ACTA viaja ao reinado de Ibn Qasi, o rei iniciado do Algarve

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Ibn Qasi, mítico rei muçulmano fez uma aliança com D. Afonso Henriques, que este selou oferecendo-lhe um cavalo, um escudo e uma lança. Uma lendária amizade controversa agora revisitada no palco do Lethes, em Faro.

Luís Vicente, diretor artístico da ACTA – A Companhia de Teatro do Algarve, prepara-se para entrar novamente em cena. Desta vez, para dar voz e corpo a Ibn Qasi, um texto adaptado do autor espanhol José Carlos Fernández, que está a ser preparado desde junho.

«Achei-o interessante e aguardei a oportunidade de o levar a cena. Estamos a falar do século XII, contudo, o tipo de abordagem que fazemos não é histórica. Procurámos saber o que é que este texto nos pode dizer sobre a nossa contemporaneidade e a abordagem é mesmo essa».

Luís Vicente, ator, encenador e diretor artístico da ACTA.

«Identificámos situações que ocorrem hoje, nos nossos dias, em vários lugares do mundo e vamos salientar isso no espetáculo. Por exemplo, a peça abre com um trabalho jornalístico que foi feito sobre um ataque do Daesh em Cabo Delgado, Moçambique», explica ao «barlavento» Luís Vicente, na qualidade de encenador da 77ª produção da companhia.

Qual a relação entre um ataque jihadista e a alvorada da nação? «Tem tudo a ver com aquilo que está subjacente ao que era o entendimento do Ibn Qasi e de outros muçulmanos que viveram no Al-Andalus. Há um substrato ideológico que atravessa os tempos».

A peça consiste «na história de Ibn Qasi que a dada altura resolve enveredar por um determinado caminho. Antes disso, tinha uma vida dissoluta, mas acabou por criar um conjunto de discípulos que o acompanharam num projeto. Mais tarde, o confronto com visões radicais do Islão obrigou-o a conflitos que ele próprio não queria. Em última análise, o rei terá sido assassinado porque mantinha uma amizade profunda com D. Afonso Henriques, por via dos Templários, onde se inseria o seu entendimento filosófico, espiritual e iniciático», refere.

Mais uma vez, Luís Vicente mandou retirar a velhinha plateia do Teatro Lethes. O espaço será ocupado por 29 atores, entre profissionais e alunos do curso de Interpretação da Escola Secundária Tomás Cabreira. O palco fica reservado aos bailarinos e músicos. Já o público terá que ocupar as coxias laterais e camarotes. O elenco, para Luís Vicente, é uma parceria «rica».

Em última análise, este é um espetáculo que estimula a reflexão. «Os desastres e a tragédia continuam a acontecer no Mediterrâneo e no nordeste da Síria», exemplifica.

Além disso, durante o espetáculo Luís Vicente assegura que haverá «certos enigmas que farão o público interrogar-se sobre o seu significado».

Assim, e de modo a responder a essas dúvidas, nos dias 15 e 22 de novembro sextas-feiras, às 18h30, o Lethes acolhe duas palestras sobre a temática com dois convidados especialistas.

A primeira, intitulada «A Cultura Árabe que temos e que desconhecemos», contará com a presença do professor Alexandre Honrado e a segunda, «O Descalçar das Sandálias» será dirigida por Frei Fernando Ventura.

Já a peça «IBN QASI – o rei iniciado do Algarve» estreia na sexta-feira, dia 8 de novembro às 21h30 no Teatro Lethes, em Faro. O espetáculo será exibido de 9 a 30 de novembro (sexta-feira às 15 horas, sábados às 21h30 e domingos às 16h00).

«Há falta de interesse pela cultura em Portugal»

Apesar do historial de produções já longo, acompanhado também de um crescente de espetadores, consoante explica Luís Vicente, ator, encenador e diretor artístico da ACTA, há um problema de falta de interesse cultural.

«A questão está noutro tipo de entendimentos que existem noutros países e cá não. Procurar perceber o que é estruturante e como é que se faz uma abordagem artística no campo, por exemplo, do desenvolvimento económico do país. O último estudo que conheço, acerca do tema, de 2013, mostrava que na fruição de música, dança, teatro, leitura, frequência a museus e a galerias de arte, Portugal ocupava o 27º e último lugar da União Europeia».

«Isto diz muita coisa. Este é o problema de fundo. Trata-se de um problema geral, dos portugueses e não é só no teatro, mas sim na cultura. Até temos uma relação privilegiada com a Escola Secundária Tomás Cabreira que nos permite fazer algumas coisas e proporcionar aos jovens certo tipo de experiências. Mas isto não é frequente no país».