Algarve valerá 5 por cento do PIB em 2020 prevê Francisco Serra

  • Print Icon

Presidente da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR) do Algarve, a propósito do Dia da Europa, que se celebra a 9 de maio, revela que a região não ficará sem fundos comunitários e explica os objetivos do próximo quadro 2030.

barlavento: O que é que a Europa mudou no Algarve?
Francisco Serra:
Podemos fazer uma reflexão ou uma avaliação do que tem sido o desenvolvimento, a mudança, e de que maneira é que se relacionam. Quando falamos dos impactos dos fundos estruturais, o Algarve tem evoluído no que se refere ao povoamento, ao aglomerado e organização urbana, bem como às pressões que se exercem do litoral para o interior e do interior para o litoral. Pode dizer-se que mudou muito desde os anos 1970. Mudou em relação à população abrangida pelo abastecimento de água, o saneamento básico, ao parque escolar, à universidade e a outras infraestruturas. Também mudou muito no ponto de vista das debilidades sócio-económicas. As bolsas de pobreza que eram características de algumas localidades desapareceram ou foram diluídas na malha urbana existente. Por outro lado, continuam a existir problemas de precariedade laboral, e de uma sazonalidade associada à atividade principal, que é o turismo. Enquanto não houver a capacidade de mudar completamente, ou de, transformar grandemente o tecido económico, no sentido de outros sectores de aposta crescerem a um nível que podem competir, será difícil reverter.

Portanto, a avaliação é positiva…
Os valores que têm sido investidos pela União Europeia, através de fundos comunitários, apesar de serem capitais fixos que alavancaram investimentos, não têm uma relação direta. Olhando hoje para a situação, vemos que o Algarve tem crescido acima da média do país, em termos de Produto Interno Bruto (PIB), desde 2001, à exceção de 2010. O Algarve era uma região de 3,5 por cento está hoje nos 4,7 por cento do PIB nacional. Temos objetivos contratualizados com a União Europeia para atingir os 4,9 por cento do PIB, em 2020. As perspetivas, segundo os dados definitivos de 2017 e previsões nossas de 2018, fazem crer que facilmente chegaremos aos 4,9 por cento em 2020. Provavelmente chegaremos até aos 5 por cento. O que significa que o Algarve tem tido capacidade para alavancar desenvolvimento, tendo, com certeza fragilidades estruturais.

Que fragilidades são essas?
O Algarve é uma região, que pela sua especialização económica é mais sensível que o resto do país. Em tempos de crise, nós afundamos mais rapidamente. Mas também, em tempos de retoma, recuperamos mais rápido, em termos de emprego e de crescimento. O que aqui se vê é que há uma relação, que embora não esteja estudada do ponto de vista técnico-científico que uma análise mais rigorosa exigiria, é, que, do ponto de vista analítico, o turismo, pelas suas características, tem uma importância fundamental. Por outro lado, apesar de tudo, há também aqui uma evolução. Enquanto nos anos 1960/70 o Algarve sofria um efeito de aculturação de uma forma mais profunda, hoje, pelo facto de pertencermos à União Europeia, da circulação ser muito mais livre, das culturas estarem mais inter-relacionadas e da comunicação ser mais fácil, já não se constata um efeito de aculturação tão forte como no passado. Eu diria mesmo, que é quase inexistente no que se refere aos estilos de vida, às formas de pensar e até aos consumos, em comparação a outros países da Europa. Portanto, diria que temos hoje uma região medianamente desenvolvida dentro daquilo que são os padrões europeus e que o dinamismo regional é pujante em relação às atividades do país. O que nós não temos conseguido, e isso é também um debate do presente e do futuro, é uma diversificação das atividades económicas e até do tecido social, consentânea com o que eu chamaria de boas práticas de gestão.

Não é esse o objetivo de todos estes financiamentos e de todos estes quadros que temos recebido?
Exatamente. Cada quadro comunitário tem tido as suas características marcantes. Neste quadro comunitário (2020) optou-se por elaborar uma estratégia de especialização inteligente, de modo a selecionar um conjunto de sectores que pela sua preponderância, ou pela sua potencialidade foram incentivados. O que constatamos? Por um lado, que os sectores consolidados como o turismo e o mar podem ainda ser objeto de apoio, mas numa lógica de diversificação e inovação. Já os sectores de consolidação para crescimento e desenvolvimento alternativo, como o agroalimentar, as indústrias criativas e culturais, das questões da tecnologia e do conhecimento, são apoiadas através dos sistemas de incentivo às empresas. E ao mesmo tempo, também são apoiadas outras dimensões, como a questão da reabilitação urbana e a valorização do património natural e cultural, que diz respeito à intervenção pública.

