Agricultores e cidadãos organizam uma marcha de protesto amanhã em protesto pela cedência das instalações do Centro de Experimentação Agrária de Tavira (CEAT) a «entidades sem qualquer ligação direta à agricultura».
O «Centro de Experimentação Agrária de Tavira também é dos Agricultores» é o mote do protesto marcado para amanhã, dia 03 de dezembro, às 16 horas, com início frente à Câmara Municipal de Tavira e fim frente aquele equipamento tutelado pelo Ministério da Agricultura (junto à estação de comboios).
O que está em causa é sobretudo a cedência de infraestruturas de apoio no CEAT, «espaço público do Estado português o ABC – Algarve Biomedical Center, consórcio formado pelo Centro Hospitalar e Universitário do Algarve (CHUA) com a Universidade do Algarve (UAlg), neste caso para a criação de «um Centro de Terapêuticas Digitais para o Envelhecimento e Para a Doença, em parceria com a Universidade Johns Hopkins, por via de jogos da Marvel e Disney».
Para a organização do protesto, a cargo do Movimento de Cidadãos pelo CEAT e Hortas Urbanas de Tavira, está a «potencial adulteração do conceito de centro agrário e deturpação do propósito histórico para o qual foi desenvolvido este espaço que conta com 95 anos de existência».
O movimento exige que «a Delegação do Sotavento da Direção Regional de Agricultura e Pescas (DRAP) do Algarve apoie e sirva os agricultores os quais são justamente os garantes da segurança alimentar e da produção dos produtos que alicerçam os valores e princípios da apregoada Dieta Mediterrânica, dos agroecossistemas mediterrâneos, da alimentação sustentável, assim como os objetivos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS)» da Agenda 203 das Nações Unidas.
«Para já, os agricultores ficaram sem casa. O atual plano para um novo Polo de Inovação para a Alimentação Sustentável (Terra Futura) privilegia, na prática, com infraestruturas e equipamentos, todo o tipo de entidades, atividades e interesses. Tudo menos os interesses dos agricultores e de uma agricultura sustentável, preservadora da biodiversidade e produtora de alimento justo».
Na sessão de dia 24 de novembro de 2021, que serviu para apresentar a nova arquitetura do futuro Polo de Inovação de Tavira, «foi tudo muito bonito, não há lugar naquela que deveria ser a casa dos agricultores. O edificado que é historicamente para a formação dos agricultores passa para agora para o ABC – Algarve Biomedical Center, e porventura o restante espaço será entregue a outras entidades sem qualquer ligação direta à agricultura, não tendo sido dada nem uma palavra para a formação e para estruturas de suporte às atividades de agricultores», lamenta o movimento.
«Ficamos ainda a saber que a antiga estação agrária de Tavira vai receber um campus ligado à Dieta Mediterrânica, mais um Centro Digital de Bem-estar e Cuidado no Envelhecimento. Através de um protocolo assinado entre o ABC – Algarve Biomedical Center, a autarquia tavirense e a Direção Regional de Agricultura e Pescas do Algarve, atribuem a essa clínica o edifício que sempre serviu para dar formação aos agricultores».
Um edifício que foi «sempre o local da formação dos agricultores, porque tem condições e está vocacionado para tal: tem cantina, sala de convívio, quartos para alojamento, 30 hectares de terra para praticar. Nele se realizaram cursos de tratoragem, de podas, jornadas, intercâmbios, concursos, convívios e trocas de experiências».
Por outro lado, segundo o que está explícito na «Terra Futura» – Agenda de Inovação para a Agricultura. «o polo de alimentação saudável de Tavira é o único polo não agrícola do país. Supomos que na sequência de decisão unilateral de Lisboa que pretende continuar a olhar o território algarvio como um grande resort turístico».
Denote-se que «também o Algarve não possui polo regional do do Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária (INIAV) nem tem recursos de investigação suficientes no curso de agronomia da Universidade do Algarve aos quais os agricultores possam recorrer apesar de conter inúmeras tradições agrícolas centenárias e nichos de mercado específicos dadas as suas condições climatéricas».
Em comunicado, o movimento questiona, que ao contrário do sucedido noutros polos de inovação, «no Algarve existiram zero processos de auscultação pública nem o envolvimento da população e produtores. Na prática, as decisões de utilização do espaço foram centralizadas e desviou-se para a nutrição e gerontologia os parcos recursos dedicados ao desenvolvimento do sector de pequena agricultura e agricultura agroecológica».
Em Tavira, «a valorização e o preço da terra subiu de 100 por cento no espaço de dois anos e 2400 por cento no espaço de uma década. Dados do último recenseamento agrícola indicam que há menos 15 mil explorações ativas apesar do aumento da superfície agrícola útil. Ou seja, perderam-se pequenos e médios agricultores, mas as áreas de agricultura intensiva de sobreexploração e o interesse dos investidores, principalmente estrangeiros, sequiosos de recursos globalmente escassos como solo, água e clima não para de aumentar».
Ora «para que exista a produção de alimentos em pequena escala e multiproduto, para garantir a tão propalada segurança alimentar, tem que se criar condições para que os agricultores produzam, ou sequer existam. Um dos maiores problemas na agricultura atual é o da formação e da existência de pessoal que saiba trabalhar na agricultura. A alimentação sustentável é alicerçada em quem? Com produtos variados de onde? Quem é que sabe trabalhar hoje em dia para produzir a alimentação apregoada? O CEAT transformou-se de centro agrário em centro de alimentação? E essa alimentação é proveniente de quem? E como é que é produzida?», questiona o movimento.
«Talvez a primeira ideia que se deveria ter equacionado projetar para aquele espaço fosse a criação de um polo de formação profissional (género escola agrícola) ou ainda um politécnico (género escola superior agrária) onde houvesse ao mesmo tempo serviços de apoio aos agricultores da região. É inadmissível Tavira estar tão afastada da formação dos jovens e do apoio aos agricultores, tomando em linha de conta a importância estratégica que já teve no passado, ao nível da região do Algarve, e das infraestruturas que o CEAT possui direcionadas para investigação, apoio e preservação de património agrícola, mas também tendo em linha de conta o presente atual e um futuro a longo prazo».
«Defendemos a existência do Centro de Dieta Mediterrânea. Mas não podemos aceitar que, num centro de formação e experimentação agrária uma das primeiras ações a cumprir seja dar o edifício dedicado à formação dos agricultores (não só de Tavira, mas da região e até do país), e outros edifícios, a diversas entidades. Se o Movimento de Cidadãos em Defesa do CEAT conseguiu travar a estrada para ali proposta pela Câmara Municipal de Tavira, também irá conseguir o seu objetivo principal, a revitalização do CEAT como Centro de Experimentação Agrária», conclui o comunicado.