Droga apreendida na costa sul em dois meses já é igual ao total de 2022

  • Print Icon

A droga apreendida ao largo da costa sul em dois meses deste ano já é igual ao total de 2022. Autoridades pensam que «endurecimento» das lei em Espanha poderá contribuir para a desviar as rotas para Portugal.

Segundo confirmou aos jornalistas José Sousa Luís, relações públicas da Polícia Marítima e da Autoridade Marítima Nacional, «o número de eventos de narcotráfico nos últimos anos aumentou. Em 2020 foram oito, em 2021 foram 58, em 2022 foram 74 e em 2023 já vamos em 34 ocorrências.

«Isto são números nacionais, de toda a costa portuguesa, maioritariamente na costa sul. Em 2021, temos pouco mais de 5000 toneladas de estupefaciente apreendido, cinco embarcações de alta velocidade e três elementos detidos ou identificados», contabilizou.

Os números de 2022 registaram cerca de 16,5 toneladas de material estupefaciente (haxixe e cocaína) apreendido, 15 embarcações de alta velocidade apreendidas e detidas/identificadas seis pessoas.

Nos dois primeiros meses do ano em curso, «vamos quase com 16,5 toneladas. Já atingimos o valor material de estupefaciente, nestes dois meses, comparativamente com o ano de 2022».

Além disso, foram apreendidas «11 embarcações de alta velocidade e 23 pessoas identificadas/detidas, maioritariamente de nacionalidade espanhola ou marroquina, mas também há portugueses envolvidos. Estes números já incluem as últimas duas embarcações apreendidas».

Em 2021, segundo o oficial, em toda a União Europeia registaram-se 639 mil ocorrências e 613 mil toneladas apreendidas, com preços que oscilam entre os sete e os 12 euros a grama. Em Portugal, houve 2078 ocorrências e 15803 toneladas de material estupefaciente apreendido.

Os números foram divulgados à margem de uma iniciativa realizada no Cais Comercial de Faro, com a presença da ministra da Defesa Nacional, Helena Carreiras, e da ministra da Justiça, Catarina Sarmento e Castro, inserida na ação «Governo mais Próximo», na quarta-feira, dia 1 de março.

De acordo com José Sousa Luís, «o facto de nos primeiros dois meses já termos valores muito semelhantes ou iguais ao ano passado, poderá indicar um aumento do tráfico/fluxo de estupefacientes a passar ao largo da nossa costa», embora ainda seja «prematuro» afirmar essa conclusão.

«Como também reforçámos os meios, pode ser por isso» e as autoridades portuguesas sabem que «houve um endurecimento das leis no lado de Espanha em relação ao narcotráfico».

Ou seja, «as leis são menos brandas do lado espanhol. Uma lancha sem registo», como as utilizadas no tráfico de droga, «não pode estar atracada numa Marina».

«Tendo em conta que as coisas estão mais difíceis para os narcotraficantes no lado espanhol, é normal que naveguem mais umas milhas. Se a coisa não correr bem a nível legal, é melhor serem apanhados no lado português», opinou.

Em relação à mais recente operação, «não encontrámos droga dentro da embarcação». O que acontece depois é que os suspeitos «são chamados a comparecer perante um juiz para responderem ao porquê de estarem ali naquela hora. E vão-se embora. Não ficam detidos, são identificados. Isto não acontece do lado de Espanha. Uma lancha de alta potência sem registo, sem bandeira e sem material de pesca, o que é que está a fazer de madrugada a 80 milhas da costa? Presumo que em Espanha sejam detidos. Um narcotraficante sai de Marrocos, navega menos, mas vai para Espanha. Se a coisa correr menos bem, ao fazer mais umas milhas, mesmo que seja o dobro do caminho, no limite larga tudo e ninguém lhe pode dizer nada. Presta umas declarações, fica dois ou três dias detido à espera de juiz e depois fica em liberdade. A legislação em Espanha foi mais robustecida nesse sentido», exemplificou.

Por sua vez, Helena Carreiras, ministra da Defesa Nacional, considerou que o controlo costeiro e a cooperação entre as entidades está a funcionar bem.

«Estive aqui hoje com a ministra da Justiça e com todas estas entidades para conhecer detalhes e uma explicação daquilo que tem sido feito no combate ao narcotráfico no mar, numa colaboração entre a Força Aérea Portuguesa, a Marinha, a Autoridade Marítima Nacional e a Polícia Judiciária. Estamos a falar de um conjunto de operações concretas que tiveram resultados que conhecemos muito bem, de grande sucesso, na apreensão de droga e na identificação de atividades ilícitas que têm vindo a intensificar-se e que nos devem preocupar. Mas também ter confiança que estas instituições estão a conseguir fazer um trabalho muito meritório, protegendo-nos a todos mais», afirmou aos jornalistas.

Questionada sobre um eventual aumento de meios para acompanhar o acréscimo de tráfico ao largo da costa sul de Portugal, Carreiras respondeu que «temos que analisar o que vai acontecendo. Há uma forma muito criativa, por parte da Marinha, da Autoridade Marítima Nacional e da Força Aérea Portuguesa, em desenvolver meios e tecnologias que vão ajudar-nos neste combate. Estou em crer que com esse trabalho, essa criatividade e com a ajuda da inovação e das tecnologias, vão-se colmatar algumas necessidades que tenhamos de meios».

A ministra, contudo, mostrou-se preocupada com o aumento da agressividade dos traficantes. «Parece-me que é isso que temos assistido e deve preocupar-nos, evidentemente, mas creio que estamos preparados», concluiu.

Por sua vez, Catarina Semedo e Castro, ministra da Justiça, não quis comentar um eventual endurecer do quadro penal para este tipo de tráfico de estupefacientes por via marítima.

«Aquilo que temos assistido é um intensificar da atividade das várias áreas que estão envolvidas na intervenção e no combate ao narcotráfico nacional e internacional. Conseguimos ter bons resultados e o resto faz parte da separação de poderes. Somos um Estado de Direito. A legislação em si tem instrumentos necessários» para prender os traficantes.

«Aquilo que há a fazer é que nós desenvolvemos a nossa atividade e depois os tribunais exercerão a sua função. Em termos legislativos, não há aqui nenhuma necessidade suplementar».

Semedo e Castro também não quis fazer comparações com Espanha. «Não. O que temos que ter em conta é que são duas realidades diferentes. Estamos a falar de coisas diferentes. Uma coisa é a legislação penal, onde não há, de facto, necessidade de reforçar o código penal. Penso que estamos suficientemente apetrechados. Outra questão diversa é a legislação específica que se refere às lanchas. Em relação a isso, há, de facto, uma diferença no que foi a evolução legislativa» no país vizinho.

«Diz respeito a uma criminalidade organizada. Sucede que a Judiciária tem feito apreensões e tem encerrado algumas oficinas que tratam de construir essas lanchas em território nacional. No fundo, os espanhóis alteraram as autorizações legais. A legislação identifica quem pode utilizar, de forma mais restrita, estas lanchas. Ao fazer isto, de facto, afunilou a possibilidade» de as tornar disponíveis aos traficantes.

«Parece-me que é uma questão que deve ser trabalhada entre nós. Estamos com a Polícia Judiciária a ver quais as possibilidades, do ponto de vista jurídico, de afunilarmos e restringirmos o seu uso».