E o que é que não foi privilegiado neste quadro comunitário?

Os investimentos em grandes infraestruturas pesadas. Não estão priorizadas a nível regional, mas existem os programas temáticos como o POSEUR, que continuam a apoiar essas infraestruturas e as regiões. São fundos de gestão de âmbito nacional.

A mobilidade continua a ser um dos nossos principais problemas…
Continua a ser um dos nossos problemas, no sentido de que os sistemas de transportes estão adaptados à estrutura geográfica da região e aos aglomerados populacionais de maior densidade. À AMAL – Comunidade Intermunicipal do Algarve foi atribuída a competência para fazer a gestão metropolitana dos transportes rodoviários. A articulação, por um lado, pode ser sempre melhorada. Mas há uma necessidade que é muito específica. Por exemplo, as unidades hoteleiras que se situam ao longo da costa, nem todas estão articuladas com os principais aglomerados urbanos, onde está estruturado o transporte terrestre e ferroviário. O que coloca dificuldades na gestão da mobilidade vertical, do litoral para o interior e do interior para o litoral.

Quando é que vamos resolver isto?
Se resolvermos esse problema com base na subsidiação dos transportes, temos de ter orçamento público para os operadores irem aos sítios onde não há massa crítica. As Câmaras Municipais, por exemplo, têm muitos transportes que vão às freguesias, aos povoados e que, de alguma maneira, tentam minimizar o impacto negativo que é produzido pela não oferta de carreiras regulares. Mas, o transporte regular de passageiros, na lógica dos operadores privados – e não estou a defender esse ponto de vista – não permite que existam carreiras com uma frequência como vemos nos circuitos urbanos. Por outro lado, nos circuitos urbanos, apesar de existirem também transportes de gestão municipal, também se constatam constrangimentos que se tendem em não resolver. Por exemplo, a Associação de Estudantes da Universidade do Algarve reclama por mais transportes em horas de ponta e até têm feito propostas concretas. Temos um problema que é da própria configuração geográfica do território, da estruturação das metrópoles urbanas ou dos aglomerados urbanos, e depois da dispersão que existe ao nível do mais do barrocal interior. Quanto mais para o interior caminhamos, mais difícil é assegurar uma regularidade que permita a pessoas que vivam num raio de 40 quilómetros do litoral, deslocarem-se atempadamente para os seus locais de trabalho, se os têm no litoral. Na minha perspetiva, haverá sempre aqui quase uma percentagem de ineficiência ou dificuldade que dificilmente se conseguirá ultrapassar.

«Temos objetivos contratualizados com a União Europeia para atingir os 4,9 por cento do PIB, em 2020. As perspetivas, segundo os dados definitivos de 2017 e previsões nossas de 2018, fazem crer que facilmente chegaremos aos 4,9 por cento em 2020. Provavelmente chegaremos até aos 5 por cento. O que significa que o Algarve tem tido capacidade para alavancar desenvolvimento, tendo, com certeza fragilidades estruturais».

Mesmo com estas medidas dos passes mais acessíveis?
Os passes mais acessíveis podem ser e deverão ser, pois o objetivo público é esse, um incentivo ao uso do transporte público, em detrimento do transporte particular. Caminhar para uma economia mais neutral em emissões poluentes é o objetivo central de toda a humanidade neste momento. Em todo o caso, também, essas medidas têm sempre a tal barreira a partir da qual não são eficazes. Não me serve a mim, de grande coisa, ter um passe mais barato, se efetivamente não há carreiras regulares de transportes públicos. Diz-se que o Algarve não pode ficar fora dos fundos europeus. Esse cenário está, ou alguma vez esteve, em cima da mesa? O que se perspetiva é que o Algarve, como outras regiões da Europa, vai continuar a ter fundos comunitários no futuro, além dos que já tem hoje assegurados. Neste programa quadro, a região conta com 318 milhões de euros de fundos comunitários geridos regionalmente pelo PO Algarve. Além desses, conta com mais fundos do MAR2020 e do PDR2020, que são geridos por autoridades diferentes que não o PO Algarve, mas têm incidência na região, mais os programas nacionais a que o Algarve também se pode candidatar. No global, desde que aderimos à desde que aderimos à Europa, só em 2000/06, é que o Algarve teve mais de 1000 milhões de euros de fundos regionalizados. Foi na altura das grandes infraestruturas. Neste quadro, de 2014/2020, temos 318 milhões e no anterior tínhamos, mais ou menos, o mesmo. No atual éramos para ter menos apoios, uma vez que o valor rondava os 214 milhões. Conseguiu-se fazer uma negociação, ir buscar o valor do fundo coesão e regionalizá-lo. Deste modo, o Algarve passou a contar com um valor idêntico ao que tinha no programa 2007-2013 (QREN). No próximo programa quadro, há com certeza fundos comunitários para o Algarve. A afirmação que no futuro, o Algarve vai ficar fora dos fundos comunitários, é falsa.

