Nova praça multiusos, passadiços de praia, pavimento urbano, sombras e parque infantil são alguns dos melhoramentos implementados ao abrigo do Projeto de Intervenção e Requalificação (PIR) que os ministros Ana Paula Vitorino e João Pedro Matos Fernandes vieram conhecer. E trouxeram prendas para os culatrenses…
«A obra é o que se vê em termos de arranjo de espaço público: simples, minimal, bem feita, bem projetada e bem construída», elogiou João Pedro Matos Fernandes, Ministro do Ambiente e da Transição Energética, à sombra da nova praça central, na manhã de sexta-feira, dia 21 de junho.

O governante, que veio acompanhado pela homóloga com a pasta do Mar, Ana Paula Vitorino, referiu-se assim à forma como o Projeto de Intervenção e Requalificação (PIR) do Núcleo da Culatra está implementado.
Mas mais do que ver a obra, os governantes vieram trazer uma prenda há muito desejada por esta comunidade, «a atribuição de títulos a quem tem primeira habitação. Aquilo que queremos, e que provocou uma alteração à Lei da Água, é que nas áreas protegidas como esta, que é um parque natural, as atividades tradicionais se mantenham com condições de dignidade. Estas habitações, mesmo existindo há muito tempo e sendo em domínio público marítimo não tinham qualquer título e viviam numa absoluta precariedade. E aquilo que fizemos para os aglomerados consolidados com uma atividade socioambiental muito relevante, é a legalização destas casas. Temos neste momento 350 pedidos, dos quais 180 já estão despachados. Hoje vamos atribuir os primeiros 10 títulos a oito habitações e dois a equipamentos coletivos, acabando com uma situação que muito preocupava as pessoas. Este foi também um compromisso meu, que com muita honra venho cumprir, além de vir ver este espaço mais bonito e mais bem arranjado», explicou o Ministro do Ambiente aos jornalistas.

Por sua vez, falou Ana Paula Vitorino, emocionada, e perante os muitos culatrenses que se juntaram para ver e ouvir os ministros.
«Culatrenses, de facto já partilhámos bons momentos em conjunto, mas nenhum como este. É o melhor em que já participei. Muito agradeço, como cidadã, a todos os ministérios que participaram nisto. Desde a primeira hora, como sabem, estou do vosso lado, estou do lado de quem defende as suas casas e o direito pleno à cidadania».
A ministra anunciou que o próximo compromisso será «instalar uma escola azul, da rede que tem reconhecimento da UNESCO e da Comissão Europeia. Para que as crianças e jovens que aqui estudam possam ter uma base da tradição dos seus pais e dos seus avós, e também o conhecimento da importância da sustentabilidade e do respeito pelo nosso território. Fica prometido».

Já Rogério Bacalhau, presidente da Câmara Municipal de Faro, considerou que «a requalificação do espaço público que agora estreamos é uma conquista que há muito era desejada por quem aqui vive. Devemos mostrar gratidão à (Sociedade) Polis pela obra, e à tutela que a financiou, no âmbito do PIR, pois o avanço que representa é extraordinário para a qualidade de vida destes cidadãos farenses. A deslocação de pessoas, bens e mercadorias na ilha torna-se agora mais fácil, mais confortável, mais rápida e mais segura, graças a esta requalificação».
No entanto, no seu discurso, o autarca de Faro, não se mostrou entusiasmado com a atribuição dos títulos de utilização dominial.

«Após as minhas palavras, o Estado Português vai também entregar títulos de residência a moradores da Ilha da Culatra. Não se trata, em bom rigor, da solução que a Câmara vinha defendendo – que assenta na municipalização do território, como acontece em locais bem próximos e com circunstâncias tão similares», sublinhou.
«Mas isso não tira mérito a esta solução. Estas licenças vêm consubstanciar a consagração do direito à habitação na ilha e, ainda, a observação do preceito segundo o qual são as comunidades que fazem os territórios e que estes de pouco valem se não houver uma saudável interação entre as pessoas e a terra. É isso que está a acontecer aqui, já há 200 anos, quando os primeiros pescadores para aqui vieram e começaram a construir as suas famílias. E foi isso que aconteceu em 1987, quando o povo da Culatra decidiu mudar o seu destino, através de um ato de coragem cívica que figurará para sempre em todos os compêndios da história local. E em resultado, onde antes era só areia e dificuldades, vislumbramos hoje uma comunidade sedimentada, bem alicerçada em costumes e numa economia ligada ao mar e em respeito pela preservação do ambiente», concluiu Rogério Bacalhau.

A resposta veio pela voz do Ministro do Ambiente. «Não consigo deixar de dizer bem de nós próprios, pois foi preciso mudar a lei para chegar aqui. Que outros o tenham dito, certamente que teriam boas intenções, mas esqueceram-se de algumas coisas. E de facto quem promoveu essas coisas em falta fomos mesmo nós», disse.
No encerramento da cerimónia, João Matos Fernandes, até parafraseou Fernando Pessoa. «Saio daqui com o coração cheio e a consciência do dever cumprido. Deus quer, o homem sonha e a obra… faz-se. Nisso, o poeta enganou-se. A obra não nasce. A obra faz-se, com muito trabalho e em prol de quem a merece, neste caso, os culatrenses».

