Greve Nacional por distritos chegou esta manhã a Faro, onde cerca de 1500 professores, educadores, pais e alunos se concentraram junto do Largo do Mercado. Adesão ultrapassou os 95 por cento na região.
Vieram um pouco de todo o Algarve com vontade de mostrar indignação e concentraram-se durante a manhã de hoje no Largo do Mercado Municipal de Faro. Muitos trouxeram bandeiras, cartazes, bombos, apitos e muitas mensagens dirigidas ao ministro da Educação João Costa, que acusam de teimar em não querer resolver os problemas de fundo da classe docente.
Aos jornalistas, Ana Simões, vice-presidente do Sindicato dos Professores da Zona Sul e coordenadora do distrito de Faro, referiu que a adesão à greve, a meio da manhã de hoje deveria rondar os 95 por cento em todo o Algarve.
«Podemos afirmar que há muitas escolas que estão completamente sem aulas, quer no pré-escolar, 1º ciclo, 2º e 3º ciclos e escolas secundárias e que a adesão à greve ronda 95 por cento no distrito», estimou.
Questionada sobre os motivos que continuam a mobilizar os professores para a rua, a dirigente sindical respondeu que «é a intransigência deste Ministério, deste ministro da Educação e do governo em não querer atender às muitas reivindicações que os professores têm há já muitos anos. Fala-se dos concursos e interessam muito disso depende a colocação de todos nós, mas há outras matérias que queremos negociar. As carreiras, a recuperação do tempo de serviço, o fim das quotas e das vagas, e o fim da precariedade».
«Os colegas contratados devem ter um salário, de acordo com o tempo de serviço, igual ao dos quadros», acrescentou. Também «a questão da aposentação. Os professores são os únicos funcionários da administração pública que não têm acesso à pré-reforma».
É também motivo de luta «o desgaste, a questão das condições de trabalho, os horários sobrecarregados, muitos dos quais irregulares e ilegais. É tudo isto que nos traz à rua para exigirmos respeito e negociação séria».
Ouvido pelos jornalistas, José Feliciano Costa, secretário-geral adjunto da Fenprof, lembrou que o ministro João Costa ficou «muito incomodado com os milhares de professores» que saíram à rua no dia 20 de janeiro.
«Mas depois no concreto, a proposta que apresentou, não vai ao encontro de nada. Aliás, aquilo é uma proposta que, nalguns pontos, até quase que dizia que parece que está a gozar connosco. Por exemplo, nos acessos ao 5º e 7º escalões, apresenta uma proposta para desbloquear vagas que é exatamente igual ao que está. Portanto, o senhor ministro tem de perceber que tem de ir para a negociação apresentar coisas que mudem. Porque para ficar tudo na mesma, não pode ser, os professores não vão admitir isso», garantiu.
Questionado sobre a adesão à greve, cujos números foram validados pela dirigente Ana Simões ao longo do protesto, «é capaz de ser superior a 95 por cento, o que é muito idêntico ao que tem acontecido por todo o país e o que vai acontecer até à última greve nacional por distritos, no dia 8 de fevereiro no Porto. E esperamos ter também milhares de professores na Avenida da Liberdade, no dia 11 de fevereiro. O ministro tem de ouvir», concluiu.
Também no uso da palavra, Paulo Dias da Federação Nacional de Educação (FNE) não poupou críticas ao governo atual a aquilo que têm sido as políticas dos últimos anos.
«Hoje vamos dizer aos senhores Costa, o António e o João, que basta! Exigimos valorização e não vamos parar até sermos ouvidos e respeitados. São quase duas décadas de cadência da escola pública e da carreira dos professores. Estes senhores Costa são os verdadeiros culpados da tentativa de destruição do património intelectual em Portugal».
Paulo Dias até simplificou uma solução rápida com uma viagem no tempo: «reponham tudo o que estava antes dos vossos colegas do Partido (Socialista), Sócrates e Maria de Lurdes Rodrigues. É tão simples como isso. Nessa altura, todo e qualquer professor chegava ao topo de carreira com 26 anos de serviço. Nessa altura havia mais uns largos milhares de professores nas escolas e o dinheiro chegava para pagar a todos. Havia menos burocracia nas escolas e os professores tinham tempo para ensinar. Nessa altura, havia um regime de aposentação justo. Nessa altura não faltavam funcionários nas escolas. Os professores tinham todos os mesmos direitos. Não haviam professores de primeira, a quem conta o tempo todo de carreira, e professores de segunda, a quem não querem contar o tempo de trabalho. Nessa altura, havia apenas um país, Portugal, e não havia o país Açores, o país Madeira, onde tem mais consideração, valorização e respeito pelos professores».