Mas há esse perigo?
Se houvesse o perigo de ficar de fora, podíamos entender que precisávamos de mobilizar energias para reivindicar que isso não acontecesse. Não sou futurologista, mas a União Europeia é uma entidade que temos como idónea. As negociações e as aprovações que já foram feitas no Parlamento Europeu, os dados da Comissão, e tudo aquilo que está a ser preparado para o próximo programa quadro 2020-2027, vai haver fundos. O Algarve não pode ficar de fora dos fundos comunitários do próximo programa quadro. Não estou é a temer que isso aconteça, compreende? Tenho a firme convicção, para não dizer a certeza, de que não vai ficar de fora, porque toda a programação que está a ser feita indica que o Algarve vai continuar a ter fundos comunitários, na proporção, ou na condição, de que vai continuar a ser sim uma região em transição (phasing out). Portanto, não vai ter o mesmo nível de apoios que têm outras regiões de convergência, como o Alentejo, o centro e o norte. O Algarve, por força das dinâmicas que já aqui falámos, não só manteve a sua quota de 75 por cento da riqueza média da União Europeia, como aumentou para cerca de 83 por cento. Claro que há pessoas que afirmam que isto é tendencioso, que é falso, que o Algarve afinal não tem assim tanta riqueza.

Muitos concordarão com esses argumentos…
Não só como cidadão, mas como responsável público, gostaria que o Algarve tivesse outro nível de apoios. Não quer dizer que eu concorde que o Algarve deveria ser mais pobre para poder receber mais. Se a minha economia tem um efeito de produção, que se está a aproximar dos 5 por cento do PIB, então, é normal que eu considere que é positivo e que sendo assim, a nossa capacidade de crescer tem mais razão em sustentação interna, do que dependência dos fundos europeus para esse efeito. Não quero dizer que esteja satisfeito com a situação. A constatação é que sendo nós avaliados com base nos mesmos parâmetros que outras regiões da Europa, nós não regredimos para uma situação de carência. Pelo contrário, progredimos no índice de aproximação à média europeia de riqueza per capita. Por isso é que a União Europeia nos vai manter nos quadros das regiões em transição. O que é certo é que a União Europeia vai destinar, no próximo quadro comunitário, uma percentagem maior de apoio para as regiões em transição. Então não estamos assim numa posição tão desfavorável… Não sei se dessa alteração de financiamento para as regiões em transição, vai resultar mais dinheiro para o Algarve, ou não. Isso depende do equilíbrio que se estabelecer ao nível das regiões europeias. Eu não sei se no total vai haver mais regiões em transição, ou se, pelo outro lado, vai haver menos regiões em transição e disso resulte em mais fundos para o Algarve. É possível que aconteça uma destas situações. Agora, nunca vai ser uma hecatombe. Nunca vai ser uma coisa de passar de 318 milhões para 30 ou 40 milhões.

