabe reconhecer no seu olhar uma generosa tranquilidade que brota da inconveniente incerteza da pesca, «uns dias mais, uns dias menos, desde que vá dando para a bucha», a dita humildade.
Esta incerteza, continua a fomentar o afastamento de muitos profissionais, uma vez que o pescador resoluto e determinado que se faz ao mar pela madrugada a dentro anseia pela captura e pelo valor em lota, não sendo permitida outra forma de escoamento do seu produto a não ser por contrato, mas nunca diretamente pela sua mão, no caso da pesca artesanal.
As políticas de pesca, ao longos dos anos procuraram e com relativo sucesso encurtar a distância entre o produtor e o consumidor, numa óptica de redução do circuito de transações afecto a este produto. No entanto, criou diversas discrepâncias a nível da primeira venda de pescado em Lota que influenciam a cadeia de valor.
Perante o momento de pandemia originária pelo novo Coronavírus, aquilo a que assiste é a uma progressiva quebra nos valores de venda do pescado em lota e no lamento de diversos armadores, mestres e pescadores que arriscam a sua vida e a das suas famílias para garantir o abastecimento de pescado fresco, fundamental a uma alimentação saudável, pela relevância económica e social que a pesca representa.
Desde do início dos primeiros casos de infeção em território nacional é do conhecimento geral, a ação das empresas de pesca, nomeadamente pequenas e médias empresas, muitas delas de núcleo familiar, pois nunca deixaram de ir ao mar, encarando a sua ação como um dever patriótico.
Mesmo assim em discursos de Estado, esquecidos pelo Presidente da República, numa primeira abordagem negados por Bruxelas e por fim, pela mão das associações do sector de norte a sul, finalmente relembrados por Marcelo Rebelo de Sousa e durante o dia de hoje, 16 de abril, a Assembleia Europeia está a votar uma proposta que visa atenuar o impacto do surto da COVID-19, e apoiar os pescadores pela cessação temporária das diversas fainas.
A pesca é uma atividade económica, difícil, perigosa, mas fundamentalmente vital à nossa sociedade e a todas as atividades económicas cujo o valor do seu produto ajuda a estimular, pois então quando os pescadores pedem ou precisam de ajuda, que não se pense duas vezes, que se atue, pois estes Homens do Mar merecem o nosso derradeiro respeito. Obrigado.
João Carlos Santos | Pescador de Quarteira