E mais. «Nessa altura também não havia indemnizações de meio milhão, nem tinham de ser os professores os sacrificados para ajudarem a tapar os buracos da TAP, do BES, do BANIF, do BPP, da CGD e tantos outros. Esses buracos não foram culpa dos professores, foram culpa dos senhores que já demonstraram que não têm competência para governar um país que, ano após ano, vai ficando no caule da Europa».
«No ano 2000, um professor em início de carreira ganhava cerca de três salários mínimos. Neste momento, ganha pouco mais que um. Este é o maior indicador daquilo que fizeram à carreira dos professores e em termos de desvalorização salarial», comparou.
Assim, há 23 anos, «havia excesso de professores com milhares à espera de uma vaga para poder exercer a sua paixão pela educação e com vocação. Sim, porque os professores portugueses trabalham por vocação com toda a dedicação, apesar de todas as dificuldades, sacrificando muitas vezes a sua vida pessoal e familiar. Não estão cá por nomeação nem por serem amigos ou filiados em qualquer partido».
Entretanto, «os senhores Costa e amigos conseguiram transformar o excesso de professores em défice de professores. Conseguiram ofuscar a atratividade da carreira e empurrar milhares de candidatos a professores, motivados para a docência, altamente qualificados, com licenciaturas, mestrados, doutoramentos, cursos de especialização e pós-graduações para outros trabalhos ou a emigrar».
Agora, «após constatarem que há falta de professores, pois foram incapazes de prever esta situação que há muito estava sinalizada pelos sindicatos e para a qual tinham sido alertados», conclui, sem deixar de expressar «o enorme orgulho com que estou aqui hoje no meio deste mar de verdadeiros guerreiros».
Por sua vez, Manuel Nobre, presidente do Sindicato de Professores da Zona Sul (SPZS), no uso da palavra e dirigindo-se às cerca de 1500 pessoas presentes, elogiou a iniciativa.
«Os professores no Algarve estão de parabéns porque estão a dar uma demonstração inequívoca ao governo daquilo que é a união e a força dos professores. Este está a ser um grande dia, uma grande greve, uma grande concentração. É importante que esta nossa determinação continue, porque desengane-se quem pense que amanhã os problemas se resolvem todos. Temos de continuar a insistir, a lutar, a dizer bem alto que exigimos respeito! Porque esta é uma luta que está para continuar. O governo quer passar a ideia de que está a negociar, de que está a procurar entendimentos, que as negociações estão a correr bem. Não queremos ir na cantiga do bandido», afirmou.
«Sabemos o que é que o governo quer dizer com isto, quer dizer que está a resumir, a afunilar a negociação aos concursos, não para resolver mas para passar a ideia que está em diálogo, ignorando e esquecendo e empurrando com a barriga os problemas de fundo que afetam a profissão: a precariedade, os horários de trabalho, a aposentação, as quotas, o tempo de serviço roubado, a municipalização da educação, o modelo de gestão, a mobilidade por doença. Tudo matérias que se têm arrastado há imensos anos e que os professores, finalmente, todos juntos vão exigir. E vamos ganhar esta luta, porque a razão está do nosso lado», argumentou Manuel Nobre.
«O problema não apareceu hoje. Tudo isto é fruto do desinvestimento na educação dos últimos 15 anos de vários governos que, ano após ano, foram cortando e reduzindo o financiamento. Temos neste momento, os valores do PIB mais baixos dos últimos 15 anos. O que é que isto quer dizer? Corte nos salários, bloqueios à progressão, desvalorização da profissão, os entraves à carreira e precariedade. Leva a que a profissão deixe de ser atrativa. Neste momento, no final de janeiro, ainda existem mais de 40 mil alunos sem um ou mais professores», contabilizou.
«O que temos a dizer é que exigimos respeito pela profissão, exigimos respeito pela escola pública e exigimos ao governo que venha ao diálogo, venha à negociação, venha enfrentar os problemas de frente, coisa que não tem feito, porque o que está em causa é o futuro da educação e o futuro de todos nós», concluiu Manuel Nobre.
Hoje foi o nono dia de greve, do conjunto de 18 com incidência distrital, convocada por ASPL, FENPROF, PRÓ-ORDEM, SEPLEU, SINAPE, SINDEP, SIPE e SPLIU, convocado nas escolas do distrito de Faro.
Após a concentração no Largo do Mercado Municipal de Faro, os docentes desfilaram até à Delegação Regional de Educação do Algarve, próximo do centro comercial Forum Algarve.