Então não estamos assim numa posição tão desfavorável…
Não sei se dessa alteração de financiamento para as regiões em transição, vai resultar mais dinheiro para o Algarve, ou não. Isso depende do equilíbrio que se estabelecer ao nível das regiões europeias. Eu não sei se no total vai haver mais regiões em transição, ou se, pelo outro lado, vai haver menos regiões em transição e disso resulte em mais fundos para o Algarve. É possível que aconteça uma destas situações. Agora, nunca vai ser uma hecatombe. Nunca vai ser uma coisa de passar de 318 milhões para 30 ou 40 milhões. Que objetivos para 2030? A União Europeia coloca cinco objetivos políticos. O primeiro é uma Europa mais inteligente. Vamos no caminho da especialização inteligente, do privilegiar a economia do conhecimento e inovação. O segundo é uma Europa mais ecológica e de baixo carbono, que poderá significar mais apoio para as políticas de descarbonização da economia. Num primeiro momento determinadas atividades exigentes em consumo de combustíveis fósseis, ou de energias que não sejam renováveis, poderão até ser objeto de menos apoio, em detrimento de outras. A economia mais ecológica e de baixo carbono significa a eficiência energética, a economia circular, a adaptação climática e a gestão de riscos.

Vamos ter que repensar a região e o que queremos?
Neste quadro comunitário já temos a funcionar o Conselho de Inovação Regional, aqui na CCDR, relacionado com o PO Algarve. Temos grupos de trabalho constituídos numa série de áreas como turismo, industrias criativas e culturais, agro-alimentares, energias, mar, e cada um destes grupos de trabalho está debruçado sobre este tipo de problemáticas. Temos a própria agenda regional de economia circular, que somos nós CCDR a dinamizar. Muitas vão dar origem a novas iniciativas empresariais, desde que os empresários também estejam disponíveis para as abraçar. Depois, há o objetivo três, uma Europa mais conectada, que tem a ver com as questões da mobilidade e da conetividade.

Isso é uma boa notícia para o Algarve…
Eu acho que os objetivos que a União Europeia estabeleceu para o próximo programa quadro são perfeitamente adaptados àquilo que nós podemos ambicionar para o Algarve. Nós podemos ambicionar outras coisas, mas penso que estes cinco objetivos sintetizam muito bem os grandes desafios civilizacionais do nosso tempo. O quarto objetivo fala de uma Europa mais social, uma Europa mais próxima dos cidadãos. Todos nós sabemos que esta ideia da Europa mais próxima dos cidadãos esbarra com muitos obstáculos também.

Saímos agora de um ciclo positivo. Que perspetiva para o futuro?
s fundos europeus são apenas uma parte do que podemos perspetivar em termos de capacidade da região para investir. Se continuarmos numa trajetória de crescimento económico favorável, o próximo programa quadro, desde que perspetivado com base nas prioridades políticas que a UE nos propõe e que nós já trabalhámos internamente junto da população e entidades interessadas, trará um desenvolvimento do Algarve de forma sustentada. Em linha com o que tem acontecido nos últimos anos. A não ser que haja crises externas, que são impossíveis de prever. Mas se as coisas continuarem na linha dos últimos quatro ou cinco anos, se o próximo programa quadro vier com um pacote financeiro semelhante ao que temos hoje, será percursor de muito investimento para o qual já temos intenções em carteira.

Que intenções são essas?
São em várias áreas, de investidores privados. Abrangem a área das iniciativas sobre energias renováveis, do turismo mais ecológico, de novos produtos e ofertas. Isto relacionado ainda com atividades que combatem a sazonalidade, o turismo de saúde, entre outras. Temos condições para alavancar um desenvolvimento mais equilibrado e que venha a ser mais assente na economia do conhecimento, na tecnologia, nas energias limpas, e nas indústrias do conhecimento que são por tradição limpas. O que é certo é que é inevitável que o turismo continue a ser o driver, porque os processos de transformação não se dão de um dia para o outro. Portanto, estamos a fazer um esforço para complementar as atividades turísticas com outras atividades económicas que tenham valor acrescentado e que sejam respeitadoras do ambiente. O respeito pelo ambiente é muito favorável para os novos negócios, até mesmo na área do turismo, e do imobiliário se estes aparecerem. Mas podemos ficar optimistas.

Atual Quadro (2020) caminha para o «êxito»

«Temos de ser modestos e dizer que este quadro comunitário ainda está a meio do percurso, não o podemos classificar já como um êxito. O processo está em bom
andamento, os indicadores que dispomos, como as taxas de compromisso e as taxas de execução estão dentro daquilo que é normal. O compromisso anda pelos 65 por cento e o desempenho pelos 24/25 por cento. O desempenho tenderá a aumentar numa progressão mais rápida que o compromisso. Até ao término de 2019 teremos uma taxa de próxima dos 100 por cento», disse Francisco Serra ao «barlavento».