«Um passo gigante» para os culatrenses
Ouvida pelos jornalistas, Sílvia Padinha, presidente da Associação de Moradores da Ilha da Culatra (AMIC), considerou a sexta-feira, 21 de junho, «um dia histórico. É reconhecido à população que tem mais de 150 anos de ocupação, por questões de sobrevivência, o direito a viver num espaço que é de todos, mas que também é nosso e que temos cuidado com todo o carinho. Agora, além do direito que adquirimos, temos muitos deveres também para tratar deste meio com cuidado».
Apesar de os Ministros do Ambiente e do Mar apenas terem trazido títulos de utilização dominial por um período de 30 anos para oito famílias e dois espaços coletivos, a dirigente tem esperança de ver todo o aglomerado legalizado em breve.

«Os 350 pedidos foram todos feitos na mesma altura e o processo terminou no final de abril. Todos conseguiram submeter, dentro do prazo estipulado, o pedido para reconhecimento da habitação. Ainda não houve recusas. Estamos a acompanhar, a par e passo, queremos que se faça justiça», disse, otimista.
Este é «um primeiro passo, um reconhecimento de que as populações locais fazem parte do meio. Antes eram tratadas como intrusos, neste momento estão a ser incluídas, de forma a preservar e a defender o meio onde vivem. Isso para nós é um passo gigante».

Lar é obra urgente
Ouvida pelos jornalistas, Sílvia Padinha, presidente da Associação de Moradores da Ilha da Culatra (AMIC), explicou que o mais urgente agora é a construção de um lar residencial. «Atualmente, a doença do século XXI que está a atacar os culatrenses e não só, é o Alzheimer. Os nossos avós, têm de ser entregues num lar em Olhão porque não temos condições de os ter cá. Nos últimos cinco anos, neste universo de 350 famílias, temos 10 casos de pessoas que têm de ser entregues a um lar porque as famílias não têm condições para os ter em casa. É um sentimento que não estávamos habituados e que estamos agora a lidar», disse.

O primeiro passo já foi dado com a a licença atribuída na sexta-feira, dia 21 de junho.
«O Centro Social tinha um projeto, mas não podia avançar com a obra, porque não tinha a titularidade do espaço. Hoje, com a titularidade, pode pedir financiamento para avançar» que deverá custar cerca de 500 mil euros.
Culatra 2030, rumo à autossuficiência energética
Em declarações aos jornalistas a Ministra do Mar Ana Paula Vitorino disse que «talvez em todo o país» o projeto Culatra 2030, seja «o mais interessante que conheço pela luta por um território sustentável».
A governante manifestou a disponibilidade da sua tutela em apoiar medidas que se enquadrem na Agenda para a Transição Energética do governo.
«Temos vários programas que podem apoiar. No que diz respeito ao Ministério do Mar, considerando que esta é uma comunidade costeira e piscatória, onde temos a possibilidade de apoiar em matéria de inovação tecnológica e inovação energética, através do Mar2020 para a área da pesca e da aquacultura e para projetos específicos ao nível das embarcações» elétricas. A comitiva teve aliás, a oportunidade de viajar no novo catamarã elétrico CAT12.0, fabricado em Olhão.

«Temos muito orgulho em ter empresas como a SunConcept que fez a embarcação que nos trouxe aqui, sem gasóleo, nem ruído, sem prejudicar os ecossistemas e sobretudo as comunidades de cavalos-marinhos» disse a ministra, que gostaria de ver, num futuro breve, uma carreira regular de transporte de passageiros entre as ilhas-barreira 100 por cento elétrica. Uma visão corroborada por Sílvia Padinha, presidente da Associação de Moradores da Ilha da Culatra (AMIC).
«Até 2030 temos uma missão de transição energética, de transformar a Culatra numa ilha sustentável que, possa servir de exemplo a outros. A comunidade e a população estão de braços abertos. Primeiro precisamos de saber como se faz e quais os hábitos que temos de mudar. Neste momento estamos a avançar com um diagnóstico participativo em que, a comunidade está a ser ouvida para podermos definir a estratégia», detalhou.

«Queremos, por exemplo, ter uma escola autónoma a nível energético. Começar com as casas de habitação, uma vez que vamos ter de alterar os telhados devido à questão do amianto. Podemos substituir por telha fotovoltaica, por exemplo. Mas queremos mais, queremos que a legislação permita que todos aqueles que têm possibilidade de fazer essa transição mais rápida, possam ajudar aqueles que não a tenham. Trabalhar em rede e partilhar os recursos», explicou a dirigente aos jornalistas na sexta-feira, dia 21 de junho.
Culatra cresceu três quilómetros em 70 anos
Apesar de estudos recentes darem conta que o futuro não é risonho para as comunidades costeiras, uma vez que se prevê a subida do nível médio da água do mar, em cerca de um metro, o que coloca em risco comunidades como esta, Sílvia Padinha, presidente da Associação de Moradores da Ilha da Culatra (AMIC), desvaloriza o prognóstico.

«Esta comunidade está numa zona de Parque Natural da Ria Formosa, numa ilha-barreira, que tem vindo a aumentar, ao contrário de outros locais. A barra Faro – Olhão vai trazendo os sedimentos de poente para nascente, o que faz com que a Culatra tenha crescido nos últimos 70 anos, em cerca de três quilómetros. Isso não quer dizer também que, a preocupação não seja tida em consideração. Essa é uma preocupação não só da Culatra, mas do mundo inteiro. Se fizermos todos alguma coisa e, se fizermos todos algo pela mudança, não boicotará o nosso futuro. O ser humano é o único que tem essa capacidade. Por alguma razão, os pescadores escolheram a Culatra para se fixarem há 150 anos. É a zona mais estável das ilhas barreiras da Ria Formosa. Essa será uma medida a longo prazo. Todo o litoral terá de repensar quais são as medidas necessárias. Deveríamos olhar para as soluções apresentadas e a curto prazo começar a implementá-las».